Artigo

A balança desigual da Reforma Tributária

Márcio Olívio Fernandes da Costa
Vice-presidente da Federação do Comércio de Bens, Serviços e Turismo do Estado de São Paulo (FecomercioSP) e presidente do Conselho de Assuntos Tributários da Federação e do Conselho Estadual de Defesa do Contribuinte de São Paulo (Codecon-SP).
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Márcio Olívio Fernandes da Costa
Vice-presidente da Federação do Comércio de Bens, Serviços e Turismo do Estado de São Paulo (FecomercioSP) e presidente do Conselho de Assuntos Tributários da Federação e do Conselho Estadual de Defesa do Contribuinte de São Paulo (Codecon-SP).

As previsíveis consequências negativas para os brasileiros, sobretudo para o empresário do comércio de bens e serviços — engrenagem do crescimento nacional — estão pesando mais do que a própria natureza da mudança: aliviar a rotina já complicada do contribuinte.     

Para as empresas, o documento traz uma série de incertezas, uma vez que muitos pontos dependem de regulamentação por meio de lei complementar. Diante disso, não há garantias de que a simplificação, tão almejada, será alcançada. Mais do que isso, espera-se um iminente aumento na carga tributária, especialmente para os prestadores de serviços.
 
A primeira (e mais provável) consequência desse cenário é o aumento da judicialização, já que a reforma como está aumenta a insegurança jurídica quanto a procedimentos tributários. No médio e no longo prazos, porém, os efeitos serão sentidos principalmente nos Serviços, que terão de suportar uma carga de tributos maior, enquanto o País adentra um processo proporcional de redução empregos justamente no campo que mais gerou vagas formais no ano de 2023.

Para as micro e pequenas empresas, haverá um forte retrocesso em relação ao atual mecanismo de transferência de crédito nas aquisições de empresas optantes pelo Simples Nacional, pois será no montante equivalente ao cobrado no regime único. Atualmente, a empresa optante do Simples Nacional transfere crédito integral de PIS e Cofins, no percentual de 9,25%, o que garante sua competitividade. Afinal, com uma alíquota no patamar de 27,5%, fatalmente haverá uma “corrida” pelo crédito integral, a fim de que a carga final, considerando débitos e créditos, seja a menor possível. Os negócios de pequeno porte terão, agora, duas opções: manterem-se integralmente no Simples Nacional, mas com perda de competitividade, ou excluir os novos tributos no regime diferenciado e, então, assumir uma carga tributária e custo no cumprimento de obrigações acessórias maior.

Isso sem contar a alíquota do IVA — que, se ficar como previsto pelo próprio Ministério da Fazenda, será a maior do mundo: 27,5% — e o longo período de transição, que fará com que os contribuintes passem por sete longos anos convivendo com dois sistemas tributários simultâneos. Isto é: se hoje lidamos com um modelo considerado um “manicômio tributário”, deixá-lo agir por mais sete anos, ao mesmo tempo que é instalado um outro formato, cheio de questões não respondidas, como poderíamos avaliar essa situação senão como grave?   

Há ainda preocupação sobre as alterações de tributos que não incidam sobre o consumo — como o Imposto sobre a Propriedade Predial Territorial Urbana (IPTU) —, que permitem às prefeituras alterarem a base de cálculo do imposto por decreto. Trata-se de uma ofensa ao princípio da legalidade e enseja em possibilidade de majoração de imposto sem a necessidade de lei.

No médio e no longo prazos, os efeitos serão sentidos principalmente nos Serviços, que terão de suportar uma carga de tributos maior, enquanto o País adentra um processo proporcional de redução empregos justamente no setor que mais gerou vagas formais no ano de 2023


O lado mais brando

Dentre as alterações promovidas no Senado, a inclusão de uma “trava” à elevação de impostos é, sem dúvida, positiva, já que impedirá que os novos tributos (IBS, CBS e IS) tenham carga tributária superior aos atuais
PIS/Pasep, Cofins, IPI, ISS e ICMS.

Cabe, ainda, mencionar o fato de que algumas atividades do setor de Serviços contempladas nos pleitos poderão ter redução de até 60% nos tributos. A inclusão de uma nova alíquota reduzida, no porcentual de 30% para profissionais regulamentados, como contadores, também é positiva, já que se trata de um serviço prestado de forma personalíssima.
 
A previsão de regimes específicos para outras atividades, como nos serviços de turismo ou aqueles que promovam a economia circular, também é vista com bons olhos. Ainda que o correto (e justo) seria que o setor fosse inteiramente contemplado com a redução sobre a alíquota referencial.


Para o Comércio, a concretização do benefício a produtos da cesta básica, que terão alíquotas zero de IBS e CBS, também é relevante. Levando em conta que o Senado fez aprimoramentos no dispositivo, mediante a criação da cesta básica estendida (cuja redução da alíquota é de 60%), esse é um dos pontos altos do documento. Por fim, a garantia de que o novo Imposto Seletivo (IS) não incidirá sobre exportações nem sobre operações com energia elétrica e telecomunicações é outro aspecto importante.
 

Citando a expressão popular, no “frigir dos ovos”, o governo não está fazendo jus aos princípios de simplificação, modernização e desburocratização que deveriam permear toda e qualquer mudança no nosso atual sistema tributário. Em vez disso, segue não olhando para a própria dimensão e despesas, forçando ainda mais um dos pratos da balança — justo aquele que a sociedade sustenta.

O ARTIGO FOI ORIGINALMENTE PUBLICADO NA EDIÇÃO 478 DA PROBLEMAS BRASILEIROS, TAMBÉM DISPONÍVEL NAS PLATAFORMAS BANCAHREVISTARIAS, EM VERSÃO DIGITAL. ACESSE AGORA!

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