Atualmente, os países que contam com os melhores sistemas educacionais têm em comum a valorização do ensino técnico e profissionalizante. O investimento nessa modalidade formativa vem ao encontro da grande demanda reprimida por especialização no setor produtivo: estudos recentes apontam que ao menos 60% das empresas encontram dificuldade para preencher vagas de perfil técnico.
No Brasil, mesmo com o alto índice de desemprego – dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) mostram que no terceiro trimestre de 2021 o número de pessoas em busca de um posto de trabalho chegou a 13,5 milhões – as estatísticas de formação técnica seguem na contramão das nações desenvolvidas. O mais recente Censo da Educação Básica do Inep/MEC, de março de 2020, sublinha a falta de adesão dos estudantes brasileiros a essa modalidade. Com o total de 9.486.847 inscritos no ensino médio, a procura pela vertente profissionalizante continua baixa, na marca de 20,4%, mesmo possibilitando acesso rápido e mais qualificado ao mundo do trabalho.
Esse indicador assinala patamares muito diferentes em lugares como Alemanha (45%), Finlândia (55%) e Reino Unido (68%). Além disso, segundo dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua, divulgada pelo IBGE, no último trimestre de 2020, cerca de 70% dos desempregados eram jovens de 14 a 24 anos. O acesso a cursos profissionalizantes, no entanto, que poderia atenuar essa marca, continua restrito. Ainda de acordo com o IBGE, somente 5,2% dos adultos com até 30 anos têm ensino profissionalizante.
Ao mesmo tempo, faltam profissionais especializados para preencher vagas abertas em diversos setores. Um estudo de abrangência global, realizado pela empresa de recursos humanos Korn Ferry (Futuro do Trabalho: A Crise de Talentos), apontou, em 2020, um déficit de 1,8 milhão de pessoas para funções especializadas no mercado brasileiro. O levantamento estima que o número deve crescer a uma taxa de 12,4% ao ano, até alcançar 5,7 milhões de postos com empregados sem competência ideal ou vagos até 2030. A carência de especialização em áreas estratégicas de um negócio pode, inclusive, impedir que as empresas faturem, até o fim do ano, US$ 43,6 bilhões, afetando diretamente o crescimento econômico nacional.
Em comparação com o Brasil, países como o Reino Unido e a Alemanha, onde a formação profissionalizante é altamente valorizada, apresentam índices empregatícios mais expressivos. São mostras de que o ensino técnico pode abrir caminhos para um desenvolvimento econômico inclusivo, sustentável e inovador a longo prazo.
Conheça, a seguir, como funciona o sistema nacional de EPT (Educação Profissional e Tecnológica) e alguns cases que são referência na modalidade pelo mundo*:
A EPT é oferecida no ensino médio e no superior, podendo constituir um itinerário formativo contínuo de aprendizagem ao longo da vida. As diretrizes determinam os princípios e critérios de certificação que devem ser considerados por todas as redes de ensino na oferta dessa modalidade. Recém-reorganizadas e homologadas, as novas diretrizes trouxeram uma inovação: agruparam em um único documento as orientações para qualificações profissionais, cursos de níveis médio, superior e pós-graduação. Com a Lei 13.415/17, a EPT de nível médio passou a compor a Educação Básica no Brasil. A reforma curricular do ensino médio prevê cinco itinerários formativos, sendo um deles o de formação técnica e profissional.
Há mais de 40 anos, a Alemanha é referência neste âmbito, tendo servido de base para os sistemas de países como Áustria, Finlândia, Suíça e Coreia do Sul. Lá funciona o chamado Sistema Dual, que combina aprendizado prático e teórico: o aluno passa dois dias em sala de aula e, no restante da semana, atua na empresa tutora, onde vai aplicar os conhecimentos na prática. Produto de parceria entre o Estado e empresas privadas, a iniciativa elevou os níveis de empregabilidade e de qualidade salarial.
No Reino Unido, os cursos de formação profissionalizante são conhecidos como Foundation Degree ou Further Education. Eles são ainda divididos entre vocational courses, que têm curta duração e concedem qualificação técnica, e academic courses, preparatórios com vantajosa relação custo-benefício, destinados a quem deseja buscar uma jornada mais acadêmica após completar o ensino médio.
Mundialmente conhecido como um sistema educacional progressivo, é dividido entre os modelos Express, Normal Acadêmico ou Normal Técnico. O governo reformulou o ensino técnico e criou o Institute for Technical Education (ITE), um centro de referência na modalidade. Assim, os estudantes que terminam o ensino secundário e não querem ou não atingem as notas necessárias para entrar nas Junior Colleges, podem ingressar nos cursos de nível médio do instituto. Depois de finalizados, conseguem ingressar nas politécnicas (curso superior técnico) ou na universidade (caso tenham desempenho satisfatório).
O sistema é dividido em educação primária, secundária e terciária, com duração de 13 anos. O ensino médio (sênior) é realizado em escolas regulares. Os estudantes podem se inscrever em qualificações de educação profissional em programas específicos para quem está matriculado em determinados anos da educação escolar. Os cursos de TVET (TAFE – Delivered Vocational Education and Training) estão abertos para alunos do 10º, 11º ou 12º anos, e vão desde comércio automotivo, serviços comerciais e construção até esporte e recreação, artes visuais e armazenamento. A instituição deve documentar as suas estratégias, atividades e práticas adotadas em relação ao envolvimento com a indústria, para demonstrar o alinhamento destas às necessidades do setor industrial.
Há duas opções de ensino médio: geral e/ou tecnológico (lycée général et technologique), cuja proposta final consiste em conduzir o estudante para a universidade; e profissional (lycée professionnel), cujo objetivo é preparar o aluno para o mundo do trabalho, mas sem inviabiliza o ingresso no ensino superior. O lycée professionnel, focado em integrar os estudantes no mundo do trabalho, comporta entre 40% e 60% de aulas práticas (em ateliê ou laboratório, por exemplo). O estudante que cursa o lycée professionnel pode percorrer dois caminhos distintos: Certificat d’aptitude professionnelle (CAP), focado em preparar o estudante para exercer uma profissão específica (existem em torno de 200 especialidades que dão direito a um certificado do tipo CAP; e Baccalauréat professionnel, que oferece diploma de aptidão para exercer uma das 75 especialidades profissionais disponíveis (NÍVEL 4). No último ano do ensino médio, o estudante pode obter o título de Baccalauréat, que certifica o fim dos estudos secundários gerais, tecnológicos e/ou profissionais. Os próximos níveis consistem na etapa universitária.
*Fonte: Itaú Educação e Trabalho.