A construção da imagem de mudança e as boas perspectivas do novo governo do presidente Lula ainda não se consolidaram no horizonte de seu mandato. De um lado, pelas dificuldades no parlamento de formar uma base de apoio, obrigando-o a se adaptar ao Congresso. De outro, pela preservação de imagem, entre seus seguidores, da figura pública do ex-presidente Bolsonaro que se mantém, confirmando a tese de que CPIs e ações policiais midiáticas contra políticos não desconstroem o seu universo eleitoral.
Lula tem feito uma diplomacia de eventos e repercussão, impondo ao Itamaraty um engajamento para o qual a Casa de Rio Branco não está preparada. Mesmo assim, aproveita o vácuo deixado pela falta de política externa do governo anterior para produzir notícias com repercussão interna. Tem sorte com o calendário ao se beneficiar do rodízio que faz o Brasil presidir o G20 em 2024. Apesar de ser um grupo desalinhado, sem poder de implementação de decisão e institucionalidade frágil, a presidência temporária ajuda na ideia de líder mundial que o presidente almeja.
Contudo, internamente, na mídia digital, é o ex-presidente que continua liderando com duas vezes mais interações do que o governo atual. O PT continua na dependência da mídia tradicional, mesmo que surjam críticas às confusões internas do governo. A visão antiga de sindicalismo como celeiro de classe social dirigente, com a volta do imposto sindical, une o governo e a Justiça contra a Reforma Trabalhista e contribui pouco para o aumento do emprego e a redução do endividamento das famílias. A baixa eficácia dos direitos sociais reflete um governo de assistidos e dependentes da política pública, no qual há muito mais bolsas-auxílio do que contratos de trabalho.
Na Reforma Tributária, a regra é o caos. A simples convivência concomitante de dois sistemas de arrecadação, além da criação de um conselho federativo, sinaliza para uma gestão política incapaz de traduzir e enfrentar a recuperação econômica interna e a competição internacional. Ao impor metas inatingíveis do ponto de vista fiscal, mudar o que está funcionando e eleger setores para a taxação seletiva, o governo opera uma agenda incompreensível do ponto de vista do futuro e juridicamente insegura do ponto de vista do presente.
Há uma disfuncionalidade muito clara na distribuição de subsídios e excesso de representatividade de setores industriais tradicionais. Dar ao automóvel um valor maior do que o transporte coletivo é sugerir que a cidadania individual seja mais importante do que a coletiva. O Judiciário, por sua vez, insiste em representar setores e interesses de magistrados e escritórios de advocacia, como se viu com a decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) de permitir aos ministros julgar causas patrocinadas por seus parentes. A esse cenário, soma-se a exacerbada motivação de juízes, impulsionada por uma imatura e pessoal fundamentação simbólica das decisões judiciais. O necessário se torna inoportuno (e até escandaloso) quando é impossível saber o tamanho e a gravidade dos imbróglios legal e cultural a que o País está sendo levado por uma Justiça que se coloca, grosseiramente, em lugares que não lhe são adequados.
Em economia, se as regras do jogo não são claras, as crises se multiplicarão e provocarão prejuízos e danos reputacionais irreversíveis às empresas. Em muitos setores, o sentimento é de paralisação e inércia, fazendo a queda de confiança do consumidor começar a migrar para o campo da decepção.
Até o momento, a conjuntura é de expectativa da esperança, em que se predominam mais opinião e desejo do que estruturação e viabilidade de programas e projetos. Os sinais de improvisação preocupam pela dificuldade de compreensão clara dos objetivos e direcionamento do governo. Que a chegada da primavera traga melhores notícias para todos.
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