Fazer mais gastando menos

14 de outubro de 2022

A capacidade de um país elevar a sua qualidade de vida, ao longo de um período, depende quase inteiramente da sua capacidade de aumentar a produção por trabalhador. A frase, dita em 1994 por Paul Krugman, vencedor do Nobel de Economia em 2008, nunca esteve tão atual. A discussão tem ganhado relevância, com especialistas considerando que o crescimento econômico e o aumento da renda per capita do Brasil dependem da elevação da produtividade.  

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O fato é que a baixa eficiência na produção tem sido uma barreira para a expansão da economia nacional há décadas e vem se agravando nos últimos anos, conforme dados do Observatório da Produtividade Regis Bonelli, do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas (FGV Ibre).

Para se ter uma ideia, entre 1981 e 2021, enquanto a renda per capita cresceu 0,8% ao ano (a.a.), a produtividade, por hora trabalhada, avançou 0,6%. A expansão só não foi menor porque, durante a pandemia, a produtividade por horas efetivamente trabalhadas apresentou alta de 12%. O home office contribuiu para a elevação. Isso, porque, cumprindo o expediente em casa, o funcionário não perde tempo com deslocamento e costuma trabalhar mais horas. Além disso, a pandemia atingiu, em especial, a economia informal, considerada menos produtiva. O mercado formal, que conta com trabalhadores mais qualificados e, portanto, mais produtivos, acabou tendo maior participação no Produto Interno Bruto (PIB). Desta forma, mesmo com a retração econômica, a geração de renda por trabalhador e por hora trabalhada aumentou.

A alta, no entanto, foi temporária: desde o ano passado, registra-se queda no indicador, com a tendência de piorar. “O Brasil sofre de uma anemia de produtividade nos últimos 40 anos. A economia até cresceu em um bom ritmo, mas amparada por outros fatores, como preços das commodities e incorporação de pessoas no mercado laboral”, diz Otaviano Canuto, ex-vice-presidente do Banco Mundial e membro sênior do Policy Center for the New South.

De um modo geral, todos os setores da economia brasileira têm baixa produtividade. Dados do FGV Ibre mostram que só o agronegócio apresentou crescimento robusto, entre 1995 e 2021. Em 2021, um funcionário da agropecuária produzia R$ 18,60 por hora laboral. Em 1995, eram R$ 4,30. Já a produtividade da indústria caiu de R$ 38,80 para R$ 36,60, no mesmo período. Por outro lado, ficou estagnada no setor de serviços – o maior empregador do País e responsável por cerca de 70% das horas trabalhadas –, saindo de R$ 33,50, em 1995, para R$ 37, no ano passado.

Sem condições de competir

A baixa produtividade no Brasil o coloca em desvantagem competitiva com o restante do mundo. De acordo com dados da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), na década de 1980, o trabalhador brasileiro tinha 46,1% do rendimento de um norte-americano. Em 2021, último dado disponível, este patamar foi de 25,5%. Na comparação com profissional da Europa, a produtividade do trabalhador brasileiro representa um terço.

A baixa eficácia está diretamente ligada à competitividade das empresas brasileiras e, consequentemente, à perda de participação da indústria no Produto Interno Bruto (PIB) no Brasil e no exterior.

Até 2014, o País estava entre os dez mais industrializados do mundo, mas começou a perder participação em comparação a outras economias. Com isso, em 2020, já ocupava a 14ª posição, conforme conta Samantha Cunha, gerente de Política Industrial da Confederação Nacional da Indústria (CNI).

A desindustrialização acelerada tem a ver com a baixa produtividade e os elevados custos para operar por aqui, comprometendo a possibilidade de o País integrar as cadeias globais de suprimentos, especialmente num momento em que Estados Unidos e Europa procuram novos fornecedores para tentar driblar a falta de insumos. Por exemplo, uma empresa brasileira de médio porte despende cerca de 1,50 mil horas por ano em procedimentos de pagamento de impostos, contra as 317 horas nos países da América Latina ou 159 horas das nações da OCDE.

