Artigo

A volta da alegria

Daniel Buarque
é pesquisador de Relações Internacionais no King’s College London (KCL), jornalista, tem mestrado em Brazil in Global Perspective pelo KCL e é autor de Brazil, um país do presente.
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Daniel Buarque
é pesquisador de Relações Internacionais no King’s College London (KCL), jornalista, tem mestrado em Brazil in Global Perspective pelo KCL e é autor de Brazil, um país do presente.

Após mais de dois anos de um intervalo triste e tenso em decorrência da crise sanitária, o maior símbolo da imagem internacional do País voltou a projetá-lo para o planeta como um lugar de festa, alegria e cores intensas. O carnaval, sinônimo de Brasil aos olhos do resto do mundo, voltou a ter destaque global no último fim de semana, expondo positivamente a Nação – reforçando alguns estereótipos, de fato, mas mostrando que mesmo os temas mais sérios, como política e saúde, podem entrar na folia.

Dezenas de publicações de vários países publicaram vídeos e galerias de fotos mostrando imagens da volta da celebração nacional mais famosa. “Tanta alegria”, destacou o tabloide britânico Daily Mail, chamando o carnaval de “maior festa do planeta”. “O extravagante carnaval do Rio de Janeiro está de volta, após ser adiado por dois anos consecutivos em razão da pandemia de covid-19, enquanto foliões vestidos de lantejoulas recuperam o icônico sambódromo da cidade.” Já o jornal norte-americano USA Today falou sobre cores marcantes, carros alegóricos deslumbrantes e roupas chamativas dos desfiles de carnaval brasileiros.

A projeção internacional da festa não se limitou a imagens de sambistas e foliões nos desfiles de escolas de samba. Temas sérios também tiveram destaque na cobertura da imprensa estrangeira. “Carnaval também é política”, destacou o título de uma reportagem do jornal britânico The Guardian. “Com as eleições a menos de seis meses, muitos veem a festa como uma chance de expor sua raiva contra o presidente de extrema-direita”, completou.

De forma semelhante, a rede britânica de televisão BBC divulgou reportagem sobre o desfile da Rosas de Ouro, em São Paulo, que mostrou um folião fantasiado de presidente se transformando em um jacaré, após receber a vacina contra o coronavírus. A rede britânica chamou os festejos de “grito de guerra” contra todos os problemas enfrentados pelo País durante a pandemia, incluindo a falta de ação coordenada do governo federal contra a propagação da doença. Com a proximidade da eleição, destacou que “muitas escolas de samba escolheram incluir temas políticos, como o racismo e a desigualdade, em suas apresentações”.

Ao lado do futebol, é evidente que o carnaval é uma das marcas mais importantes da reputação nacional pelo mundo. Por mais que seja um clichê simples, e que possa ter uma associação com a falta de seriedade, os festejos tradicionais de fevereiro são diretamente associados ao País pelas pessoas ao redor do globo.

Indo além da população em geral e da cobertura da mídia, o carnaval é uma das primeiras coisas nas quais mesmo políticos e membros da comunidade política externa de grandes potências pensam ao falar do Brasil, segundo minha pesquisa de doutorado: “São imagens positivas, mas também lugares-comuns – como o carnaval – que fazem parte da bagagem cultural em relação ao País que passa pela cabeça de todos”, explicou um pesquisador do Instituto Francês para Assuntos Internacionais e Estratégicos (IRIS, na sigla em francês). “O carnaval, o futebol. São clichês, mas positivos.”

Tudo isso é importante num momento em que a reputação nacional passa por um dos seus piores momentos nas últimas décadas. Desde que Jair Bolsonaro chegou à Presidência da República, a imagem do País se deteriorou, encolhendo o soft power brasileiro e sua capacidade de influenciar as relações internacionais. Enquanto o carnaval se mantia em longa pausa, as imagens que se destacavam eram ainda mais negativas e focadas nas crises política, econômica e de saúde. Com a volta da maior festa nacional, a Nação é projetada por algo de positivo, que reforça uma imagem já consolidada, provando que, mesmo ao passarmos por problemas, continuamos prontos para a alegria. Um estereótipo simples, mas positivo.

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