Futebol sem gramado

29 de novembro de 2023

S

Segundo a publicação Jornal do Futsal, a ideia de jogar futebol em uma quadra surgiu na cidade de São Paulo. “O futebol de salão começou a ser praticado nos idos anos de 1940 por jovens frequentadores da Associação Cristã de Moços (ACM) da capital paulista. Em razão das dificuldades de encontrar campos de futebol, [os praticantes] improvisaram ‘peladas’ nas quadras de basquete e hóquei, aproveitando as traves usadas na prática desse último esporte”, diz o texto. De lá para cá, a seleção nacional já acumula 23 títulos mundiais: cinco copas Fifa, dois mundiais Fifusa, uma Copa das Confederações, cinco mundialitos e dez Grand Prix. Ainda de acordo com o portal, “as bolas eram de crina vegetal, serragem ou cortiça granulada e sofreram sucessivas modificações, diminuindo o seu tamanho e aumentando o seu peso, daí o fato de o futebol de salão ser chamado também de ‘esporte da bola pesada’”. Nos primórdios, a quantidade de jogadores não era sempre a mesma. “De início, as equipes variavam de número, tendo cinco, seis e até sete jogadores”, pontua o texto. “Mas, pouco a pouco, foi fixado o limite de cinco.”

Gaúcho de Osório, o educador físico Paulo Renato Vicari fez da história do futsal o seu tema de mestrado, defendido em 2015 na Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). Apesar de admitir que não há um consenso, ele acredita que a ideia tenha surgido, primeiro, em Montevidéu, no Uruguai, e só depois tenha sido trazida ao Brasil. “Ao longo da minha pesquisa, vi que a história fica entre a ACM de São Paulo e a de Montevidéu. Mas há uma tendência documental que aponta mais para o Uruguai”, explica Vicari, lembrando que, na primeira metade do século 20, o país sul-americano era uma potência do futebol (de campo), com uma seleção bicampeã olímpica (1924 e 1928), bicampeã nas Copas (1930 e 1950) e, de quebra, sede da primeira Copa do Mundo da história, em 1930. “O futebol estava fervilhando por lá. Aí, na falta de espaços para praticar, eles começaram o que se chamava de ‘indoor football’. Na ACM de Montevidéu — e a gente sabe que as ACMs têm uma relação muito forte com o esporte —, inventou-se o futebol de salão”, conta Vicari.

Segundo ele, os méritos da invenção caberiam ao treinador argentino radicalizado no Uruguai Juan Carlos Ceriani Gravier (1907–1996). “Ele juntou regras de vários esportes”, explica. “Do basquete, adaptou a quadra e a substituição dos jogadores, que podem entrar e sair a qualquer momento; do handebol, a proibição de marcar gols de qualquer distância; do polo aquático, quase todas as regras sobre o goleiro; e do futebol, a dinâmica, o objetivo é fazer o gol.”

“O treinador argentino Juan Carlos Ceriani Gravier (1907–1996) juntou, no futsal, regras de vários esportes. Do basquete, adaptou a quadra e a substituição dos jogadores, que podem entrar e sair a qualquer momento; do handebol, a proibição de marcar gols de qualquer distância; do polo aquático, quase todas as regras sobre o goleiro; e do futebol, a dinâmica, o objetivo é fazer o gol.” Paulo Renato Vicari, educador físico

Essa história é confirmada pela ACM de São Paulo, que, em texto oficial, conta que Gravier criou a versão naquele momento de “euforia que existia pelo fato de a seleção uruguaia ter vencido a primeira Copa do Mundo”. De acordo com a instituição, o jogo foi trazido à unidade de São Paulo cinco anos mais tarde, quando dois professores de educação física brasileiros retornaram de um período no país vizinho. Já o nome “futebol de salão” teria origem brasileira. “Em 1935, os professores João Lotufo e Asdrubal Monteiro, após se graduarem no Instituto Técnico da Federação Sul-Americana das ACMs como secretários-diretores de educação física da ACM, voltaram ao Brasil e introduziram o ‘indoor football’, que passou a ser chamado de futebol de salão”, descreve a entidade, que também explica que algumas peculiaridades inerentes à modalidade, por falta de ajustes no regulamento ainda inicial, ocasionavam muitos acidentes — principalmente em decorrência do “pequeno tamanho da quadra e o peso da bola”. Couberam, então, a Lotufo e Monteiro aprimorar as regras, lapidando a prática e deixando a modalidade mais equilibrada e segura. 

Há uma peculiaridade na nomenclatura, contudo, para a qual Vicari atenta: futebol de salão e futsal não são exatamente o mesmo esporte, embora o segundo tenha se desenvolvido a partir do primeiro. “O futebol de salão é uma modalidade precursora do futsal, mas houve uma transição, as regras são diferentes”, comenta, ressaltando que ambas as modalidades coexistem, mas a que se organiza sob a responsabilidade da Fifa é o futsal. “Por isso é o mais difundido.” Controvérsias à parte, fato é que a prática de jogar futebol em quadras se difundiu muito rapidamente no Brasil. “A paixão do brasileiro pelo futebol se ampliou para o futebol de salão”, ressalta Vicari. 

“O brasileiro adora jogar futebol, mas, para jogar, é preciso de um campo, de 11 pessoas de cada lado… Já no futebol de salão, dá para jogar em qualquer espaço — uma quadra de vôlei, por exemplo — e nem precisa ter cinco de cada lado”, compara. “E o espaço é fechado, ou seja, não há problema com chuva, frio etc.” Sem dúvida, um conjunto de facilidades. E o terreno fértil para a popularização do futsal foi, justamente, a quadra onde nenhuma grama nasce. 

Edison Veiga Maria Fernanda Gama
Edison Veiga Maria Fernanda Gama