Artigo

A dinâmica do turismo

Mariana Aldrigui
é doutora em Geografia Humana, pesquisadora em Turismo Urbano na Universidade de São Paulo (USP) e presidente do Conselho de Turismo da FecomercioSP
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Mariana Aldrigui
é doutora em Geografia Humana, pesquisadora em Turismo Urbano na Universidade de São Paulo (USP) e presidente do Conselho de Turismo da FecomercioSP

Ainda é prematuro fazer afirmações que se pretendam definitivas sobre os impactos e as consequências sociais e econômicas da pandemia causada pelo coronavírus. É possível, entretanto, reunir elementos que nos permitam revisar conceitos e verdades antes tidas como absolutas, buscando ampliar a compreensão de atividades complexas, como é o caso do turismo.

Não restam dúvidas de que a alta conectividade e os meios de transporte de grande capacidade foram coadjuvantes na disseminação do vírus, e uma vez reconhecida a dinâmica de contaminação, as orientações dos epidemiologistas e infectologistas foram claras contra a aglomeração e o confinamento de pessoas em ambientes fechados. Consequência imediata: praticamente todas as atividades que compõem o turismo foram, se não paralisadas, reduzidas a um mínimo necessário para a manutenção de serviços essenciais.

Aos olhos menos experientes, trata-se apenas de uma pausa em um tipo de consumo supérfluo, muitas vezes restrito aos que dispõem de renda extra e tempo para viajar, no País ou fora dele. Porém, com a pausa nas viagens e no consumo dela derivado, uma série de atividades deixou de se realizar e escancarou a incompetência nacional na gestão das informações, dos dados e, especialmente, das políticas setoriais dedicadas às viagens e ao turismo.

As viagens e o comércio sempre estiveram entrelaçados, e isso justifica a proeminência das viagens de negócios – aquelas financiadas com recursos de pessoas jurídicas, principalmente – que ativam especialmente os setores de transporte aéreo, hotelaria e alimentação em restaurantes. Em números totais, as viagens de lazer são superiores, mas o padrão das viagens de negócios tende a ser mais elevado, garantindo receita até três vezes maior por passageiro em um destino. Além disso, quanto mais especializado o tipo de serviço, maior o volume de empregados formais, qualificados (aeronautas, aeroviários, hoteleiros, organizadores de evento, produtores culturais, desenvolvedores de tecnologia, agentes de viagem, operadores, guias, vendedores especializados, gestores de produtos e serviços, entre milhares de outros).

Sabemos que a presença de turistas nos destinos ativa um volume muito maior de outras atividades. No Brasil, 21 setores estão diretamente relacionados ao turismo enquanto outros 332 estão indiretamente relacionados, com parte de sua receita dependente dos gastos de turistas (como taxistas, padarias, farmácias, lojas de vestuário e calçados, artigos de couro, entre muitos outros).

Ainda que seja pretensioso manter a afirmação de que o setor representa cerca de 8% a 10% do Produto Interno Bruto (PIB) brasileiro, algo que foi largamente alardeado por diferentes autores, é possível garantir que pelo menos 1% dos empregos formais no País estavam diretamente vinculados ao setor e outros 9% nas atividades indiretas e complementares. Dados da Relação Anual de Informações Sociais (Rais) de 2018 permitem afirmar que cerca de 500 mil brasileiros possuíam vínculos diretos e outros 4,5 milhões de empregos tinham alguma dependência do turismo, sem considerar o volume de postos informais, estimado em 1 milhão, até fevereiro de 2020.

Com os tropeços na condução das medidas de contenção da pandemia no Brasil, não há indícios claros de quando será permitido e, fundamentalmente, seguro, viajar pelo País para reativar o setor e garantir o emprego e o sustento dessas famílias.

Um dos primeiros setores afetados pela pandemia, o turismo estará entre os últimos a ter total autorização para retomar suas atividades e, neste intervalo, é fundamental que se reorganizem, de forma consistente, as políticas de estímulo e desenvolvimento do setor.

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