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Juventude, inovação e vivência na gestão pública

Marco Camargo
é diretor do Vetor Brasil, Organização da Sociedade Civil (OSC) suprapartidária e sem fins lucrativos
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Marco Camargo
é diretor do Vetor Brasil, Organização da Sociedade Civil (OSC) suprapartidária e sem fins lucrativos

Merenda, transporte, infraestrutura, currículo, professores bem formados e aprendizagem garantida. Todos estes elementos – e ainda o acesso à tecnologia, que escancarou a desigualdade entre estudantes durante a pandemia – são essenciais na gestão da educação pública. Melhorar as ações pedagógicas urge em um país onde a disparidade se reflete na aprendizagem: sete em cada dez alunos de nível socioeconômico alto, do ensino médio, aprendem o adequado em Língua Portuguesa; entre os menos favorecidos, a proporção cai para dois em cada dez (dados de 2017 do Anuário Brasileiro da Educação Básica 2020).

A implementação de políticas educacionais no Brasil envolve o esforço de profissionais de todos os entes federativos, atuantes em locais com realidades muito diversas – por isso, pode ser considerada um wicked problem. O termo, cunhado por especialistas de gestão pública, indica problemas cada vez mais complexos, transversais e incertos, sem resposta ou solução definida anteriormente.

Para enfrentar desafios como esse, há um cenário em que apenas 10% dos servidores estaduais efetivos têm menos de 30 anos, e um terço deve se aposentar na próxima década[1]. Quem serão os substitutos no futuro? Como estão sendo preparados? Esta lacuna motiva o Vetor Brasil, organização da sociedade civil suprapartidária e sem fins lucrativos, a atrair, pré-selecionar e desenvolver (além de alocar) profissionais em governos de todos os Estados.

De modo pioneiro no País, criou o Programa Trainee de Gestão Pública, e em 2020, a sua modalidade de residência. A inspiração para o modelo de residência veio de experiências brasileiras em outros setores e de ideias inovadoras de outros países. Em 2019, a Universidade Stanford divulgou um manifesto defendendo a necessidade de expor os estudantes à vivência prática para solucionar problemas públicos. Já o Growth Lab, da Escola de Política Pública de Harvard, funciona tal qual uma residência médica em que recém-graduados, doutorandos e mestrandos não atendem pacientes, mas governos, por meio de pesquisa aplicada.

Esta conexão entre teoria e prática faz parte do dia a dia dos 30 residentes que colaboram com secretarias de 26 Estados na Residência em Gestão Pública com Foco em Educação, iniciada em maio de 2020. Fruto da parceria do Vetor Brasil com a Fundação Lemann e o Instituto Sonho Grande, o programa combina a pós-graduação lato sensu em Gestão Pública com a experiência na implementação de duas políticas centrais na educação pública: a Base Nacional Comum Curricular (BNCC) e o Ensino Médio em Tempo Integral (EMTI).

Atuando no fomento ao EMTI em Tocantins, a residente Ana Flávia Acerbi cita três vantagens: o conhecimento adquirido na pós-graduação, o apoio da organização para qualificar as entregas para o Estado e a participação na Rede Vetor Brasil. Composta por mais de 500 integrantes de programas do Vetor Brasil, a rede permite não só trocar saberes, como também conhecer boas práticas de todas as regiões do País.

Por estimular e preparar os residentes para elaborar políticas públicas efetivas, o modelo da Residência em Gestão Pública merece, cada vez mais, a atenção da filantropia, de apoiadores, principalmente dos governos. Formar uma geração de profissionais com conhecimento acadêmico e vivência dos desafios locais traz confiança na capacidade de superar  wicked problems. Ano a ano, amplia-se este contingente de novos talentos, fortalecendo o setor público para encontrar tanto soluções inovadoras quanto alcançar avanços tão cruciais – como a aprendizagem de todos os estudantes.


[1] Santos; Carvalho; Martins, 2017.

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