entrevista

O alcance da Constituição

07 de fevereiro de 2022
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A Constituição de 1988 consolidou a redemocratização no País ao garantir direitos como o voto universal. Por outro lado, o Brasil, ao mesmo tempo que aumentou a participação popular, vem, desde então, enfrentando uma concentração de renda cada vez maior. Este é um dos nossos grandes problemas, segundo Joaquim Falcão, jurista e professor de Direito Constitucional da Escola de Direito do Rio de Janeiro da Fundação Getulio Vargas (FGV – Direito Rio), instituição da qual é fundador. Ele argumenta que a Constituição nunca foi implementada plenamente, de modo que os efeitos da Carta Magna não chegam a diversas localidades, como a região amazônica, as periferias e as favelas. Além disso, diz que os Três Poderes devem conviver com certo nível de tensão para a manutenção da democracia.

ESTE CONTEÚDO ESTÁ PUBLICADO NA ÍNTEGRA NA EDIÇÃO #468 IMPRESSA DA REVISTA PB. A VERSÃO DIGITAL ENCONTRA-SE DISPONÍVEL NA BANCAH.

“O que é importante para a democracia? É que nenhum Poder tenha poder sobre os outros. É manter uma certa tensão, eu controlo você e você me controla. Se parar em um Poder, sairemos da democracia.”

Qual a importância do intelectual público e por que você decidiu ser um deles?

Tenho três filhos. Uma vez, minha filha perguntou: papai, você é professor, executivo, jornalista ou advogado? Eu tomei um choque com a pergunta e respondi com um critério que é o seguinte: eu preencho a ficha do hotel com a profissão de professor. A atividade jornalística começou na Folha de S.Paulo, onde devo ter escrito mais de 800 artigos. Eu fiz isso porque a Folha me chamou para participar da redemocratização. Essa função de intelectual público tem dois pontos importantes. O primeiro, é a independência. O segundo ponto, é que entendo isso como uma missão. Eu tenho uma visão de Brasil e compromisso com um determinado conceito de democracia. Esses dois fatores, a independência e o compromisso com a visão de Brasil, me conduzem até hoje como um intelectual público. É o que torna difícil aos meus interlocutores me situarem como sendo de direita, esquerda etc. Eu prezo pela independência e sou a favor de uma missão, que é a democratização brasileira.

Qual a importância da Constituição de 1988 para a democracia brasileira?

A Constituição apresentou uma novidade: o direito de voto ao analfabeto. Ou seja, foi concedida voz ao analfabeto. E essa voz se desdobrou e ampliou o Brasil. O voto ao analfabeto é o responsável pela maior ampliação do Brasil, algo que começou a interferir nas políticas públicas, na jurisprudência e na distribuição de recursos públicos. E isso cresce cada vez mais. Porém, se na parte política, há uma ampliação democrática do País, na parte econômica, há uma crescente concentração de recursos. Esse choque entre uma democratização político-jurídica, através da alfabetização e da participação popular nas decisões da República, se choca com a concentração cada vez maior de renda. E esse é o problema que estamos vivendo. As pessoas não estão nas ruas, ainda, por causa da pandemia e porque não se sentem representadas pelos canais institucionais. Mas as pessoas estão sofrendo. Elas estão com fome. E as pessoas querem uma democratização não somente da renda, mas de tudo.

O senhor trabalhou na Fundação Roberto Marinho, e lá criou o canal Futura e o Globo Ecologia. Mas gostaria de perguntar sobre o Telecurso 2000, a mais ampla iniciativa de ensino a distância no Brasil. É possível minimizar outro nível de desigualdade, o educacional?

Quando fui eleito para a Academia Brasileira de Letras, um repórter me perguntou: quais os seus livros principais? Eu disse: eu não tenho livro principal, eu tenho o Telecurso 2000, o Globo Ecologia e outros. A função educacional do Telecurso começa quando o programa vai ao ar, porque depois tem todo um processo de aprendizagem em casa. A casa é fundamental para que a educação seja captada. A pandemia nos mostrou isso. Ela nos revelou a desigualdade, inclusive das residências. O ministro Paulo Guedes falou que o Brasil tem 30 milhões de pessoas invisíveis reveladas pela pandemia.  Eu os chamo de invisíveis e desconstitucionalizados.

Qual a importância do patrimônio cultural para a vida de um País?

A Constituição determina o apoio progressivo do Estado à cultura. Logo, há claramente uma inconstitucionalidade com a própria política cultural que estamos vivendo. A Cinemateca, por exemplo. A Cinemateca ajudou a moldar a importância do cinema brasileiro. Mas a política não se interessa por cultura. A política está censurando a cultura. Não é apenas uma censura ética ou de preferência. É uma censura orçamentária, que é a pior de todas.

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Edição: Redação PB I Entrevista: Renato Galeno Américo Vermelho
Edição: Redação PB I Entrevista: Renato Galeno Américo Vermelho
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