Em março, ocorreu mais uma edição do Festival SXSW na cidade de Austin, nos Estados Unidos. Uma overdose de conteúdos foi apresentada, com trilhas de Inteligência Artificial (IA), mudanças climáticas, energia, moda, indústria do cinema e da TV, games, engajamentos governamental e cívico, saúde, música, psicodélicos, esportes, startups, transporte, futuro do trabalho, entre outros. Para os não familiarizados, o nome South by Southwest é uma homenagem a um dos filmes do renomado cineasta Alfred Hitchcock, Intriga Internacional (North by Northwest, em inglês), lançado em 1959. A escolha do nome foi uma sugestão de Louis Black, editor do jornal Austin Chronicle e um dos cofundadores do festival ao lado de Roland Swanson e Nick Barbaro. Na sua estreia, em 1987, o evento contou com a participação de 700 pessoas.
Retornando a 2024, o SXSW emergiu como um dos principais eventos anuais para os interessados em inovação. A estimativa da organização apontou a presença de mais de 200 mil participantes, incluindo milhares de brasileiros. Para responder à pergunta do início do texto, alguns exemplos: durante todos os dias do festival, foi comum ouvir as pessoas falando português pelas ruas de Austin. Neste ano, essa tendência se intensificou graças à marcante presença do Governo do Estado de São Paulo no SXSW, representado pela Casa São Paulo, com um espaço exclusivo em frente ao principal centro de convenções da cidade norte-americana.
O projeto marcou presença com o intuito de promover iniciativas voltadas a negócios e atração de investimentos estrangeiros para o Estado. De acordo com a Secretaria Estadual de Cultura, o objetivo foi destacar a capital paulista como o principal polo de inovação e economia criativa da América Latina, além de atrair investimentos do exterior. A casa, que recebeu milhares de visitantes, ofereceu uma programação paralela ao festival, incluindo palestras, debates e apresentações musicais.
Outra presença de destaque foi o do Itaú. Pelo segundo ano consecutivo patrocinando o SXSW, o banco ofereceu tradução gratuita de cem palestras do evento. Uma dica valiosa: as palestras traduzidas pelo Itaú estão disponíveis de forma gratuita no canal oficial do SXSW no YouTube. Aliás, a organização do festival continuará divulgando os painéis na plataforma até o mês de maio.
Uma das conferências mais disputadas todos anos — e que, em 2024, exigiu uma espera de pelo menos uma hora na fila — foi a apresentação da fundadora e CEO do Future Today Institute, Amy Webb. No SXSW, ela revela o seu relatório anual de tendências tecnológicas. É possível acessar o documento completo pelo link.
Os conteúdos de Amy sobre tecnologia se tornaram referência para líderes e inovadores do setor. Com análises fundamentadas em dados, ela e sua equipe identificam tendências que oferecem uma visão mais clara para orientar decisões nos negócios e na carreira. A futurista destaca que todos nós entramos em um “superciclo tecnológico”, impulsionado pelos avanços em biotecnologia, IA e ecossistemas conectados. Ela afirma que esse superciclo está aqui para mudar o curso da história humana. “Coletivamente, todos nós estamos passando por uma coisa importante agora, o que faz de nós a geração T. Nós somos a geração da transição. Todas as pessoas que estão vivas hoje, cada uma de vocês, faz parte de uma grande transição, o que significa que a nossa sociedade será muito diferente quando essa transição estiver completa”, explicou Amy.
Outro painel que teve “casa cheia” durante o festival contou com a participação do CEO da Uber, Dara Khosrowshahi, e o prefeito da cidade de Austin, Kirk Watson. O modelo do painel foi dinâmico, pois o CEO entrevistou o prefeito, e o prefeito entrevistou o CEO. Apesar das perguntas pré-combinadas, as respostas não estavam. Ambos tiveram uma conversa franca sobre como a indústria e o governo podem usar a tecnologia para enfrentar a crise climática, e como será o futuro da mobilidade e entrega, incluindo transportes público e compartilhado. Um dos temas da conversa foi os testes de carros autônomos que a multinacional realizou na cidade de Austin. O carro sem motorista foi testado, e os resultados não foram satisfatórios. Sobre esse tema, o prefeito Watson questionou por que a Uber não convidou os órgãos públicos para participar de forma conjunta das avaliações — enfatizando assim, a necessidade da participação do Poder Público, principalmente nas ações que envolvem novas tecnologias.
Uma trilha que marcou o SXSW 2024, entre os diferentes painéis — e também na discussão com os participantes —, foi o fato de que “estamos com um grande problema para resolver imediatamente”. Esse quebra-cabeça a ser solucionado é a forma como se utilizam os dados das pessoas por empresas e governos, potencializada nos últimos meses com o uso da IA. Não sabemos o que ocorre com os nossos dados — e, ao que parece, as empresas não têm respostas para isso. Nesse contexto, o brasileiro Ronaldo Lemos, diretor do Instituto de Tecnologia e Sociedade do Rio de Janeiro (ITS Rio) falou sobre o futuro da moderação de conteúdo. O painel que Lemos participou mostrou o “buraco” que existe entre o ritmo da mudança tecnológica e o desenvolvimento de novas regulamentações. Uma das saídas, segundo ele, é fortalecer a atuação de órgãos independentes para contribuir na construção de leis e regulamentações. O advogado lembrou o sucesso que foi a construção da Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD) no Brasil, que, hoje, é um dos exemplos para o mundo.
Durante as discussões, foram exploradas potenciais medidas para preservar a privacidade dos indivíduos, incluindo a ampliação dos recursos destinados à segurança cibernética, além de uma compreensão mais aprofundada sobre como os dados são organizados e os rastros do que é deixado online. Durante o painel que Lemos participou, foi enfatizado ser crucial estabelecer conexões entre dados pessoais e as inovações tecnológicas, visando garantir que cada pessoa se sinta protegida ao utilizar dispositivos digitais.
Uma narrativa contínua da inventividade humana permeia a história, desde a invenção da roda até os avanços dos microchips. No Festival SXSW, os robôs semelhantes a humanos foram apresentados, revelando a capacidade de lidar com as tarefas cotidianas e liberar as pessoas para perseguir os seus verdadeiros interesses. No entanto, fica a dúvida: será que isso realmente vai acontecer? Durante um dos painéis a respeito da robótica humanoide, surgiu Apollo, um androide de última geração da empresa Apptronik. Os expositores demonstraram como é possível unir os campos da tecnologia e da arte criativa, oferecendo uma visão clara do que está por vir.
O futuro (ou melhor, o nosso presente), revelado no SXSW 2024, já se tornou mais do que uma promessa. Muitos dos aspectos anteriormente vistos apenas em filmes, agora, são realidades tangíveis, especialmente com a crescente simplicidade na utilização da IA. Essa realidade desafia diariamente as pessoas a se atualizarem e compreenderem esse novo mundo em que vivem. Apesar do avanço tecnológico, é improtante que a empatia e as interações humanas sejam mantidas e aprimoradas.Essas questões também marcaram presença em vários painéis. A mensagem passada em diferentes debates foi que a tecnologia é o resultado de uma programação feita por nós, humanos. Por trás de todo algoritmo há uma pessoa que precisa fazer o upload das informações que a máquina vai seguir.
Como salientado por Amy Webb: “Nesta era de transição, é essencial que abordemos este momento da história com protagonismo, empatia e de forma humanizada, a fim de construir um mundo melhor do que o presente”.
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