Artigo

Brasil e as incertezas externas

Antonio Lanzana
é copresidente do Conselho de Economia Empresarial e Política (CEEP) da FecomercioSP e professor na Universidade de São Paulo (USP) e na Fundação Dom Cabral (FDC).
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Antonio Lanzana
é copresidente do Conselho de Economia Empresarial e Política (CEEP) da FecomercioSP e professor na Universidade de São Paulo (USP) e na Fundação Dom Cabral (FDC).

Nos últimos anos, a economia mundial foi fortemente impactada pela pandemia e pela guerra entre Rússia e Ucrânia. A questão sanitária já foi superada e os impactos desse conflito bélico, aparentemente, foram “absorvidos”. Contudo, mais recentemente, dois novos fatos voltaram a gerar incertezas no cenário internacional: a guerra no Oriente Médio e a evolução da economia norte-americana.

Sobretudo em relação ao conflito armado, a incerteza reside na possibilidade de extensão da guerra. Se esta ficar restrita a Israel e Hammas, pode-se dizer que os impactos sobre a economia mundial serão bastante limitados. Por outro lado, se o conflito se espalhar pela região e envolver países produtores de petróleo, afetará a oferta mundial do produto, elevando, como consequência, os preços — que já sofriam reflexos antes do conflito pela decisão de Rússia e Arábia Saudita de reduzir a oferta do produto — e pressionando a inflação mundial. Dessa forma, assistimos a uma nova onda de elevação de juros nas principais economias do mundo e desaceleração do nível de atividade. Aqui, cabe observar que tudo isso é uma possibilidade, e não uma certeza.

Outro fator de dúvida neste momento se refere à evolução das taxas de juros nos Estados Unidos, variável extremante relevante para os rumos da economia global. A inflação estadunidense (medida em 12 meses), que caiu de 9,1%, em junho de 2022, para 3,7%, em setembro de 2023, mostra resistência em continuar declinando. Uma coisa é reduzir a inflação de 9% ou 10% para 3,7% ou 4%; outra é reduzir de 3,7% ou 4% para 2% — e isso está se verificando na medida em que, mesmo com juros altos, o nível de atividade do país continua aquecido — expansão anualizada do Produto Interno Bruto (PIB) de 4,9% no terceiro trimestre —, o mesmo acontecendo com o mercado de trabalho. Esse quadro deve levar o FED (banco central dos Estados Unidos) a manter as taxas em patamares elevados por um período mais longo, ou até mesmo promover novas elevações. Considerando que a economia daquele país apresenta déficits públicos elevados, juros altos comprometem ainda mais a dinâmica da dívida. E mais: o envolvimento norte-americano em duas frentes de guerra devem elevar ainda mais os gastos públicos, em decorrência do aumento das despesas militares, agravando ainda mais o cenário. Expansão da política fiscal implica juros elevados para manter a inflação sob controle. Uma visão nesse sentido pode ser observada pelas taxas de juros nos títulos do Tesouro de dez anos (atualmente em 5%, contra uma média histórica de 1%).

Essa conjuntura imprecisa pode afetar a economia brasileira de várias formas: a) uma desaceleração da economia mundial pode impactar tanto os preços das commodities como a quantidade exportada pelo País; b) como incerteza é sinônimo de volatilidade, a taxa de câmbio pode apresentar muita oscilação nos próximos meses; c) a política de  juros do Banco Central (Bacen) pode se tornar mais cautelosa; e o ritmo de redução de 0,5 ponto porcentual (p.p.) deve ser mantido no curto prazo, tornando bem menos provável a aceleração dessa queda. Além disso,  a  conclusão do processo de redução deve se dar a uma taxa maior que a incialmente prevista.

Esse é um processo que afeta não somente o Brasil, mas todas as nações emergentes. Os mais prejudicados serão aqueles que apresentarem fundamentos econômicos frágeis. Considerando que o País tem elevado volume de reservas internacionais, e a inflação está em declínio, o maior desafio está concentrado no ajuste fiscal, de forma a garantir uma evolução saudável da relação entre dívida e PIB.  

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