Segundo levantamento da prefeitura da capital realizado em 2019, São Paulo registrava 24.344 pessoas em situação de rua à época. No Brasil, são 222 mil pessoas nesta condição, de acordo com Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea). Com a pandemia, esta realidade pode ter se deteriorado ainda mais
Na contramão do amparo insuficiente dado pelo Poder Público a esta população vulnerável, o projeto SP Invisível, criado há sete anos, busca conectar a sociedade à vida das pessoas “invisíveis” do cotidiano. “Nosso objetivo é a conscientização social, mostrando que elas têm uma história e as ajudando”, afirma André Soler, um dos criadores do projeto.
A iniciativa surgiu quando André e Vinicius Lima, junto com um grupo de adolescentes da Igreja Batista da Água Branca, resolveram fotografar tudo aquilo que não era percebido nas ruas e praças da capital. O resultado mostrou que boa parte das fotos era de indivíduos que não tinham um teto para morar, mas guardavam muitas histórias para contar. Assim, surgiu a ideia do SP Invisível.
“Percebemos que mais invisíveis do que elas [pessoas de rua], só as suas histórias. Por isso, resolvemos compartilhar os relatos”, conta Soler. Após mais de 2 mil histórias contadas nas redes sociais do projeto, alguns destes personagens conseguiram mudar de vida.
Bruno [sobrenome não divulgado para preservar a pessoa] foi fotografado pelos voluntários do projeto na Praça Roosevelt, no centro da cidade. Natural de Paranavaí, no Paraná, veio para São Paulo após uma briga com a mãe. A ideia era morar com a avó, mas ela acabou falecendo. Em vez de voltar para a cidade natal, o jovem acabou ficando pelas ruas da capital paulista – e se viciando em crack.
A história viralizou nas redes sociais até alcançar a mãe do rapaz, que veio a São Paulo e, com ajuda do SP Invisível, conseguiu contatar Bruno para levá-lo de volta ao Paraná.
As ações nas ruas contam sempre com um repórter, que colhe os relatos, e um assistente social, responsável por um possível encaminhamento da pessoa ao sistema público de acolhimento. “Nossa ajuda é muito individualizada. Sempre perguntamos como podemos ajudar, e, muitas vezes, são ajudas imediatas. Se uma mulher, por exemplo, precisa de um absorvente ou uma fralda, nós buscamos ajudá-la”, diz André.
Durante a pandemia, o projeto precisou mudar a estratégia de trabalho e promover ações mais amplas para conseguir atender a toda a população de rua. “Nós nos adaptamos muito bem. Fizemos, de carro, entregas dos kits de higiene e tentamos ao máximo atender essas pessoas.”
O atendimento durante crise sanitária deu origem ao livro A pandemia que ninguém vê, com relatos de mais de cem pessoas, divididas em cinco grupos: entregadores, moradores de rua, profissionais de saúde, catadores e funcionários de cemitérios. A publicação é uma homenagem a todos que tiveram de lutar contra o vírus do covid-19 para sobreviver.
O projeto promove ainda ações pontuais, como a Páscoa Invisível. Em parceria com a Lacta, mais de cem voluntários entregaram 2,3 mil ovos de chocolate, 1,8 mil hambúrgueres e 1,2 mil kits de higiene para mais de 2 mil indivíduos em situação de rua.
Para André Soler, iniciativas como o SP Invisível tem a capacidade de quebrar preconceitos e fazer com que a sociedade entenda melhor a história desta gente. “Conseguimos comunicar e chamar mais pessoas para enxergarem essa causa e ver como ela é tão importante”, defende.
O projeto, hoje, sobrevive por meio de doações de empresas e pessoas físicas. Para saber mais, acesse: https://www.spinvisivel.org/.