A Reforma Administrativa é tema de capa da edição #464 da PB, em reportagem especial que aborda as incongruências das contas públicas, aponta necessárias mudanças e expõe as resistências que podem enfraquecer a PEC em tramitação no Congresso. Para acompanhar a evolução do debate, ao longo do mês de junho publicamos semanalmente novos conteúdos sobre o assunto.
A fragilidade da máquina estatal exige um plano de racionalização de gastos para evitar o desperdício dos escassos recursos disponíveis. O setor público brasileiro foi reformado pela última vez em 1998, no âmbito federal, mas precisa de uma revisão mais ampla para garantir que os atuais obstáculos à melhora na qualidade de prestação de serviços sejam removidos. Hoje, dispende-se o equivalente a 13% do Produto Interno Bruto (PIB) com salários e benefícios de servidores na ativa, segundo dados do Banco Mundial. A média nos países que integram a Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico (OCDE) é de 9,9%.
Estes números foram destacados na nota técnica “O peso do funcionalismo público no Brasil em comparação com outros países”, elaborada pela Confederação Nacional da Indústria (CNI). Aos gastos fixos do governo, somam-se os altos salários e os privilégios pagos ao Poder Judiciário, que correspondem a 1,3% do PIB, segundo o documento. Assim, o Brasil supera, nesse quesito, países como Espanha (0,12%), Argentina (0,13%) e Reino Unido (0,14%).
Nos últimos 20 anos, o contingente de funcionários públicos dobrou no Brasil – boa parte desse crescimento concentrado no nível municipal. Logo, essa estrutura inchada virou uma bola de neve. Mantidas as regras atuais do serviço público, a conta pode chegar ao equivalente a 14,9% do PIB em 2030, pelos cálculos da consultoria Oliver Wyman. Atualmente, a despesa total com a folha de pagamentos dos servidores federais, estaduais e municipais bate R$ 930 bilhões por ano.
Para tentar equacionar os dividendos, o governo encaminhou ao Congresso a Proposta de Emenda Constitucional (PEC) 32/2020, que pretende promover uma Reforma Administrava acabando com regalias como estabilidade e adicionais por tempo de serviço. O deputado Darci de Matos (PSD-SC), é o relator do texto na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara.
Figura na proposta que todos os servidores sejam submetidos a avaliações de desempenho. Caso o resultado se apresente negativo, o funcionário fica sujeito à demissão. Ficará vedada a concessão de férias por mais de 30 dias, adicional e licença-prêmio por tempo de serviço. O recebimento de salário integral na aposentadoria será usufruído apenas por funcionários de carreiras típicas de Estado, como diplomatas. E futuros servidores que não exerçam esse tipo de cargo não terão direito à aposentadoria integral.
Assim, a PEC 32 seria a primeira etapa de um conjunto de medidas com vista a contribuir para o equilíbrio fiscal. Contudo, a proposta vem recebendo críticas por deixar de fora os atuais servidores e determinadas categorias – juízes, procuradores, promotores, deputados, senadores e militares deverão ser poupados nas mudanças de regras. Além disso, condicionada a futuras regulamentações para alterar tópicos considerados sensíveis, a medida não deve gerar economia aos cofres públicos no curto prazo.
Nos planos do governo constam ainda a redução das remunerações de entrada no serviço público e a ampliação do número de faixas de salário para evolução ao longo da carreira, pontos a serem tratados em projetos que serão apresentados em um segundo momento.
O texto prevê processo de seleção mais rigoroso para entrada em um cargo público. Se hoje o candidato aprovado passa por três anos de estágio probatório, que usualmente não cria nenhum impedimento para a nomeação efetiva, a partir da reforma, passaria por dois anos com um vínculo de experiência e mais um ano de estágio. Somente após estas etapas é que o governo selecionaria os aprovados para as vagas disponíveis, e a classificação, aferida após o período de experiência.
– Cria diferentes tipos de vínculo
– Restringe estabilidade aos cargos típicos de Estado
– As carreiras com direito ainda serão definidas. Necessitam de concurso e não podem ter redução de remuneração nem de jornada
– Abre possibilidade para cargos por tempo indeterminado, sem estabilidade e dependente de concurso
– Servidor passa por avaliação antes de assumir cargo público efetivo
– Demissões por questões partidárias são impedidas
– Servidores públicos em atividade no momento da aprovação das medidas não serão contemplados
A CCJ da Câmara dos Deputados aprovou a PEC 32/20, do Poder Executivo, com 39 votos favoráveis e 26 contrários. O texto será analisado, agora, por uma comissão especial. Depois, também terá de passar pelo Plenário da Câmara e pelo Senado Federal.
No início desta semana, o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), marcou reuniões com líderes partidários para discutir a tramitação da Reforma Administrativa e sobre mudanças no sistema político. A reforma administrativa não deve afetar servidores já contratados; mesmo assim, o tema causa conflitos na Câmara.