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Recuperação lenta

Antonio Lanzana
é copresidente do Conselho de Economia Empresarial e Política (CEEP) da FecomercioSP e professor na Universidade de São Paulo (USP) e na Fundação Dom Cabral (FDC).
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Antonio Lanzana
é copresidente do Conselho de Economia Empresarial e Política (CEEP) da FecomercioSP e professor na Universidade de São Paulo (USP) e na Fundação Dom Cabral (FDC).

Os impactos da pandemia de covid-19 sobre a economia brasileira são arrasadores, como mostram os indicadores de nível de atividade relativos ao segundo trimestre deste ano. Dados de abril (relativamente ao mesmo mês de 2019) mostram: queda de 15,1% do Produto Interno Bruto (PIB)  –  em medição obtida pelo Índice de Atividade Econômica do Banco Central –; contração de 27,1% no volume de vendas do comércio ampliado – segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) – e redução de 27,2% na produção industrial (IBGE). Como seria de se esperar, os reflexos sobre o mercado de trabalho foram imediatos, com a “destruição” de 1,1 milhão de postos de trabalho com carteira assinada em março e abril – de acordo com os dados do Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged). Chama a atenção também os impactos muito diferentes entre os segmentos: no setor de comércio, por exemplo, enquanto nos supermercados, as vendas cresceram 5,8%, o segmento têxtil e vestuário registrou retração de 75,5%.

Em maio e junho deste ano, observamos ligeira melhora em relação ao mês precedente, mas muito longe de evitar uma queda expressiva no segundo trimestre. Isso pode ser observado pela evolução do Índice Cielo do Varejo Ampliado, nas comparações com períodos iguais do ano passado. Em abril, houve diminuição de 36,5% e em maio, caiu mais 30,5%; além de variação quadrissemanal na terceira semana de junho: 24,2% negativos. Observa-se o crescimento de 11,5% nas vendas de automóveis em maio na comparação com abril, mas em relação a maio de 2019 houve retração de 77,8%. Além disso, informações pontuais obtidas junto a lojistas em junho sinalizaram que mesmo após a abertura parcial dos shoppings, as vendas têm sido muito fracas.  

O que esperar para os próximos meses? Como há capacidade ociosa na economia brasileira, o nível de atividade dos próximos meses será determinado basicamente pelo consumo das famílias, que representa 67% da demanda agregada. Decerto vai ocorrer um aumento do consumo à medida em que as normas de isolamento forem relaxando, o que significa dizer que o segundo trimestre foi o “fundo do poço”. É importante observar, porém, que a velocidade de crescimento não será acelerada.

Nesse sentido, cabe destacar: a) as medidas de redução de isolamento serão graduais e podem ser revertidas, dado o risco de uma segunda onda; b) os consumidores estão  inseguros, não somente pela questão sanitária, mas também pelo risco de perda de emprego e salário, o que inibe suas decisões de consumo e de endividamento; c) muitos perderam poupança e vão procurar recompô-la; d) a renda caiu em função do aumento do desemprego, acordo de reduções de jornadas e salários (10,6 milhões de acordos) e a transferência de renda direta do governo será extinta; e) há também restrições do lado da oferta: espaçamento entre mesas nos restaurantes e controle do número de clientes nas lojas.

Pode-se concluir, portanto, que a recuperação será gradual, indicando que a “travessia” será mais longa que a inicialmente prevista. Isso traz à tona a questão do fôlego financeiro das empresas (para muitas já esgotado) e a importância crucial do crédito, principalmente para pequenas e médias. Apesar da preocupação do Banco Central em promover liquidez ao sistema financeiro, a realidade mostra que decorridos meses desde o início da pandemia as pequenas e as médias empresas continuam tendo dificuldades de acessar o crédito, pela impossibilidade de oferecerem garantias. As linhas de crédito específicas para pequenas e médias demoram demais para “chegar na ponta”, colocando em xeque a sobrevivência de muitas empresas. E nunca é demais lembrar que menos empresas significa menos empregos.

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