Dispositivos que se utilizam de sistemas de Inteligências Artificiais (IAs) têm sido massivamente difundidos no mundo. É comum ver a interação de pessoas com assistentes virtuais como Siri (Apple) e Alexa (Amazon); sistemas de recomendação de filmes, músicas e livros em plataformas, como Netflix, Spotify e Amazon; mídias sociais que organizam os conteúdos de forma customizada, como Facebook, Instagram, Twitter e Tiktok; chatbots que atendem clientes ou traduzem textos para diferentes idiomas; assistência médica que se utiliza da ferramenta para ajudar em diagnósticos; IAs que geram conteúdos, como ChatGPT (Open AI), BERT (Google), Ernie (Baidu) e Albert (Google); ou IAs especializadas na geração de imagens, como DALL-E (OpenAI) ou Midjourney. Essas tecnologias também são usadas na política em diversos contextos. O governo de extrema direita de Israel, de acordo com investigação conjunta de jornalistas palestinos e israelenses para a revista +972, utiliza uma ferramenta baseada em IA chamada Lavender, com uma taxa de erro de 10%, para identificar alvos de bombardeio em Gaza.
Em contextos democráticos, as IAs têm assistido, para o bem e para o mal, políticos em mandatos e em campanha eleitoral. Os potenciais problemas proporcionados pelo uso malicioso de IAs nas eleições, por exemplo, passam pelo aumento da desinformação, pelo microtargeting, campanhas que enviam mensagens altamente personalizadas para influenciar o voto, mediante ataques cibernéticos coordenados pela discriminação algorítmica, colocando-os em bolhas de desinformação, e falta de transparência.
No caso brasileiro, nota-se que o sistema eleitoral passou por muitas mudanças no decorrer dos anos. Em 1988, quando a Constituição foi promulgada, fundaram-se os alicerces da democracia. No entanto, obviamente, não foi pensado em como os avanços tecnológicos poderiam impactar as instituições. A partir das experiências vistas no mundo, o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) brasileiro, em fevereiro deste ano, começou a tomar precauções para garantir que as eleições municipais de 2024 corram bem.
Nessa toada, proibiu o uso de IA para criar e propagar conteúdos falsos nas eleições. Diante da alteração da Resolução 23.610/2019, que regulamenta a propaganda eleitoral, o TSE proibiu várias atividades que se utilizam da tecnologia, como “proibição de deepfakes; obrigação de aviso sobre o uso de IA na propaganda eleitoral; restrição do emprego de robôs para intermediar contato com o eleitor; e responsabilização das Big Techs que não retirarem do ar, imediatamente, conteúdos com desinformação, discurso de ódio, ideologias nazista e fascista, além dos antidemocráticos, racistas e homofóbicos” (TSE, 2024).
Além disso, houve o acréscimo de dois artigos no Código Eleitoral, como o artigo 9º-C, que proíbe o uso de “conteúdo fabricado ou manipulado para difundir fatos notoriamente inverídicos ou descontextualizados com potencial para causar danos ao equilíbrio do pleito ou à integridade do processo eleitoral”, e o artigo 9º-E, que “estabelece a responsabilização solidária dos provedores, de forma civil e administrativa, caso não retirem do ar, imediatamente, determinados conteúdos e contas, durante o período eleitoral” (TSE, 2024). Essa resolução foi classificada pelo presidente do TSE, o ministro Alexandre de Moraes, como uma das normas mais modernas do mundo.
O potencial da IA é grande, mas é preciso que se tenha olhar crítico. Apontar os riscos não nos coloca numa posição contra avanços tecnológicos. Ao contrário, entender que a sociedade está em constante evolução também é compreender a necessidade de salvaguardar os direitos fundamentais, como a proteção e a democratização dos dados. Apesar dos avanços trazidos pelo TSE, ainda é difícil prever os impactos da IA sobre as campanhas eleitorais. O que podemos perceber é que a velocidade que se propaga a desinformação é desproporcional à da checagem de fatos — e, nas eleições, será necessário um monitoramento mais contundente e especializado. Serão, ao todo, 5570 cidades elegendo prefeitos em todo o Brasil. Isso significa que TSE, juntamente com os Tribunais Regionais Eleitorais, terá muito trabalho para monitorar essa quantidade de campanhas de forma simultânea.
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