é professor do Ibmec e da Fundação Dom Cabral e também é colunista do Valor Econômico
é professor do Ibmec e da Fundação Dom Cabral e também é colunista do Valor Econômico
Nós não somos muito bons em aprender com as tragédias e mudar o curso de nossas ações para evitar danos futuros. A cada janeiro, as chuvas castigam as regiões Sul e Sudeste, trazendo enchentes e deslizamentos de terra, prejuízos e morte – e muito pouco é feito em termos de prevenção. No Nordeste, desde os tempos do Império se cobram ações do governo para minimizar os desoladores impactos das secas, num drama cíclico que leva fome e sofrimento a milhões de brasileiros.
O ano de 2020 acrescentou um componente de imprevisibilidade no extenso catálogo de desgraças que assolam o Brasil. O estado de calamidade pública, causado pelo novo coronavírus, se alastrou pelo País, e nos aproximamos cada vez mais de uma marca trágica observada há um século. Entre 1918 e 1919, em torno de 35 mil brasileiros foram dizimados pela gripe espanhola, pouco mais de 0,1% da população à época. Depois de cem anos, em pleno século 21, a cada dia que passa estamos mais perto desta macabra proporção – e nem bem saímos da primeira onda de infecção, com uma segunda à nossa espreita.
Para os políticos, culpar a natureza – as chuvas, a seca ou o vírus – sempre foi o caminho mais fácil. Situações imprevistas, casos de força maior ou fatos previsíveis (porém, de consequências incalculáveis) são frequentemente alegados para justificar catástrofes. Nos primeiros meses da pandemia, gastamos muito da nossa energia discutindo o dilema entre priorizar a saúde ou a economia na nossa reação à disseminação do covid-19. Passado praticamente um ano com a doença dominando nossas vidas, é preciso reconhecer que este impasse era falso, e que ações em ambas as direções eram necessárias para reduzir os danos sociais provocados pelo vírus.
Olhando em retrospecto, precisamos tirar algumas lições deste fatídico ano, para evitar a recorrência de seus trágicos efeitos no futuro. A pandemia provou que um sistema público de saúde é absolutamente imprescindível para lidar com uma crise sanitária de grandes proporções. As diferentes dinâmicas observadas nas distribuições regional e social dos óbitos, porém, sinalizam os imensos desafios que temos na melhoria da gestão e na uniformização do padrão de atendimento do Sistema Único de Saúde (SUS) ao longo do território nacional.
Outras deficiências no provimento de serviços públicos de qualidade também ficaram evidentes na pandemia, como a precariedade das condições de transporte, habitação e saneamento, que facilitaram a dispersão do vírus pelas camadas mais pobres da população. Na educação, o tema da exclusão digital, tão debatido na virada do século, ressurgiu com a incapacidade de se atender, de forma remota, os alunos da rede pública, tanto por falta de equipamentos quanto pelas dificuldades de acesso às redes de comunicação.
Na economia, o covid-19 “pegou” o País com baixa imunidade: as contas públicas já vinham em déficit há anos, e os esforços de guerra para conter os impactos econômicos da pandemia deixaram o Brasil à beira de um colapso fiscal. Além disso, o País “descobriu” uma legião de milhões de brasileiros vivendo à margem do mercado de trabalho e do sistema financeiro, pressionando ainda mais as finanças do governo.
Serviços públicos de melhor qualidade e mais abrangentes e uma gestão econômica mais sólida e inclusiva são demandas que há muito ecoam na sociedade brasileira. As profundas transformações de 2020 deixaram clara a necessidade de uma liderança política que ataque estes problemas de forma coordenada. Temos como ser otimistas com o cenário para 2021 e além?
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