No domingo (13) o Brasil perdeu Washington Olivetto, um dos nomes mais premiados da propaganda do Brasil. Ele foi o criador de campanhas icônicas da televisão brasileira, como a do garoto Bombril, do casal Unibanco, o cachorrinho da Cofap e o primeiro sutiã, da Valisère. Descendente de italianos, nasceu no bairro da Lapa, na cidade de São Paulo, e estudou comunicação e psicologia, mas não chegou a se formar. Sua carreira começou em 1969, aos 18 anos, como redator em uma agência de publicidade. No Corinthians, seu clube do coração, foi vice-presidente de marketing e um dos fundadores do movimento Democracia Corinthiana, nos anos 1980.
Desde 2017 morando com a família em Londres, Inglaterra, o publicitário não esconde a desolação com o atual cenário brasileiro e diz não ter planos de voltar a viver por aqui.
Moro em Londres desde 2017 e me considero um brasileiro fanático. No entanto, noto que vivemos momentos diferentes. Infelizmente, no Brasil, vive-se um mundo que não é o daqui. No início de maio, a Inglaterra registrou pela primeira vez um dia sem mortes pelo covid-19, em virtude de um lockdown responsável e um processo de vacinação eficiente. No Brasil, virou uma CPI. No dia 1º de maio, houve no Brasil manifestações pseudopolíticas com muita gente sem máscara, enquanto em Liverpool ocorria um show de rock com 5 mil jovens testados antes, durante e depois do espetáculo. Isso me assusta profundamente. São posturas diferentes, que demonstram aqui uma aposta no futuro, e no Brasil, uma aposta no passado.
Estive no Brasil no fim do ano passado, tenho ido a cada quatro meses. Como um país que era da doçura e da alegria se transformou no país do amargor? Tenho notado uma radicalização, que me incomoda: a maluquice que se reinventou no Brasil, entre esquerda e direita, que só tem separado as pessoas. Mas isso faz parte dos governantes atuais. Creio quem veio em função do governo Trump, com uma postura de radicalização entre ambos os lados, e a sociedade brasileira foi ingenuamente conduzida pelas fake news ao atual cenário. Estamos vivendo um momento no qual, depois, vamos precisar de muitos anos para voltar a ser um país que poderia ter sido.
Sim, a maioria dos motoboys de delivery é brasileira. Na pandemia, minha família tem usado muito o delivery, e sou reconhecido por eles não pelo meu trabalho como publicitário, mas como corintiano. Segundo o Consulado-Geral do Brasil, existem cerca de 250 mil brasileiros na Grande Londres, dos quais 60% são ilegais. O NHS [equivalente ao SUS] atende a todos os residentes, independentemente de serem legais ou ilegais, mas os brasileiros estão fugindo da vacinação por medo de serem deportados. Estou fazendo um trabalho de esclarecimento, em conjunto com o Consulado-Geral, dizendo que não há este risco. Londres é uma cidade acolhedora, onde se convive com pessoas do mundo inteiro, mas o brasileiro comum que mora aqui não está sendo bem-visto como sempre foi.
“Estamos vivendo um momento em que, depois, vamos precisar de muitos anos para voltar a ser um país que poderia ter sido.”
Há poucos meses, o jornal The Guardian, uma publicação marcada pelo bom senso, publicou que não estava gostando de publicar notícias do governo brasileiro. O jornal tinha sensação de que eram declarações para desviar o foco dos problemas reais, promover uma “cortina de fumaça”, e que gostava de reportagens do Brasil que tratassem a respeito de nomes como Oscar Niemeyer, Tom Jobim e Ivo Pitanguy.
As questões envolvendo o desmatamento da Amazônia pegam muito mal. Lembro das declarações do ex-ministro das Relações Exteriores, Ernesto Araújo, do pronunciamento grosseiro do ministro Paulo Guedes contra a esposa do presidente francês Emmanuel Macron, das ofensas do Bolsonaro em relação ao trabalho da ativista Greta Thunberg. Já a declaração do presidente sobre a hipótese de que alguém vacinado poderia se transformar em jacaré foi avaliada até com desprezo.
