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Incêndios e recifes de corais

Agência BORI
é um serviço único que conecta a ciência a jornalistas de todo o País. Na BORI, profissionais de comunicação cadastrados encontram pesquisas científicas inéditas e explicadas, além de materiais de apoio à cobertura jornalística e contatos de cientistas de todas as partes do Brasil preparados por nós para atender à imprensa. Acesse: abori.com.br
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A crise climática tem forçado a humanidade a olhar para os impactos provocados pelas suas atividades nos ecossistemas globais. Duas pesquisas recentes das universidades federais da Bahia (UFBA), do Rio de Janeiro (UFRJ) e do Rio Grande do Norte (UFRN), com parceiros internacionais, revelam que o homem é responsável por grande parte dos incêndios em todos os biomas brasileiros e, também, pelo desequilíbrio na alimentação de peixes nos recifes de corais, por causa do descarte inadequado de plástico nos oceanos.

O primeiro estudo, publicado na revista científica PeerJ Life & Environment, e antecipado à imprensa pela Agência BORI, investigou a ocorrência de padrões de queimadas nos seis biomas brasileiros, de 2011 a 2020, com base em dados do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe). O objetivo era entender e comparar a frequência e a quantidade de queimadas no Cerrado, no Pampa e no Pantanal, biomas naturalmente adaptados ao fogo, com as queimadas da Caatinga, da Mata Atlântica e da Amazônia, que não têm condições climáticas que favoreçam o fogo.

As análises mostraram que a ocorrência de queimadas é semelhante em todos os biomas, independentemente da relação com o fogo. A conclusão, então, é de que grande parte dos incêndios nos biomas é provocada pelo ser humano, e não pelas condições naturais do clima.

Apesar de a persistência do fogo em todos os biomas ser localizada, houve pequenas variações em cada região, o que pode ser atribuído, também, a eventos de incêndios naturais. As queimadas foram mais persistentes na Mata Atlântica – o que acende um sinal de alerta dos pesquisadores.

A pesquisa também fez projeções acerca da ocorrência de incêndios nos biomas e sua vulnerabilidade e seu risco, em 2050 e 2090, a partir das projeções dos efeitos de mudanças do clima do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC). Em todos os cenários projetados, a Mata Atlântica é o bioma que apresenta risco maior a incêndios, pois possivelmente diminuirá a sua capacidade de se adaptar ao fogo ao longo das décadas. A Amazônia aparece como o mais resiliente ao fogo, em comparação a outros biomas, como a própria Mata Atlântica e o Pampa, que têm mais perda vegetativa e menos áreas de proteção.

A pesquisadora Luísa Maria Diele-Viegas, coautora e líder do estudo, aponta que a principal contribuição do trabalho é o levantamento de evidências de que a diminuição das chuvas e os aumentos das secas e da temperatura média serão propícios à propagação do fogo com mais intensidade.

O grande incêndio no Pantanal, em 2019 e 2020, que queimou mais de 30% do bioma, revela o que pode acontecer com o encontro de ações provocadas pelo homem e condições favoráveis à expansão do fogo, segundo Luísa Maria. O episódio foi provocado pela falta de chuvas e a baixa umidade do ar na região, em decorrência do desmatamento da Amazônia. A análise do estudo projeta que secas extremas se tornarão mais frequentes com as mudanças climáticas, o que pode facilitar a ocorrência e a propagação de incêndios.

Plástico nos mares

O impacto da humanidade no ambiente também se revela nos meios aquáticos. A maior presença de plásticos afeta, por exemplo, as preferências alimentares da fauna marinha e a interação desta com os recifes. É o que mostram os pesquisadores do Departamento de Oceanografia e Limnologia da UFRN, ao identificar que peixes evitam áreas com maior concentração de plásticos nos recifes do litoral norte do Rio Grande do Norte (RN).

O estudo, publicado na revista Marine Pollution Bulletin, que também foi antecipado à imprensa pela BORI, descreve o comportamento alimentar de 212 peixes em recife raso em Maracajaú (RN), a maioria se alimentando de gramas de algas e macroalgas. Foi constatado que a presença de plásticos nos chamados “bentos”, que são um conjunto de organismos que recobrem o fundo dos recifes, tem reduzido a quantidade de “mordidas” que uma determinada área do fundo marinho recebe. Este fenômeno significa que os peixes se afastam das áreas com lixos plásticos e reduzem a pressão alimentar no local.

A interação alimentar foi menor nas áreas onde o plástico estava presente, ou seja, o plástico mais repeliu do que atraiu peixes – o que foi um resultado inesperado para os pesquisadores. “Esperávamos observar altas taxas de ingestão de plástico, porém, nossos resultados sugerem que esses peixes simplesmente não querem se alimentar em áreas com plástico e que não façam parte da paisagem natural marinha”, aponta Guilherme Longo, pesquisador coautor do estudo.

Nem mesmo o biofilme nos plásticos encontrados tornou o material mais atraente aos peixes. Apesar de serem nutritivos e/ou fáceis de digerir, os peixes declinaram das regiões onde havia a presença de poluentes. “Acreditamos que a presença do objeto estranho foi mais determinante para impedir a alimentação dos peixes, ou seja, é possível que outros materiais – além do plástico e que façam parte do lixo marinho – tenham um efeito parecido”, acrescenta Maiara Menezes, doutoranda em ecologia da UFRN e coautora do estudo.

O problema da ingestão do plástico por animais marinhos se tornou uma preocupação desde a década de 1970. A novidade da pesquisa está em mostrar que os peixes têm um papel ecológico importante de regular a presença e a abundância de algas e outros organismos neste ecossistema. Ainda assim, os autores pontuam a necessidade urgente de diminuir a poluição plástica dos oceanos. “Reduzir a produção do plástico e incentivar a reutilização, o descarte e o tratamento adequado dos resíduos é uma alternativa”, conclui Guilherme Longo.

Os artigos aqui publicados são de inteira responsabilidade de seus autores e não refletem a opinião da PB. A sua publicação tem como objetivo privilegiar a pluralidade de ideias acerca de assuntos relevantes da atualidade.