Motivos da baixa eficiência

Um conjunto de fatores explica o motivo da baixa produtividade no Brasil. O principal deles é a educação, marcada pela baixa qualificação do trabalhador. Além da escolaridade, a qualidade ruim dos postos de trabalho e a informalidade também contribuem para a estagnação do rendimento ao longo das décadas. Apesar de o País ter conquistado a universalização da educação primária e a expansão da secundária, a qualidade do ensino ainda é inferior à de outros países, o que afeta, em cheio, o benefício da produção.

“A evolução do trabalho, no Brasil, é muito baixa. Apesar da expansão da escolaridade desde a década de 1990, a produtividade não cresceu, diferentemente de outros países, como a China, onde a elevação da escolaridade contribuiu para um aumento significativo da produtividade”, comenta Fernando de Holanda Barbosa Filho, pesquisador sênior da área de Economia Aplicada do FGV Ibre.

Além disso, precisamos vencer as barreiras no ambiente de negócios, sem o Custo Brasil pesando na produtividade. É comum o setor empresarial sofrer com burocracia, lentidão da Justiça, mudanças regulatórias frequentes, questões tributárias, estrutura fiscal complexa e insegurança jurídica. “Melhoramos em alguns pontos do ambiente de negócios, na burocracia do comércio exterior, por exemplo, entre outros fatores, mas, muitas vezes, estamos tão atrás que essas melhorias não são suficientes”, considera Samantha, da CNI.

Ela ainda cita um estudo realizado pela entidade que mostra que o rendimento do trabalho na indústria de transformação brasileira caiu 1,5% no primeiro trimestre deste ano, na comparação com o último trimestre de 2021. O dado é medido pelo volume produzido dividido pelas horas trabalhadas na produção. É o sexto trimestre consecutivo de queda do indicador, que atingiu o nível mais baixo da série desde o terceiro trimestre de 2012. A perda acumulada de produtividade chega a 10%, na comparação com o terceiro trimestre de 2020, última alta registrada pelo índice, afastando-se ainda mais do nível anterior à crise da covid-19.

Na década de 1980, o trabalhador brasileiro tinha 46,1% do rendimento de um norte-americano. Em 2021, este índice foi de 25,5%. Na comparação com profissional da Europa, a produtividade do brasileiro representa um terço.

Não bastassem todos estes empecilhos, o setor produtivo do País ainda tem de lidar com a precariedade da infraestrutura. Otaviano Canuto, ex-vice-presidente do Banco Mundial, destaca ainda o fechamento comercial da economia brasileira, não só por barreiras tarifárias, mas também porque é complicado e custoso para as empresas nacionais terem relações com companhias do exterior. São entraves estruturais que se agravaram com as renúncias tributárias e o descompasso fiscal, que inibem investimentos. Especialistas consideram que o crescimento sustentado da produtividade depende da superação das ineficiências estruturais do Brasil, como o baixo investimento em pesquisa e desenvolvimento. Izis Ferreira, economista da Confederação Nacional do Comércio (CNC), salienta o custo de empregar no mercado formal, além da legislação trabalhista, que também explicaria muito da nossa baixa produtividade.

Há quem diga que a baixa produtividade brasileira está ligada à nossa cultura. O cafezinho durante o expediente e as emendas de feriados são alguns pontos elencados como danosos para a eficiência da produção. Quem entende do assunto, no entanto, discorda desta avaliação, comparando a realidade laboral nacional com a de europeus. “Não sei se a questão cultural é um fator matematicamente comprovado e se pesa ou não. Acho que existe uma visão anedótica de que aqui é assim, mas tem países na Europa que trabalham duas ou três horas a menos por dia e são mais produtivos”, considera Pastore.

A ÍNTEGRA DESTE CONTEÚDO FAZ PARTE DA EDIÇÃO #472 IMPRESSA DA REVISTA PB. PARA CONTINUAR LENDO, ACESSE A VERSÃO DIGITAL, DISPONÍVEL NAS PLATAFORMAS BANCAH E REVISTARIAS.

Gilmara Santos Paula Seco
Gilmara Santos Paula Seco