entrevista

Falta diversidade nas lideranças

09 de março de 2022
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Na visão de Rachel Maia, CEO da RM Consulting, consultoria de inclusão e liderança, as empresas que não apostam em diversidade de raça e gênero colocam o próprio futuro em risco. “Não dá mais para você ter uma mesa de negociação estratégica e não ter nenhuma mulher. É necessário criar metas de pluralização”, afirma a executiva que também é consultora administrativa de empresas como Vale, Banco do Brasil e CVC, além de ser presidente do Conselho Consultivo da Unicef.

Paulistana, criada na periferia da Zona Sul da capital paulista e formada em Contabilidade, com especializações na Universidade de Harvard, nos Estados Unidos, e na Universidade de São Paulo (USP), Rachel já foi CEO da Lacoste Brasil e da Tiffany. É vencedora do prêmio Líder do Ano, da revista Exame, de 2020. Para ela, lutar pela diversidade não é papel apenas das empresas, mas também do mercado consumidor. “Nós temos que fazer escolhas. E a escolha tem que ser daquelas marcas que já estão se posicionando em favor da equidade e da inclusão.”

ESTE CONTEÚDO ESTÁ PUBLICADO NA ÍNTEGRA NA EDIÇÃO #468 IMPRESSA DA REVISTA PB. A VERSÃO DIGITAL ENCONTRA-SE DISPONÍVEL NAS PLATAFORMAS BANCAH E REVISTARIAS.

Você tem uma frase que diz: “Meu sonho é viver em um mundo onde eu seja apenas a CEO Rachel e ponto-final. Não a CEO mulher, a CEO negra e da periferia, mas apenas a Rachel”. Após 30 anos e tendo passado pelos mercados de luxo e pela alta gestão, acredita que o mundo está mais próximo desse seu pensamento?

A pergunta é desafiadora em um mercado que ainda se encontra em transformação. As empresas ainda estão se abrindo para o novo, para o diverso, para o equitativo, que gera pertencimento e inclusão. Então, diferente do meu início, em que não existiam essas ações afirmativas, não existiam cotas, sim, existem muitas empresas que querem aprender o que é diversidade, equidade e inclusão. Mas nós não podemos deixar de conferir os índices. E os índices falam por si. Hoje em dia, ainda temos pouca diversidade nas lideranças. Então, nós ainda temos muito a construir. A jornada é longa nesse sentido.

“Somos 3% de CEO mulheres, em um mercado que nós, demograficamente, representamos 51% das pessoas.”

As mulheres CEOs de grandes empresas no Brasil representam apenas 3% do total de lideranças. O dado é de 2021, mas essa discussão sobre representatividade já tem alguns anos. Quais dificuldades as empresas encontram para, de fato, incorporar a agenda da diversidade?

Sustentabilidade é algo que vai além da questão ambiental. Há tempos, houve uma demanda de se falar também do social e da governança. Como se gera impacto, como se cria valor? Isso é muito importante. Criar valor hoje é criar proposta de trabalho. Tudo isso envolve pessoas. Então, se as pessoas não estão antenadas, se elas não entendem todo o ecossistema, isso depõe contra a marca, porque um CNPJ é constituído, inicialmente, de CPFs. Esse engajamento tem que ser da primeira pessoa do singular: o eu. Por isso, o ESG tem que ser introduzido nas empresas através de letramento, que é diferente de treinamento. O treinar é você se aprimorar em algo novo que a empresa está fazendo, com o uso de tecnologia e inovação. O letramento é você pegar parte da sua experiência e reconstruir dentro deste processo inovador que estamos vivendo, engloba mais do que o business in the time. É business, time e people.  Caso as empresas não entendam essa mensagem, não dá nem para andar lateralmente, pois ela sai do jogo. Existe uma estimativa para chegar a dois dígitos. Somos 3% de CEO mulheres, em um mercado que nós, demograficamente, representamos 51% das pessoas. Temos de nos posicionar. Não precisamos tomar o lugar de ninguém, nós viemos para mostrar que somos capazes também. Nós precisamos de aliados para este processo, mas as protagonistas da conquista deste lugar somos nós, as próprias mulheres.

Como você olha a vida pós-pandemia Covid-19, sobretudo em relação à consciência das empresas?

Nós ainda estamos no mundo pandêmico. O ano de 2018 foi um momento desafiador para todos nós, porque estávamos desesperançosos. Aí veio a pandemia, o comércio fechou, e havia a expectativa de queda brutal das receitas. Começou uma corrida maluca e um desespero no varejo, mas tudo se equalizou, na medida do possível. Contudo, houve um ponto que não podemos ignorar: o brasileiro é um povo muito carismático e humano. Nós tivemos milhões de pessoas famintas. Sabe o que aconteceu? Começamos a movimentar ações humanitárias para reduzir, pelo menos, a fome imediata. Isso nós verificamos no dia seguinte da pandemia. Isso tudo deve ser levado em consideração. Foi dentro de casa que começamos também a resistir ao processo. A variante S [Social], do ESG, ficou mais enaltecida neste processo pandêmico, e as pessoas começaram a questionar muito mais sobre diversidade, equidade e inclusão. Logo, eu acredito que, nestes dois últimos anos, enalteceu-se o S, em especial com foco nas questões que eu citei: diversidade, equidade e inclusão.

O que as empresas podem fazer, de maneira concreta, para auxiliar mulheres a se inserirem de maneira adequada e segura no mercado de trabalho?

Resposta clara, direta e objetiva: criar cotas. Se, hoje, eu não tenho mulheres líderes nas empresas, estas devem criar cotas de liderança. É fantástica a oportunidade para as mulheres, mas nós temos que criar oportunidades nas lideranças para elas. Não dá mais para se ter uma mesa de negociação, uma mesa estratégica sem uma mulher. É necessário criar metas de pluralização. Eu vejo as empresas criando metas, provocando os seus líderes, instigando os seus líderes, letrando os seus líderes, mostrando que a pluralização só traz crescimento financeiro e equaliza o processo social. As metas ajudam a mudar o cenário, entretanto precisam ser um pouco mais agressivas. O mundo do trabalho feminino sofreu um impacto considerável. As mulheres ficaram desempregadas primeiro neste momento pandêmico. E as mulheres negras, proporcionalmente falando, sofreram muito mais neste processo, em que todos sofreram. A mulher negra continua sendo a mais afetada.

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Edição: Redação PB I Entrevista: Mônica Sodré Cauê Moreno | Globo Livros
Edição: Redação PB I Entrevista: Mônica Sodré Cauê Moreno | Globo Livros
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