Aos 38 anos, a astrofísica capixaba Marcelle Soares-Santos integra seleto grupo mundial. Na Universidade Michigan (Estados Unidos), ela lidera 50 pesquisadores que investigam a matéria escura, o “acelerador” da expansão do Universo, um dos grandes mistérios da ciência. A equipe integra o Projeto Dark Energy Survey (DES), com mais de 500 pesquisadores de instituições internacionais.
Junto com outros pesquisadores tento trazer respostas para as perguntas que estão na alma de cada um, independentemente do nível de escolaridade, profissão, interesse e religião: qual a trajetória de evolução do nosso universo, de onde viemos e para aonde vamos. A gente tem uma explicação boa sobre de onde viemos, com a teoria do Big Bang, segundo a qual o universo começou em uma explosão muito forte há 13 bilhões de anos. Na época, tinha volume muito pequeno e se expandiu bem rápido. Aonde vamos ainda é um ponto de interrogação.
A velocidade da expansão que começou no Big Bang está aumentando. Aumento de velocidade precisa de energia, por isso é necessário saber de onde vem, o que é. Nós chamamos de energia escura, mas, na verdade, é invisível. Conseguimos estudá-la por meio das ondas gravitacionais, que são similares ao som. Até recentemente era um método que não conseguíamos usar, porque não havia tecnologia. Agora, temos essa capacidade e é como se saíssemos da era do filme mudo para o filme com som.
O prêmio tem bastante prestígio e fiquei muito honrada e surpresa porque o pesquisador precisa ser nomeado por outras pessoas importantes na comunidade científica, ser reconhecido por liderar projetos inovadores. Muitos premiados avançaram significativamente em suas carreiras e isto me inspira. Acredito que o mais importante não é o destino final de nossas pesquisas, mas a jornada como físico e astrônomo, na qual a gente adquire muito conhecimento.
Desde a infância, eu queria desvendar o que estava além do céu, descobrir como as coisas funcionam. Estudar e aprender eram e ainda são algo prazeroso para mim. No começo, só tinha noção que queria fazer algo relacionado à Ciência. Sou formada em Física, pela Universidade Federal do Espírito Santo. Incorporei a Astronomia no mestrado e no doutorado na Universidade de São Paulo; e tenho pós- -doutorado pelo Fermi National Accelerator Laboratory [Fermilab, um dos mais importantes laboratórios americanos para experimentos de Física].
Na graduação, no Departamento de Física, só havia duas professoras. Éramos 10% de mulheres estudantes. Os desafios, no meu caso, foram superados porque tive uma relação muito positiva com colegas e professores, em trabalhos em conjunto, que continuam. As pessoas percebem que você pode contribuir no coletivo e isso reflete no resultado.
A decisão de seguir a carreira no exterior surgiu nos Estados Unidos, onde estou desde 2010. Na área de Física, há colaborações internacionais em grupos de diferentes instituições. Em julho, me transferi para a Universidade de Michigan. Antes, estava na Universidade Brandeis, que investiu em Astrofísica e Cosmologia, com experimentos de grande porte. Não podia deixar passar essa oportunidade, que foi ideal para mim e me permitiu trazer essa linha de pesquisa para cá. No Brasil também há espaços importantes e produtivos de Astrofísica, com os quais colaboro. Nos últimos anos houve perdas, mas acredito que será transitório. Um dos problemas é que o progresso na área científica é lento. Se o suporte das agências financiadoras diminui, o impacto nos projetos se prolonga por anos. Não é como o ato de ligar e desligar, com a produtividade seguindo instantaneamente.