Novas regras fiscais buscam estabelecer o equilíbrio entre arrecadação e despesas do governo e promover o controle do endividamento. Entretanto, corre-se o risco de a medida resultar em aumento da carga tributária, pois condiciona maiores gastos do governo ao cumprimento de metas de resultado primário.
Aprovado em maio pela Câmara dos Deputados e em tramitação no Senado Federal, o novo arcabouço fiscal, como ficou conhecido o Projeto de Lei Complementar (PLP) 93/2023, pretende estabelecer regras que regulam as finanças públicas do Brasil para equilibrar receitas e gastos.
A medida vem causando preocupação em diversos setores da cadeia produtiva, pois o cumprimento do seu objetivo depende fundamentalmente do aumento da arrecadação, o que pode elevar os impostos ou até mesmo culminar na criação de mais tributos.
Segundo estimativas da Federação do Comércio de Bens, Serviços e Turismo do Estado de São Paulo (FecomercioSP), ao manter o cenário contínuo de crescimento de 1% do Produto Interno Bruto (PIB) nacional nos próximos três anos, será necessário um acréscimo de meio trilhão de reais na receita, além do previsto, para garantir a sustentabilidade da dívida pública.
Isso significa, que se aprovado, o novo marco fiscal exigirá um esforço ainda maior dos contribuintes para suprir os gastos públicos — algo impensável, já que a carga tributária nacional alcançou 37% do PIB em 2022.
Para elucidar os efeitos imediatos da possível aprovação do arcabouço no dia a dia do empresário, a assessoria técnica da FecomercioSP elencou quatro impactos que devem dificultar ainda mais o desenvolvimento empresarial no Brasil.
Na prática, os contribuintes devem se preparar para uma elevação dos impostos. Os efeitos negativos para a economia são diversos, partindo da diminuição da capacidade de consumo das pessoas — uma vez que, com mais impostos, sobrará menos dinheiro para compras e contratações de serviços, inclusive haverá limitação dos investimentos e decréscimo da margem de lucro do empresário, que terá de “cortar na própria carne” para manter a competitividade de mercado. Sem acesso aos benefícios fiscais e sem interlocução direta com o Poder Público, as pequenas e médias empresas deverão sofrer mais.
Com a insuficiência do arcabouço para conter o aumento arrecadatório na cobertura de gastos do governo, as expectativas quanto à inflação no futuro devem piorar. A indicação que o governo permanecerá gastando mais estimulará o aumento da inflação, penalizando o empresário e o consumidor, principalmente os mais pobres, que têm cada vez menos poder de compra.
A falta de resultado nas contas fiscais prejudica o trabalho do Banco Central (Bacen) de baixar os juros, fazendo com que a taxa Selic se mantenha em alta por mais tempo. Isso afeta diretamente o dia a dia do empresário, pois impacta a tomada e o pagamento de empréstimos, além de diminuir a demanda no comércio e nos serviços, dado que os juros altos atrapalham o consumo.
O fato de o arcabouço não resolver os problemas de longo prazo da política fiscal, já que não conseguirá entregar 1% de superávit primário em 2026 sem aumento consistente na carga tributária, acarretará elevação de juros de longo prazo. Assim, ao buscar um empréstimo mais duradouro, o empresário terá uma surpresa negativa no custo do crédito.
A impossibilidade de contratar empréstimos pode afetar o fluxo de caixa das empresas, contratação de mão de obra, o investimento em melhorias estruturais e a aquisição de inovações, além de limitar a capacidade de expansão dos negócios.
Ainda que o arcabouço fiscal seja melhor para a economia do que contar com nenhuma regra, o economista André Sacconato, consultor da FecomercioSP, salienta que os resultados práticos da medida, se for aprovada como prevê o governo, prejudicarão ainda mais o dia a dia das empresas e não estabilizará a saúde fiscal do País. “A vantagem das travas fiscais se dissipa, quando pensamos que o arcabouço não será suficiente para garantir uma sustentabilidade da dívida sem aumento da arrecadação, algo que o teto de gastos, antiga regra, entregava”, pondera.
• Impõe limite de crescimento da despesa primária (gastos necessários para promover serviços públicos) a 70% da variação da receita dos 12 meses anteriores.
• Cria mecanismo de ajuste para impedir o aumento dos gastos em momentos de crescimento econômico e a queda dos gastos em caso de baixo crescimento.
• Aplica mecanismos de punição. Caso o resultado primário fique abaixo do limite mínimo, o crescimento das despesas para o ano seguinte cai de 70% para 50% do crescimento da receita.
• Pretende zerar o déficit primário em 2024, com superávit de 0,5% do PIB em 2025 e 1% em 2026.
• Promete que a dívida pública bruta subirá levemente até 2026 e depois será estabilizada.
• Cria exceções apenas para gastos instituídos pela Constituição, como o Fundeb e o piso nacional da enfermagem. Essas despesas não podem ser regulamentadas por lei complementar.
O texto do PLP 93, que está em tramitação no Senado, já recebeu 31 sugestões de alteração até o fechamento desta reportagem, na metade de junho. Caso o seu conteúdo seja alterado pelos senadores, o PLP volta para votação na Câmara dos Deputados.