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Duas décadas perdidas

Fábio Pina
é economista e integra a assessoria técnica da FecomercioSP
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Fábio Pina
é economista e integra a assessoria técnica da FecomercioSP

Como era esperado pelo mercado, o Produto Interno Bruto (PIB) brasileiro de 2020 apresentou retração na comparação com o ano anterior, em decorrência dos impactos negativos causados pela pandemia de covid-19. Dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) mostram que a queda de 4,1% é o primeiro registro negativo desde 2016, quando o PIB encolheu 3,3%. A queda, entretanto, foi bastante inferior ao que se imaginava no primeiro semestre do ano passado, quando bancos e consultorias apontavam uma queda entre 8% e 11%.

Poucos países conseguiram driblar completamente os efeitos das crises sanitária e econômica, como fizeram a China e alguns países asiáticos, mas o Brasil se afastou do abismo profundo que se desenhava, principalmente nos terceiro e quarto trimestres, somando altas de 7,7% e 3,2%, respectivamente. Esta recuperação só foi possível graças ao auxílio emergencial, que injetou R$ 322 bilhões na economia nacional, segundo o Ministério da Economia.

Não chega a ser motivo de comemoração, até porque o grande problema é o que ficou para trás e o que vem pela frente. Os anos de 1980 ganharam a alcunha de “década perdida” para a economia nacional, pois, naquele período, o PIB cresceu, em média, 1,6%. Já entre 2011 e 2020, a economia ficou estagnada em um leve crescimento médio de 0,3% – cinco vezes menor do que naqueles tempos.

A última vez que o PIB cresceu mais de 2% foi em 2013, com praticamente zero crescimento em 2014 (+0,5%); regrediu em 2015 e 2016, consecutivamente, e vinha mostrando sinais bem tímidos de recuperação – quando foi derrubado pela pandemia.

O País fechou 2020 com o mesmo PIB de 2016, que, na ocasião, replicava o patamar de 2011. Ressaltamos que, entre 2011 e 2016, o PIB brasileiro registrou subidas e descidas, tendo o seu maior nível em 2014. Para que o Brasil atinja novamente um PIB maior do que o daquele ano, será preciso crescer mais 6,8% a partir do atual patamar, o que pode levar de dois a três anos. Ou seja, somente em 2023 teríamos chances de superar a produção alcançada sete anos atrás. Será de fato uma década perdida, então.

O único setor que apresentou crescimento em 2020 foi o agropecuário (+2%), enquanto os serviços registraram queda de 4,5% e a indústria amargou baixa de 3,5%. O consumo também foi fortemente impactado, com as famílias perdendo 5,5% do poder de compra. No comércio exterior, a exportação sofreu queda de 1,8% e a importação registrou retração de 10%, na comparação com 2019.

Os segmentos de academias, bares e restaurantes foi fortemente impactado, registrando queda de 12,1%. A baixa no setor de serviços só não foi maior porque é composto pelo comércio varejista, que engloba materiais de construção (10,8%), farmácias (8,3%) e supermercados (4,8%), cujos desempenhos foram muito bons durante o primeiro ano de pandemia.

Quando se projeta o futuro, a situação não é das mais encorajadoras. Neste ano, o País pode crescer em torno de 3% a 3,5%, muito em razão do baixo patamar anterior. Os dados do início deste ano anteveem sobrenatural dificuldade em reativar a economia, dado que o Brasil enfrentará um primeiro trimestre de queda no consumo e no PIB, na pior fase da pandemia, sem as medidas de mitigação dos efeitos negativos sobre a economia.

Um trimestre inteiro terá ficado para trás. As dúvidas recaem, a perder de vista, sobre a capacidade do governo em implementar uma política de austeridade fiscal pelo lado certo da equação: o corte de despesas.

Faz-se urgente uma reforma do Estado que coloque as coisas nos devidos lugares, abrindo espaço para queda de tributos, aceleração dos investimentos e inflação contida, com juros baixos por um longo período. É preciso superar as décadas perdidas e iniciar um novo ciclo de crescimento sustentado.

Os artigos aqui publicados são de inteira responsabilidade de seus autores e não refletem a opinião da PB. A sua publicação tem como objetivo privilegiar a pluralidade de ideias acerca de assuntos relevantes da atualidade.

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