Nos últimos 60 anos, o Brasil se viu anestesiado pelos ganhos, pelos custos e pelas distorções das políticas desenvolvimentistas. Mesmo assim, ainda não se livrou das próprias ideologias nacionalistas e políticas protecionistas e setoriais. A história da Revista Problemas Brasileiros, sob essa ótica, é como um ornitorrinco (parafraseando o sociólogo Francisco de Oliveira) de eventos que revelam a complexa e desafiadora trajetória econômica nacional.
No ano de lançamento da PB, lidávamos com a “ressaca” do Plano de Metas, que tinha a crença no desenvolvimento queimando etapas (“50 anos em 5”). Apesar de ter experimentado um crescimento econômico inegável no período anterior, a Nação enfrentava desafios consideráveis, como a inflação acelerada – pressionando o bolso dos brasileiros -, o déficit público crescente e as reservas internacionais em queda.
O período foi marcado por agitação social, e o contexto geopolítico tenso da Guerra Fria, agravado pela Revolução Cubana, acabou culminando em um golpe militar em abril de 1964, período que pode ser dividido em duas fases. A primeira, de 1964 a 1967, marcada por um caráter reformista, com o objetivo de restabelecer a estabilidade econômica. Já a segunda, de 1968 a 1973, ficou conhecida como o “milagre econômico”, com baixo desemprego, inflação moderada e um aumento nas reservas cambiais.
A fase reformista foi abalizada pela dupla de ministros Roberto Campos e Octávio Gouveia Bulhões, responsáveis por modernizações institucionais, como a criação do Banco Central do Brasil (BCB); a reforma tributária; as instituições do Sistema Financeiro de Habitação (SFH) e do Banco Nacional da Habitação (BNH); e as reformas trabalhistas, compondo o Fundo de Garantia por Tempo de Serviço (FGTS), entre outras medidas. Essas ações culminaram, ainda, no controle da inflação e do déficit público.
Durante o ciclo desse “milagre econômico”, o Brasil alcançou taxas “chinesas” de crescimento da economia, atingindo, inclusive, 14% ao ano (a.a.) – movido por maior intervenção do governo na economia (aumento do número de empresas estatais, subsídios, proteção tarifária etc.). Em outubro de 1973, em decorrência de uma série de fatores, inclusive a Guerra do Yom Kippur entre Israel e os vizinhos árabes, a Organização dos Países Exportadores de Petróleo (Opep) implementou um embargo ao petróleo naquele mesmo mês, restringindo as exportações do produto para países que eram vistos como apoiadores de Israel, como os Estados Unidos e outras nações ocidentais. Isso provocou uma escalada nos preços do insumo e desencadeou o chamado “choque do petróleo de 1973”, gerando consequências significativas para o Brasil e as demais economias do mundo.
A história econômica do Brasil entre 1974 e 1982 refletiu o declínio do auge da atividade produtiva. O governo estava dividido entre dois cenários: um choque transitório e a necessidade de conter o déficit na balança comercial e a pressão inflacionária por meio de medidas de austeridade quanto à economia, sob a visão de Mário Henrique Simonsen, então ministro da Fazenda. Já de acordo com João Paulo dos Reis Velloso, ministro do Planejamento, por seu turno, o choque do petróleo revelava a fragilidade e a dependência da economia brasileira em relação aos insumos importados. Dessa forma, a política de substituição de importações deveria ser aprofundada e, enfim, chegar ao ápice, com a produção doméstica de bens intermediários e bens de capitais. Era a última chance, de acordo com o espírito da época, de o Brasil ter uma estrutura produtiva de país desenvolvido e alcançar o “primeiro mundo” — o “último trem para Paris”, segundo o ministro do Planejamento.
A visão vitoriosa dentro do governo foi de Reis Velloso. Em 1975, lançava-se o II Plano Nacional de Desenvolvimento (PND), que buscava, novamente por meio do planejamento estatal, avançar com o processo de substituição de importações, perspectiva que trazia três problemáticas: intervenção estatal significativa, complexa e repleta de riscos; negligência em relação ao capital humano; e possíveis consequências da massiva alocação de recursos em investimentos industriais e infraestrutura sobre o consumo e as importações, inclusive de petróleo. Assim, a única maneira de manter esse nível de atividade econômica, era recorrendo ao endividamento externo, que se beneficiava da abundância de recursos no mercado internacional em virtude dos “petrodólares” oriundos dos países exportadores do óleo. Esses petrodólares eram depositados em bancos internacionais, principalmente nos Estados Unidos, cujos fundos eram frequentemente utilizados para financiar empréstimos a outros países ou investimentos em ativos estrangeiros.
A continuidade do aumento da inflação e a necessidade de empréstimos externos para oxigenar a economia culminaram na crise da dívida externa, no começo dos anos 1980, levando o País a buscar a renegociação de empréstimos e a enfrentar uma série de medidas de austeridade que afetariam a economia e a população pelos próximos anos.
No início dos anos 1980, o Brasil recorreu a desvalorizações cambiais e buscou saldos comerciais a todo custo, enquanto enfrentava a inflação acentuada. A pobreza e a miséria, especialmente urbana, aumentaram significativamente, fruto da combinação perversa de inflação e desemprego elevados. A conta a pagar do período de “crescer a qualquer custo” foi elevada. E na tentativa frustrada de conter a inflação, o País introduziu o Plano Cruzado, o Plano Cruzado II, o Plano Bresser, o Plano Verão, o Plano Collor I e o Plano Collor II, que, basicamente, recorriam ao congelamento de preços e salários e negligenciava a causa subjacente da emissão monetária desenfreada e do desequilíbrio nas contas públicas.
Após o fim da ditadura, em 1985, uma série de reformas políticas devolveu o Brasil à normalidade de uma democracia liberal, incluindo eleições diretas para todos os cargos eletivos, uma Constituição elaborada por Assembleia Constituinte eleita e a promoção da participação popular por meio de conselhos e consultas públicas previstos a partir das novas leis. No âmbito econômico, o Brasil começou a abrir a economia no início dos anos 1990, inicialmente no comércio exterior e, mais tarde, no mercado financeiro, possibilitando quebra de reservas de mercado, preços mais competitivos para mercadorias e estímulos à modernização e ao aumento da produtividade. O País, então, retornava à normalidade ao se reintegrar ao circuito regular da economia mundial.