Artigo

A encruzilhada do Banco Central

Antonio Lanzana
é copresidente do Conselho de Economia Empresarial e Política (CEEP) da FecomercioSP e professor na Universidade de São Paulo (USP) e na Fundação Dom Cabral (FDC).
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Antonio Lanzana
é copresidente do Conselho de Economia Empresarial e Política (CEEP) da FecomercioSP e professor na Universidade de São Paulo (USP) e na Fundação Dom Cabral (FDC).

A decisão do Banco Central (Bacen) em manter a taxa Selic em 13,75% ao ano (a.a.) estava na previsão dos analistas financeiros. Também já eram esperadas as críticas contrárias da área Política, as quais têm colaborado para deteriorar as expectativas de redução inflacionária tão cedo. Basta observar que, em setembro de 2022, a previsão de inflação para 2023 pelo boletim Focus era de 4,12%; atualmente, é de 5,95%.

Diminuir as taxas de juros seria interpretado como resultado de “pressão política”, colocando em dúvida a independência do Bacen e, portanto, sua credibilidade. A autarquia, a propósito, encontra-se numa “encruzilhada”: de um lado, a inflação fora da meta; de outro, a excessiva cautela dos bancos na concessão de empréstimos, dada a elevação da inadimplência e o “episódio Americanas”.

O comunicado do Bacen deixa clara a sua preocupação em convergir a inflação para a meta, daí a manutenção da Selic. Não é a primeira vez que o País se defronta com a questão. Em 2005, por exemplo, houve taxas reais de juros muito mais altas, de 12% a.a. Nesse período, o Bacen não era independente de direito, mas de fato. Nos anos seguintes, as taxas reais de juros passaram a declinar. Isto é, taxas muito elevadas são transitórias.

Além disso, o afrouxamento da política monetária impacta, primeiro, o Produto Interno Bruto (PIB), expandindo-o. Depois, vem a inflação. Já a contração monetária reduz, primeiro, o nível de atividade, desacelerando-o, para, depois, reduzir a inflação. Nesta dinâmica natural, há uma defasagem entre o aumento dos juros e a redução da inflação.

Sendo assim, como efeito do “inchaço” bem elevado em março e abril de 2022, o cálculo da inflação de 12 meses – entre abril e maio deste ano – pode chegar próximo a 4%. Diante disso, as pressões sobre o Bacen vão aumentar. Ocorre que o núcleo da inflação vai “correr” por cima (em fevereiro, para um IPCA de 5,6%, o núcleo estava em 8,5%). Nos próximos meses, sairão dos cálculos as deflações de 2022, e o IPCA voltará a subir, provavelmente fechando o ano em torno de 6% (aí, sim, convergindo com o núcleo). Em outras palavras, a queda no IPCA de 12 meses será passageira.

Surgem argumentos de que a inflação atual é de custos e, portanto, não adianta cortar a demanda. Embora não se possa negar a existência de componentes de gastos na explicação do índice inflacionário atual, o controle da demanda dificulta o repasse de custos para os preços. Fora que o notável aumento recente dos preços dos serviços (1,41%, em fevereiro, e 0,6%, em janeiro) também sinaliza inflação de demanda, com valores subindo forte em mercados concorrenciais.

As movimentações da classe política também influenciam o quadro, uma vez que o “tamanho” das taxas de juros está ligado às intenções de custos do governo.  A demanda da economia é formada por gastos públicos mais privados. Para reduzir a inflação, é preciso reduzir a demanda total. Se as despesas públicas se expandem, o corte no gasto do setor privado tem de ser maior – portanto, a taxa de juros deve ser mais elevada.

Logo, a evolução das taxas estará condicionada ao arcabouço fiscal, que o governo está prestes a apresentar. Se o programa tiver credibilidade, o “espaço” para a redução dos juros será maior. Contudo, esta não é uma relação imediata. É preciso, primeiro, atingir as expetativas de inflação. Fundamental para o País, a retomada do crescimento, para ser sustentável, deve ocorrer num ambiente de inflação baixa.

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