O prestígio internacional do Brasil chegou a um dos seus piores momentos nas últimas semanas, com a divulgação, em todo o mundo, de reportagens e editoriais sobre os assassinatos do jornalista britânico Dom Phillips e do indigenista Bruno Araújo Pereira, no Vale do Javari, na Amazônia.
O caso ampliou e piorou a visibilidade global do Brasil, segundo o Índice de Interesse Internacional, que monitora menções ao País em veículos da imprensa estrangeira. No total, 70% de tudo o que se falou sobre o Brasil na última semana tinha tom negativo e prejudicial à reputação brasileira. O caso chegou até mesmo ao parlamento britânico, onde o primeiro-ministro Boris Johnson foi questionado e se declarou preocupado com a situação (antes que as mortes fossem confirmadas). E o Itamaraty está sentindo o baque. Segundo uma reportagem do jornal Folha de S.Paulo, diplomatas de carreira afirmam que as mortes são o episódio com maior potencial de dano à imagem brasileira dos últimos anos.
Apesar de todo o duro impacto deste caso absurdo de violência no País e dos seus efeitos para a forma como é visto no exterior, é importante notar que a percepção externa vê um claro responsável pelas mortes: o presidente Jair Bolsonaro.
Basta analisar a forma como o caso foi tratado pela imprensa estrangeira para ver que, como diz o título de um artigo publicado pelo jornal britânico The Guardian, “as impressões digitais de Bolsonaro estão sobre todo o caso”.
É óbvio que a acusação não indica que ninguém acha que o presidente teve envolvimento direto nos assassinatos. Também é certo que o histórico de violência no Brasil e na Amazônia antecede a chegada de Bolsonaro ao poder e já é conhecido no exterior (basta lembrar das mortes de Chico Mendes e da missionária americana Dorothy Stang, por exemplo).
Mas a percepção externa atualmente é a de que as mortes de Phillips e Pereira estão fortemente conectadas a um processo de abandono da proteção da Amazônia pelo presidente, com graves impactos ambientais e humanos. “A guerra do presidente na Amazônia desempenhou papel no duplo assassinato”, diz o artigo, argumentando que Bolsonaro ataca constantemente quem defende a região onde o crime ocorreu.
Tom semelhante pode ser encontrado nas páginas do jornal francês Le Monde, que trata das ameaças à Amazônia oriundas do garimpo, da agricultura agressiva, do tráfico de drogas e da “visão ‘desenvolvimentista’ do presidente Bolsonaro”. Editorial do periódico português Público diz que o presidente é “um homem com uma insensibilidade avessa a qualquer apego à natureza ou aos homens”. Enquanto o argentino Clarín destaca que Bolsonaro é frequentemente acusado de incentivar invasões às terras indígenas.
Uma explicação para esta análise que responsabiliza o presidente pode ser lida em um editorial publicado pelo jornal britânico após a confirmação das mortes: “As empresas e os governos também devem ser responsabilizados por tal violência”, diz.
O caso se junta a outros exemplos de piora da reputação do Brasil nos últimos anos, em que o nome do presidente é diretamente apontado como responsável pela perda de prestígio. Isso foi evidente durante a pandemia de covid-19, por exemplo, quando o negacionismo de Bolsonaro era citado como responsável pela alta mortalidade no País. Apareceu antes, também, em críticas ao aumento do desmatamento na Amazônia, quando houve registros até mesmo de questionamentos da soberania do Brasil sobre a região.
É inegável que as mortes de Phillips e Pereira têm impacto negativo sobre a imagem brasileira como um todo. Entretanto, a responsabilização internacional individualizada sobre Bolsonaro permite um pouco de otimismo para quem se preocupa com o status do País no mundo. Fica evidente que a postura do governante e a sua política importam. Isso preocupa no momento, mas permite pensar que um futuro presidente, com atuação mais republicana e declaradamente preocupada com o meio ambiente e com os direitos humanos, pode ajudar o Brasil a recuperar o prestígio que ora perde.
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