A despeito da alta fragmentação partidária que caracteriza o atual sistema político brasileiro, desde 1994 que a disputa pelo Executivo Federal se concentra em dois blocos. Durante maior parte deste período, os blocos eleitorais que reuniram o eleitorado se concentraram no PT e no PSDB. Em 2018, o PSL ocupou a posição perdida pelo PSDB e herdou a gorda fatia do fundo eleitoral e partidário, agora recursos do União Brasil.
Desde a metade do ano passado, esboçou-se uma aliança entre diversos grupos e partidos da centro-esquerda à direita, em busca de viabilizar uma terceira candidatura viável, que foi equivocadamente denominada terceira via. Ainda que as eleições estejam distantes, a próxima data relevante é o 15 de agosto, quando vence o prazo para o registro de candidaturas ao Executivo no TSE. Até lá, vamos ver se será concretizada a aproximação entre Simone Tebet e João Doria, o que restará para Eduardo Leite e se Luciano Bivar conseguirá trazer para perto Moro, Mendonça e Mandetta.
Por ora, o que temos observado é a consolidação do ex-presidente Lula num patamar confortável e o crescimento, que não pode ser desprezado, do incumbente Jair Bolsonaro. O abandono do Podemos e a falta de espaço no União Brasil provavelmente excluíram definitivamente Sergio Moro da disputa, o que resultou numa reação nas intenções de voto no presidente Jair Bolsonaro. O indulto a Daniel Silveira, no entanto, surtiu efeito negativo dentre o eleitorado menos fiel de Bolsonaro, e, a partir de então, as intenções de voto dele pararam de crescer.
Ao que tudo indica, 2022 ficará conhecido como o ano em que se discutiu o segundo turno já no primeiro, em que se colocou o carro na frente dos bois. A ferramenta institucional do segundo turno serve, sobretudo, para construir a legitimidade do candidato eleito. No nível federal, nunca tivemos uma eleição para o Executivo em que o vencedor do primeiro turno perdesse no segundo, mas este costuma ser um período relevante para construir a base partidária que apoiará o governo no Legislativo quando eleita.
Mesmo diante de todos os elementos sui generis que caracterizaram as eleições de 2018, com a deslegitimação dos partidos, o atentado a um dos candidatos e a ausência de candidato incumbente (o presidente era Michel Temer, que assumiu após o impeachment), um elemento seguiu semelhante às eleições anteriores: o padrão eleitoral de dois grandes grupos com mensagem ideológica. O PT seguiu capitaneando a esquerda, e a direita do PSDB é substituída pelo PSL. Esse padrão parece se repetir em 2022. Se as curvas de tendência se mantiverem, é provável que, em setembro, estejamos às voltas com dois candidatos levando ¾ das intenções de voto.
No primeiro turno, a presença de outras candidaturas tentando calibrar o discurso para uma parcela da população que não se vê contemplada em nenhum dos dois projetos majoritários costuma influenciar pequenos ajustes programáticos no segundo. Para que isso aconteça, no entanto, é preciso que a candidatura em questão tenha alguma relevância eleitoral. É preciso também que essas candidaturas apresentem diferenças programáticas claras para além de ressentimentos pessoais. Nas eleições deste ano, há ressentidos para todos os lados em que se olha.
O risco deste adiantamento do segundo turno é que a agenda de costumes domine os debates e sobrepuje a discussão sobre políticas públicas, gestão da pandemia, inflação e salário mínimo. Não é preciso estar muito atento para constatar que Jair Bolsonaro não se sai bem neste debate, porque não tem bons resultados de políticas públicas, tampouco econômicos, para apresentar. Porém, Bolsonaro representa bem os posicionamentos conservadores da agenda de costumes já tradicional: aborto, união homoafetiva, redução da maioridade penal. Nenhuma das quais fará qualquer diferença na condução do governo numa eventual eleição.
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