Artigo

Sobre má-fé processual eleitoral

José Mário Wanderley Gomes Neto
é doutor em Ciência Política, mestre em Direito Público pela Universidade Federal de Pernambuco (UFPE) e docente da Universidade Católica de Pernambuco (Unicap). Integra o grupo de especialistas que escrevem às quartas-feiras na coluna "Ciência Política" da PB.
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José Mário Wanderley Gomes Neto
é doutor em Ciência Política, mestre em Direito Público pela Universidade Federal de Pernambuco (UFPE) e docente da Universidade Católica de Pernambuco (Unicap). Integra o grupo de especialistas que escrevem às quartas-feiras na coluna "Ciência Política" da PB.

O processo eleitoral brasileiro, mais precisamente o segundo turno das eleições presidenciais de 2022, foi objeto de impugnação parcial por um partido político que instaurou processo judicial questionando o resultado final. Duas características se destacam naquele pedido: a insistência na contestação da lisura do procedimento eleitoral pelas urnas eletrônicas (sem qualquer nova prova técnica) e a pretensão de impugnação apenas do resultado do segundo turno presidencial (no qual teria sofrido derrota), sem qualquer efeito sobre o primeiro turno das eleições (no qual conseguiu expressiva bancada no Senado e na Câmara).

O mesmo conjunto de urnas eletrônicas foi utilizado nos dois turnos do pleito eleitoral de 2022. No Direito brasileiro, a ninguém é permitido se beneficiar da própria torpeza: um mesmo ato (ou conjunto de atos) não pode ser válido para os interesses de um e nulo para os interesses de outros, seus adversários. Isso ocorre porque as relações negociais e processuais devem ser regidas pela boa-fé, havendo mecanismos institucionais para identificar e punir tais condutas. 

Repetições de ações já ajuizadas, incidentes processuais infundados, abuso do direito de defesa, recursos desmotivados ou com propósitos claramente protelatórios, demandas novas sobre assuntos já esclarecidos, cuja decisão anterior já transitou em julgado (coisa julgada), enfim, vários são os exemplos de situações em que as partes (e seus procuradores) deliberadamente se utilizam de um processo (não para resolver um conflito, mas) para prejudicar a parte contrária, induzir o julgador a erro, prolongar uma situação jurídica irregular, entre outras finalidades, no mínimo, reprováveis. Recentemente, surgem demandas processuais construídas para gerar narrativas políticas de perseguição institucional.

Viola a boa-fé processual um demandante querer impugnar judicialmente a lisura de um procedimento eleitoral e, ao mesmo tempo, querer manter para si todos os benefícios obtidos mediante o mesmo procedimento. Pretensões manifestamente temerárias e infundadas contrariam a boa-fé e, caso não corrigidas no momento oportuno, produzem a extinção do processo em seu início e a aplicação de multa.

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