Mesmo tendo quase 8 mil quilômetros de costa litorânea, o Brasil ainda utiliza pouco o transporte por cabotagem (navegação costeira entre portos). As rodovias, para se ter ideia, respondem por 67% do volume de mercadorias transportadas, ao passo que a cabotagem atende a 7,9% do total, informa o Plano Nacional de Logística (PNL 2035), publicado pela Empresa de Planejamento e Logística (EPL), do governo federal, em março de 2021.
Embora o transporte sobre rodas seja predominante historicamente, há perspectivas de melhora. O uso da cabotagem vem crescendo no Brasil, diante de suas cada vez mais percebidas vantagens em relação aos modais rodoviário e ferroviário. Além de opção mais econômica e competitiva no alívio dos gargalos logísticos, o incentivo do governo federal, a partir da criação da BR do Mar, desponta como dose de ânimo ao setor. Com a sanção da Lei 14.301/2022, o modal tende a crescer no escoamento da produção.
Realizada por navios que circulam entre portos de um mesmo país, a cabotagem se difere da navegação de longo percurso, feita entre diferentes territórios. Nesta modalidade de transporte, os trajetos são mistos, uma vez que as embarcações não traçam o percurso completo. Os trajetos se fecham com outros meios, a exemplo do rodoviário, nas pontas do ciclo logístico, para entregar os produtos da origem até o embarque e do desembarque até o destino.
A nomenclatura é uma referência a Sebastião Caboto, navegante veneziano conhecido por viajar pelos mares costeiros das Américas do Norte e do Sul, no século 16, atrás de riquezas minerais.
Conheça cinco benefícios desta alternativa, que conta com fretes até 30% mais baratos do que o de caminhões.
O uso da cabotagem vem crescendo no Brasil na última década. Dados do Ministério da Infraestrutura indicam uma taxa de crescimento anual de 4% desde 2010. Somente no ramo de contêineres, este número sobe para 10,26% ao ano: de 1,1 milhão de movimentações de TEUs (medida para um contêiner de 20 pés), em 2010, para 3,25 milhões, em 2020. A Associação Brasileira dos Armadores de Cabotagem (Abac) calcula cerca de 20 novas embarcações nacionais na última década. O modal tem sido uma opção vantajosa para transporte de grandes volumes de cargas por causa do fácil acesso proporcionado aos grandes centros urbanos pela costa – menos de 200 quilômetros.
A partir da BR do Mar, a previsão é de estímulo ao desenvolvimento da indústria naval e de incentivos em operações de cabotagem nos portos. A movimentação deve facilitar a expansão das operações e a atração de novos interessados neste mercado. O objetivo da lei é ampliar a frota para a navegação, aquecendo a competitividade na prestação do serviço. Está prevista também a melhoria de utilização dos recursos provenientes da arrecadação do Adicional ao Frete para a Renovação da Marinha Mercante (AFRMM) e a criação da Empresa Brasileira de Investimento na Navegação (EBN-i), que deverá formar frota e locar os modais para as Empresas Brasileiras de Navegação (EBNs) operarem, sem a necessidade de estas investirem em embarcações próprias.
O custo do frete para transporte marítimo entre portos chega a ser entre 25% e 30% mais barato, em média, do que por rodovia, por caminhões, de acordo com a consultoria Ilos, especializada em logística e supplychain. Além disso, segundo pesquisa da Fundação Dom Cabral (FDC), feita com 130 empresas, os gastos com o transporte de longa distância representam a maior fatia dos custos logísticos. Em 2019, um mapeamento sobre o Custo Brasil, conduzido pelo Movimento Brasil Competitivo (MBC) em parceria com o Ministério da Economia, detectou que o Brasil registra gasto 1,8% superior ao Produto Interno Bruto (PIB) com logística, mais do que a média dos países da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE). Esta é uma limitação logística histórica que precisa ser vencida para alavancar o potencial competitivo. A cabotagem surge como saída para a redução dos custos nas longas distâncias.
Os quesitos de sustentabilidade e competitividade também favorecem a cabotagem em comparação a outros modais de carga. Enquanto o transporte rodoviário é responsável pela emissão de até 116 quilos de CO2 na atmosfera por cada 1.000 TKU, o transporte ferroviário emite 34 quilos, e o hidroviário, somente 20 quilos – aponta estudo da Ilos. Já no que diz respeito à competitividade, ainda segundo a Ilos, a cabotagem se sai melhor nas entregas em portos com distância superior a 1,5 quilômetro do ponto de origem.
O crescimento da cabotagem deve ter um reflexo proporcional na redução dos fretes atualmente cobrados pelas transportadoras. Com o aumento da competitividade e a notável redução nas emissões de CO2, explicada pelo maior rendimento energético dos navios em relação às demais alternativas, os valores das tarifas de transporte tendem a ser mais baixos.