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Bolsonaro 2022: o preço do líquido e certo

Humberto Dantas
é cientista político, doutor em Ciência Política. Integra o grupo de especialistas que escrevem às quartas-feiras na coluna “Ciência Política” da PB.
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Humberto Dantas
é cientista político, doutor em Ciência Política. Integra o grupo de especialistas que escrevem às quartas-feiras na coluna “Ciência Política” da PB.

Esta semana saiu publicada entrevista comigo no Valor Econômico. Quase duas horas de conversa com a jornalista Carolina Freitas para tratarmos tema essencial à política brasileira: as eleições de 2022 e as potenciais candidaturas ao Palácio do Planalto.

Dividimos os atores em campos ideológicos e, na esquerda, identificamos um PT hipertrofiado. O anabolizante do período 2002-2014 não teve seus efeitos reduzidos, e a legenda ainda se enxerga a partir de si para campear a oposição e a lógica esquerdista no País. Não calcula que nos demais agentes existe um desejo de independência e, principalmente, um “custo PT” que não agrada e vem traduzido pelo senso comum como antipetismo.

O PT ainda sonha que em menos de um ano e meio toda a “injusta” Lava Jato será desmontada, Lula inocentado e o País, em uníssono, dirá que Dilma foi vítima de um golpe. Em ritmo de monólogo, o PT ainda parece preocupado se lança Lula ou Haddad, a despeito de tudo o que existe em volta.

A alternativa “mais viável” aqui é um Ciro Gomes que vive, faz décadas, em primeira pessoa. Um desagregador verborrágico nato, que aceita demonstrar equilíbrio se o mundo convergir para suas ideias. Dificilmente isso ocorrerá. E ele nos passará sempre a sensação de que, em parte das vezes, fala sozinho. No mais: o PSOL sempre lança candidato e os demais sonham encontrar um.

Se na esquerda ao menos existe gente, na centro-direita o que há é um conjunto de balões. Lembro daquelas fotos na alvorada da Capadócia, um monte de infláveis lentos, plácidos, sobrevoando a linda e desértica paisagem. É assim a centro-direita no Brasil. O PSDB carrega parte da arrogância de achar que lhe basta um nome. Faz tempo que isso deixou de ser assim, e há um “custo tucano” a ser pago que vai de escândalos mal resolvidos, passa por zumbis simbolizados por um ex-político em atividade na Câmara dos Deputados, e termina numa absoluta incapacidade de convergência. Aqui está o ponto: é impossível convergir, e na verdade desnecessário na conta da maioria dos políticos desse ponto do espectro.

É o mercado, parte da mídia mais tradicional e um lote da classe média mais esclarecida, que sonha com o tal nome de consenso que arrebanharia a rês desgarrada e a levaria para o curral da felicidade. Esqueça. Esse povo não convence o eleitorado, e muito menos coloca os políticos para trabalharem pelos seus sonhos.

A centro-direita não tem um nome, e tampouco os seus agentes descentralizados fazem questão de ter. De Eduardo Leite a João Doria, passando por ACM Neto, Rodrigo Maia e companhia limitada, nada disso se articula. Restariam “novidades” como Luciano Huck, Sergio Moro e, até mesmo, Luiza Trajano. Improvável. Até porque estes sequer calculam o impacto em suas vidas privadas que traz a disputa de uma eleição dessa envergadura.

Sobrou para quem? Para a ultradireita. Bolsonaro comprou a peso de ouro público a tranquilidade que precisa para terminar o mandato. O maior inimigo é seu cérebro perturbado, mas com 2022 no horizonte talvez entenda que um governo simbolizado pela mediocridade da agenda pode jogar parado e ganhar sem correr. Mesmo com uma popularidade oscilante, garante um quarto do eleitorado consigo, coloca um pé no segundo turno, continua comprando quem não quer se matar para encontrar um candidato – vulgo a citada centro-direita – e reza para ir ao segundo turno com a esquerda.

O período 2023-2026 está rascunhado, e olha que o presidente tem para rifar até lá uma dúzia de militares, ministérios do peso da Saúde e da Educação, e a vaga de vice. Está mais fácil do que o nosso ódio gostaria.

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