ArtigoCiência Política

Com piratas, sem integração, sem Nação

Bárbara Dias
é doutora pelo Instituto de Pesquisas do Rio de Janeiro – IUPERJ-IESP e professora da Universidade Federal do Pará (UFPA). Integra o grupo de especialistas que escrevem às quartas-feiras na coluna “Ciência Política” da PB.
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Bárbara Dias
é doutora pelo Instituto de Pesquisas do Rio de Janeiro – IUPERJ-IESP e professora da Universidade Federal do Pará (UFPA). Integra o grupo de especialistas que escrevem às quartas-feiras na coluna “Ciência Política” da PB.

Não sei se em razão do confinamento, mas tenho experimentado eventos extraordinários. Outra noite estava entre o estado de vigília e latência do sono, quando fui surpreendida pelos gritos de Henrique Dodsworth do Partido Economista do Distrito Federal (RJ): “Acorda! Acorda, Bárbara! O acumulado de importação de soja em 2020 é absurdo!”

Fiquei atordoada com essa personalidade dos anos de 1930 me relatando fatos de 2020. Pensei: “Ah! Agora é a turma da Constituinte de 1934!”. Quem começou a falar foi Raul Pilla, questionando:

–  Você sabe me dizer por que os conservadores têm afirmado que, para a Nação funcionar, ela deve ser fragmentada em partes? Confesso-lhe, Bárbara, que eu fico surpreso. Todos sabem que só em um encontro das partes com o todo é que se pode conduzir uma relação harmoniosa da relação do homem com a sua história e o seu espaço. Só a integração federativa e a unidade nacional podem produzir a cooperação harmônica para que o brasileiro possa forjar a sua própria história. Por isto, pergunto-lhe: por que o atual governo quer destruir a República? Por que deseja a fragmentação e a desintegração da unidade nacional?

Exclamou Levi Carneiro:

– O espírito nacional é representado pela comunhão na relação entre o homem e o seu meio espacial, a terra, o seu trabalho e os seus vínculos de sociabilidade! Esses vínculos integrativos foram esquecidos pelas elites políticas da Primeira República brasileira! Os atuais governantes parecem agora repetir o mesmo erro. Produzem políticas de desenraizamento social e sustentam a fragmentação da Nação em diversas fazendas oligárquicas, fortalecendo o clientelismo político e o espírito de clã em detrimento da integração e da coordenação nacional.

– Você conhece Montesquieu? – Indagou João Mangabeira – Então, você sabe o que significa a política de desertificação do governo Bolsonaro, não é? Você sabe que o par da política de desertificação é o despotismo, não sabe? A política de desertificação já foi realizada na Primeira República de 1891, gerando oligarquias e homens bárbaros pouco afeitos ao jogo da civilidade. Por que insistir em erros comprovados? Já ficou claro que precisamos de um regime federativo cooperativo que garanta que os homens não vivam isolados, tornando-se dependentes de grandes chefes clânicos. Por isto, necessitamos de um regime que recupere os valores orgânicos de nossa sociabilidade. Sem a intervenção de corpos e organismos sociais organizados politicamente pelo Estado, a moral, o familismo e o espírito comunitário não conseguem promover não só a organização e a integração da Nação, como a habilitação do povo para participar das instituições políticas.

Até o general Góis Monteiro concordou.

– O cesarismo político pode ser importante, mas ele não significa a infantilização das massas como o bolsonarismo promove. Um grande líder deve desejar o alto espírito cívico e não a desorganização social. Esses novos reacionários não respeitam o sentido de vida integrativa de uma comunidade. Produzem privatizações de todos os setores fundamentais para a soberania e a concertação tanto entre instituições, como em corporações nacionais. A representação política, inclusive, passa por essas territorializações dos indivíduos em seus corpos civis ou sociais. O Estado deve arrefecer ou dar fim ao conflito social. E não produzir mais conflito. Bárbara, parece até que os teus generais querem que o Brasil siga um destino de Terra de Piratas!

Eu não esperava, às vésperas do ano 2021, receber lições de progressismo dos conservadores de 1934…

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