É uma artista muito talentosa e conhecida por aqui. O grande mérito da música brasileira é a qualidade e ser feita sem preconceitos. Anitta é um exemplo disso, tem conotação de alegria, de um país bacana e legal. É exatamente o inverso do que nossos governantes estão fazendo.
Muitas novas mídias surgiram. As empresas que priorizaram a informação mais do que a venda se deram melhor. Contudo, seja qual for a mídia, se não houver uma grande ideia, não acontece nada. Reforçou-se a cultura que empresas devam ter propósitos, e é muito bom que tenham e que sejam verdadeiros no seu comportamento. Se o propósito for apenas ganhar prêmios em festivais, é uma bobagem. Mas uma empresa pode honestamente oferecer o seu produto de forma transparente, sem necessariamente ter propósitos. Se o produto for bom, não há nada de errado. A tendência é que as duas linhas se misturem com o tempo.
“Anitta tem conotação de alegria, de um país bacana e legal. É exatamente o inverso do que nossos governantes estão fazendo.”
O digital é uma realidade. Tudo vai depender da capacidade de reinvenção das empresas de comunicação, das agências e dos anunciantes. Por exemplo, uma das mídias que continua muito próspera é o velho e bom rádio, que muitas vezes se revela mais instantâneo que a internet. No Brasil, tem se cometido o erro de estabelecer uma luta de classes entre o online e o offline, na qual só tem perdedores, como é o caso da Editora Abril. Hoje, criticam muito a mídia brasileira. Meu Deus, se não fosse por ela, o País não teria formado a imagem que construiu no exterior, graças às revistas da Editora Abril e a Rede Globo. Tentam destruir este patrimônio, e isso é um pecado.
Não é um nome adequado para comunicação, mas poderia fazer propaganda de armas.
É um homem de marketing intuitivo, apesar de não ter cultura acadêmica. Neste momento, seria apropriado para uma marca ou um produto que esteja sendo relançado no mercado.
É uma pessoa culta e agressiva. Não sei exatamente o produto, mas algo com credibilidade e agressividade.
Serviria para produtos com características ecológicas, do gênero natureba.
Pela estética e pelo perfil de negócios, seria adequado para shopping center.
Tenho trabalhado muito durante a pandemia. Desenvolvi uma série de podcasts, o W/Cast, nas principais plataformas de streaming, que irá desembocar em um projeto no Instagram. É uma aventura no digital que me proporciona aprendizado e prazer. Escrevo quinzenalmente um artigo no jornal O Globo e faço comentários quinzenais na rádio CBN. Estou colaborando com o educador Cristovam Buarque em um grande projeto de educação e presto consultorias para empresas. Ainda não há nada previsto, mas talvez as colunas de O Globo resultem em um livro.
“Londres é uma cidade acolhedora, onde se convive com pessoas do mundo inteiro, mas o brasileiro comum que mora aqui não está sendo bem-visto como sempre foi.”
Minha intenção é continuar indo com frequência ao Brasil, mas prefiro continuar morando em Londres, ainda mais agora que meus filhos estão ingressando na universidade. Entretanto, mesmo sendo paulista e corintiano, nas minhas últimas visitas fiquei mais no Rio de Janeiro do que em São Paulo. Considero o Rio uma síntese do Brasil, para mim, continua sendo a capital do Brasil.
É uma tristeza, foi muito divulgada aqui. Lembra a música “W/Brasil”, criada pelo meu amigo Jorge Benjor, nos anos 1990, que tem os versos “Jacarezinho, avião”. É uma metáfora do que acontece hoje.
Sim, moro no bairro de Belgravia, no centro de Londres, há duas estações de metrô muito próximas. A rede de transporte é muito eficiente, o metrô se interliga com trem, barco e bicicletas. Não há necessidade de ter carro em Londres.
Do jeito que o Brasil está, vai demorar muito para chegarmos a algo perto disso, infelizmente.