As últimas eleições municipais mais uma vez demonstraram que, a despeito da cor de suas bandeiras, há quatro tipos de partidos políticos no Brasil: os que têm capilarização nos municípios menores, os que elegem a maior parte de suas bancadas nos grandes centros urbanos, os que têm porcentuais semelhantes de representação independentemente do tamanho dos municípios e os que não obedecem a esse critério.
Dentre os mais capilarizados, o melhor exemplo é o MDB [Movimento Democrático Brasileiro] que teve quase 13% dos votos para vereador nos municípios de até 20 mil habitantes e menos de 5% nos maiores de 500 mil. Outros partidos que obedecem ao padrão são PP [Progressistas] e PSD [Partido Social Democrático]. No extremo oposto está o PSOL [Partido Socialismo e Liberdade], que não alcançou 0,5% dos votos nos municípios menores, mas teve 5% nos maiores. Depois há os partidos em que não há grande variação no porcentual de votos recebidos de acordo com o tamanho dos municípios, como PSDB [Partido da Social Democracia Brasileira], DEM [Democratas], PDT [Partido Democrático Trabalhista], PSB [Partido Socialista Brasileiro] e Republicanos.
É certo que o tempo de existência do partido influencia esse padrão, uma vez que o processo de abertura de diretórios com o envolvimento da população é mais custoso e lento nos municípios menores. Influencia também a ocupação de cargos do Executivo, que facilita essa capilarização. Porém, é preciso pensar também nas características específicas da política local de municípios menores, ou seja, como ela se relaciona com o sistema partidário e a política nacional. Em toda eleição municipal se repete o mesmo: alianças eleitorais de partidos que são absolutamente antagônicos na esfera nacional ocorrem na esfera municipal e são apresentadas como grandes absurdos.
A política local em municípios menores sofre menos impacto das clivagens típicas da política nacional. Isto é, no nível local muitas vezes é mais importante o posicionamento sobre a construção ou não de um viaduto ou sobre o horário da lei do silêncio do que a descriminalização do aborto ou privatização dos Correios. Relações pessoais e espaços nos grupos muitas vezes influenciam mais do que afinidades ideológicas mais amplas. Como as relações são mais próximas do que em municípios grandes e na esfera nacional, isso não precisa necessariamente ser um problema. Tanto partidos como ideologias servem justamente para reduzir a distância entre representantes e eleitores; essa distância é um problema menor na esfera local de municípios menores.
Nos Estados Unidos, há um ditado que diz que “all politics is local”, isto é, toda política é local. Ainda que muitos argumentem que a frase não é mais tão representativa da política norte-americana hoje como já foi há 40 anos, há um grau de verdade nisso quanto à formação e prática política dos parlamentares. Nosso sistema eleitoral proporcional permite que questões mais amplas e menos locais ocupem espaço nos Legislativos, mas quanto menor o tamanho do corpo Legislativo, menor o possível impacto do sistema proporcional em incluir diferentes grupos. Em outras palavras, é mais fácil para partidos ideológicos que comportam questões mais amplas ocuparem cadeiras em assembleias maiores.
Ocorre que, no âmbito nacional, uma considerável parte dos políticos iniciaram suas carreiras em âmbitos menores, reproduzindo na esfera nacional a forma como sempre fizeram política até então. A representação destas questões fica então prejudicada ou contaminada não só pelo bom e velho governismo, como também pelas práticas fisiológicas e clientelísticas preguiçosamente apelidadas de “Centrão”. O “Centrão” não existe, o “Centrão” é uma forma de fazer política nacional com as piores características da esfera local.
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