O presidente da Mesa é responsável por definir a pauta do plenário, indicar membros de comissões, acolher denúncias e aceitar pedidos de formação de comissões especiais – dentre elas, comissões parlamentares de inquérito e de investigação. Não existe possibilidade de estabelecer um processo de impeachment sem a anuência do presidente da Mesa. O cargo é, portanto, posição-chave para a construção da coalizão e da governabilidade, além de ser muito importante para o presidente da República.
Muitas conjecturas e placares vêm sendo construídos para tentar antecipar o resultado da eleição para a Mesa da Câmara dos Deputados. O número de integrantes e a grande discrepância entre os membros torna os resultados mais incertos do que os do Senado Federal. Além disso, cabe lembrar que, enquanto na Câmara dos Deputados o mandato é dos partidos, os senadores são “donos” dos próprios mandatos. Não seria, portanto, exagero dizer que os partidos políticos são mais importantes na Câmara do que no Senado.
A despeito da percepção coletiva da completa inutilidade e desimportância dos partidos políticos, estudos empíricos em Ciência Política apontam para o considerável peso dos partidos no comportamento parlamentar em plenário na Câmara. Isso porque nosso parlamento conta com a figura, possivelmente singular, da orientação de voto. Sabemos como se posicionam os partidos nas votações e sabemos como votam os parlamentares. Sabemos que, portanto, os parlamentares votam com seus partidos quase sempre. Exceções existem e são emblemáticas, a exemplo do mais recente episódio da votação da Reforma da Previdência e o imbróglio entre a deputada Tabata Amaral e o PDT.
Se a força dos partidos é virtualmente incontestável em matéria legislativa, o voto secreto que caracteriza a eleição para a presidência da Mesa da Câmara faz esta dimensão do comportamento parlamentar bem menos partidária.
Se os partidos têm peso decisivo no comportamento parlamentar, o presidente é o principal responsável por iniciar leis em coalizões bem formadas, além de gerir os tão desejados recursos. Curioso é que a construção de coalizão para que haja governabilidade não é responsabilidade formal de nenhum representante eleito. Além disso, a formalização da base do governo por meio do compartilhamento de pastas ministeriais e execução de emendas parlamentares foi a regra não escrita observada por todos os chefes do Executivo antes do presidente Jair Bolsonaro.
Duas características eram fundamentais para a ocupação da cadeira máxima da Casa até hoje: trânsito entre diversos partidos e ser membro da coalizão de governo. Como Bolsonaro não se considerou responsável por construir governabilidade e a própria figura da coalizão parece, agora, coisa dos livros de História, as eleições para a Mesa da Câmara – que já se caracterizavam por um considerável grau de incerteza – estão mais abertas do que nunca.
Daí o risco de criar um “leilão” entre os parlamentares. Assim como ocorre em toda eleição apertada, o voto mais valioso é aquele que pode mudar. Neste contexto, o incentivo institucional do voto secreto é o de que parlamentares não tenham posicionamentos “fortes” a ponto de não haver orientação clara de voto e ser possível, portanto, negociar de forma mais vantajosa o seu apoio. Em outras palavras, o parlamentar “indeciso” é mais desejado e tem mais poder de barganha do que os parlamentares que denotam posicionamentos claros e ostensivos.
Apesar de todos os problemas de democracia interna e transparência, os partidos políticos permanecem sendo a melhor forma de reduzir as incertezas e evitar situações como essas, de leilão de votos, especialmente naqueles com orientações programáticas claras. Se a democracia é o pior de todos os sistemas, com exceção de todos os outros, o sistema de partidos segue a mesma lógica. Ruim com ele, pior sem ele.
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