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A conexão do cérebro com as doenças

Agência BORI
é um serviço único que conecta a ciência a jornalistas de todo o País. Na BORI, profissionais de comunicação cadastrados encontram pesquisas científicas inéditas e explicadas, além de materiais de apoio à cobertura jornalística e contatos de cientistas de todas as partes do Brasil preparados por nós para atender à imprensa. Acesse: abori.com.br
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Ao estimular a atividade de neurônios sensoriais (que levam informação para o sistema nervoso central), um grupo de pesquisadores da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) observou a capacidade deste processo em inibir o crescimento do melanoma, o mais agressivo entre os cânceres de pele. Já um grupo de pesquisadores de universidades francesas, em colaboração com pesquisadores da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), descobriram que o lactato produzido pelos astrócitos podem ser um novo alvo terapêutico contra doenças neurodegenerativas. Os estudos, respectivamente publicados nas revistas científicas Acta Neuropathologica Communications e Proceedings of the National Academy of Sciences (PNAS), em novembro, têm apoio do Instituto Serrapilheira e foram divulgadas à imprensa pela Agência BORI. 

Para testar a possibilidade de diminuir a progressão do melanoma a partir da manipulação do sistema nervoso, o grupo da UFMG utilizou uma técnica chamada “quimogenética”, desenvolvida por neurocientistas e que permite modificar temporariamente a atividade de neurônios específicos para estudar circuitos neuronais no cérebro. O grupo decidiu, então, testar se a quimogenética poderia ser aplicada à biologia do câncer. Para tanto, utilizaram a metodologia para inibir ou, ao contrário, superestimular a atividade neuronal em neurônios sensoriais dentro dos tumores.

“Nós descobrimos que, ao inibirmos a atividade de neurônios sensoriais, os tumores cresciam mais. Já em contraste, a superativacão dos neurônios sensoriais inibe o crescimento do melanoma. A superestimulacão destas células também induziu a diminuição de vasos sanguíneos nos tumores, ajudando estes a crescer, bem como uma melhora da resposta imune, elevando os linfócitos antitumorais – que se infiltram no tumor, ao mesmo tempo que reduzem as células imunossupressoras”, explica Alexander Birbair, líder do estudo.

Além do melanoma

Os autores vislumbram que a descoberta possa ajudar a criar mecanismos mais eficientes e específicos no tratamento de outros tipos de câncer, como os de mama, próstata e pulmão. “Os resultados da pesquisa mostram a importância da preservação dos nervos sensoriais em pessoas com câncer. Muitas quimioterapias, que acabam sendo prejudiciais aos pacientes, matam não só as células malignas, mas afetam também os nervos sensoriais. Se estes tratamentos estão matando esses nervos, isso pode não ser bom para a progressão do tumor nestes pacientes, esperando-se uma piora clínica. A pesquisa tenta não apenas mostrar uma alternativa de atacar as células do câncer, como também controlar o microambiente, de tal forma que as células parem de crescer”, acrescenta.

Também participaram do estudo pesquisadores do Hospital Sírio-Libanês, da Universidade de São Paulo (USP), da Universidade Federal do Oeste da Bahia (UFOB) e da Universidade Federal de Goiás (UFG), além de colaboradores internacionais. O grupo recebeu financiamento do Instituto Serrapilheira e apoio do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológicos (CNPq), da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes) e da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de Minas Gerais (Fapemig).

Os astrócitos como alvo para futuras terapias 

No outro estudo, com participação de pesquisadores da UFRGS, foi demonstrado o papel fundamental desempenhado pelos astrócitos na sustentação de funções cognitivas.  Esta descoberta eleva o lactato produzido pelos astrócitos como novo alvo terapêutico contra doenças neurodegenerativas.

O bioquímico e farmacologista Eduardo Zimmer, coautor do estudo, explica que a metodologia adotada consistiu na diminuição da quantidade de transportadores de lactato em astrócitos ou neurônios em uma região do cérebro de ratos adultos envolvida no reconhecimento de objetos, por meio de suas vibrissas (“bigode”, que serve como órgão sensorial para os roedores).

A redução da expressão desses transportadores, que diminuiu os sinais de ativação detectados por meio de exame de ressonância magnética funcional nesta região do cérebro, teve impacto no comportamento dos animais. “Observamos que a capacidade dos animais de reconhecer e distinguir objetos usando suas vibrissas foi fortemente prejudicada, enquanto suas outras funções comportamentais permaneceram intactas”, explica Zimmer, professor adjunto do Departamento de Farmacologia do Instituto de Ciências Básicas da Saúde da UFRGS. 

Outro grande avanço, comenta a bioquímica Karine Bouzier-Sore, coautora do estudo, da Universidade de Bordeaux, na França, foi a demonstração de que o lactato, até então considerado um resíduo metabólico – ou mesmo um composto potencialmente tóxico para o cérebro –, poderia ser um substrato energético valioso e útil para os neurônios. Com base nestas observações, surgiu o modelo da Lançadeira de Lactato do Astrócito para o Neurônio (ANLS, na sigla em inglês), que propõe que o lactato produzido pelos astrócitos seja transferido aos neurônios para sustentar a sua atividade.

Os artigos aqui publicados são de inteira responsabilidade de seus autores e não refletem a opinião da PB. A sua publicação tem como objetivo privilegiar a pluralidade de ideias acerca de assuntos relevantes da atualidade.