Artigo

O Brasil no novo tabuleiro global

Daniel Buarque
é pesquisador de Relações Internacionais no King’s College London (KCL), jornalista, tem mestrado em Brazil in Global Perspective pelo KCL e é autor de Brazil, um país do presente.
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Daniel Buarque
é pesquisador de Relações Internacionais no King’s College London (KCL), jornalista, tem mestrado em Brazil in Global Perspective pelo KCL e é autor de Brazil, um país do presente.

O xadrez global de forças políticas vai passar por uma transformação em 2021. A posse de Joe Biden como novo presidente dos Estados Unidos, e a mobilização mundial em torno da vacinação contra a pandemia vão reorganizar muitas das relações internacionais a partir de janeiro. Isso vai impactar no posicionamento do Brasil, que precisa definir os seus interesses e as suas alianças, a fim de evitar um isolamento que leve a um encolhimento tanto do seu papel no mundo como em perdas para a sua economia.

A mudança política nos Estados Unidos é um ponto-chave dessa questão. Biden vem demonstrando uma nova postura do país perante o mundo, com um tratamento diferente em relação ao equilíbrio de poderes, às questões ambientais e à pandemia. Além disso, espera-se alguma mudança de tom nas relações daquele país com a China, disputa econômica que tem pautado a distribuição de forças e interesses internacionais.

Nesse contexto, a diplomacia brasileira tem agido de forma perigosa. A decisão do governo Bolsonaro de não reconhecer publicamente a derrota de Donald Trump, e a declaração de que houve fraude na eleição norte-americana podem tornar difíceis as relações com os Estados Unidos sob nova administração. Enquanto pode perder o que via como sua principal aliança, o Brasil também cria embaraço nas relações com a China por conta de declarações do filho do presidente, Eduardo Bolsonaro, além de outros comunicados do próprio Itamaraty.

Para completar o cenário de difícil posicionamento brasileiro, vem queimando pontes com seus principais parceiros comerciais e diplomáticos pelo mundo. Um levantamento divulgado pelo professor de Relações Internacionais da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), Dawisson Belém Lopes, indica que, apesar de ter a oitava maior rede diplomática do mundo, o Brasil parece caminhar para um isolamento internacional cada vez maior. Além dos problemas criados com os Estados Unidos e com a China, as ações têm feito o País se distanciar da Holanda, da Argentina, da Espanha, da Alemanha, do México, do Canadá e da França –  países que compõem a lista de nossos principais parceiros comerciais e diplomáticos.

Em torno do discurso de Ernesto Araújo, ministro das Relações Exteriores, de que o Brasil supostamente defende a liberdade e que não há problemas em se tornar um pária, o País vem construindo alianças com governos tanto populistas quanto autoritários de viés conservador, como Hungria e Ucrânia, que não têm peso político ou econômico para compensar o afastamento dos seus parceiros tradicionais.

Nesse contexto, também houve uma troca de elogios entre Bolsonaro e Vladimir Putin, presidente russo, que pode indicar maior aproximação entre as nações. Esse posicionamento também não é suficiente para compensar as perdas econômicas que podem ser geradas pelo desgaste nas relações com os parceiros comerciais do Brasil. Apesar de ser uma potência, a Rússia baseia sua força em poder militar, com isso não teria como se tornar um parceiro tão importante para o Brasil como a China ou os Estados Unidos. Assim, o País pode ficar sem referência, sem lado e sem uma posição clara neste reposicionamento de forças globais.

A situação é ainda mais complicada pelo fato de que o Brasil é visto pelas grandes potências como um “peão” nesse tabuleiro geopolítico. Por mais que os países reconheçam seu tamanho, o potencial do País e da sua economia, e por mais que queiram formar alianças ou parcerias, o Brasil não é uma prioridade para as peças mais fortes nesse jogo global.

Pelo contrário, o “peão” brasileiro vai se ver sob pressão das potências internacionais. Enquanto cresce a mobilização em torno de políticas contra o aquecimento global, pode se tornar o alvo central de críticas e de políticas que possam atrapalhar a economia nacional.

O Itamaraty precisa avaliar com cuidado essas movimentações geopolíticas na recomposição de forças a partir do próximo ano, a fim de tentar se posicionar de forma a evitar seu isolamento, buscando maneiras de projetar o País, atraindo mais trocas comerciais e diplomáticas. Isso requer rever muito do que foi feito pela nova política externa. É preciso ver que não é o único a defender a ideia de liberdade, entender também que a economia nacional depende dessas relações globais e deve ser prioridade perante pautas ideológicas que realmente arrisquem deixar o Brasil sozinho.

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