“Se homens fossem anjos, nenhum governo seria necessário. Se os anjos governassem os homens, nem controles externos nem internos sobre o governo seriam necessários”. Assim declamou James Madison (The Federalist, nº 51). Não somos anjos, nem heróis do povo, nem mitos. Não somos profetas ungidos por Deus, tampouco a personificação das vozes das ruas. Somos pessoas repletas de defeitos, de desejos e de interesses, sempre sujeitas a erros e a excessos, mesmo diante das melhores intenções.
Ao mesmo tempo que existem governos, regulando as relações entre as pessoas, existem instituições para controlar os governos, regulando erros e excessos, principalmente supostas violações à Constituição Federal, que, per si, é um documento de limitação de poder e de proteção de direitos e interesses ante às cíclicas incertas maiorias legislativas futuras. Há no desenho institucional do Estado o chamado “sistema de freios e contrapesos”: uma constante dinâmica interativa entre as instituições governamentais (executivas e legislativas, além de todo o sistema de Justiça) controlando os excessos uns dos outros, na busca de um equilíbrio institucional, um balanço entre política e justiça.
O “sistema de freios e contrapesos foi concebido pelo constituinte originário como parte integrante do sistema de controle recíproco dos poderes, sendo […] verdadeiro núcleo axiológico da Carta Magna”, afirmou o Supremo Tribunal Federal (STF), em julgamento realizado em 12 de setembro de 2012.
Nos dizeres de Madison, a construção de um governo “de homens sobre homens”, legítimo e democrático, submete-se ao sistema de controle institucional recíproco. Assim, os mecanismos de freios e contrapesos são necessários para controlar os abusos de governo (frente à Constituição), produtos dos interesses dos grupos no poder, bem como dos atos por eles praticados.
Em qualquer conflito levado à resolução pelo Judiciário – especialmente aqueles com repercussões sociais, econômicas e políticas –, sempre haverá vencedores e vencidos, total ou parcialmente. Os vencidos possuem as prerrogativas da discordância e da insatisfação, muitas vezes expressas publicamente. Faz parte do jogo político. Entretanto, não é saudável à democracia ou à regularidade institucional a polarização extrema do discurso, independentemente da matriz ideológica, ora enaltecendo os julgamentos colaborativos, ora produzindo ameaças nas situações de derrota judicial.
Saber ganhar e saber perder fazem parte da maturidade democrática, assim como da arte de governar.
Não somos anjos, por isso, as instituições importam. O Poder Judiciário – especialmente o STF – não existe para ser instituição colaborativa com projetos de poder, tampouco se presta a dar voz a oposições ou maiorias eleitorais de ocasião. Nem submissão, nem supremacia: apenas freios e contrapesos, peça fundamental tanto na democracia como no Estado de direito.
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