Edital para o leilão do 5G se encontra na área técnica da Anatel. A meta inicial é levar o sinal para todas as 2.445 localidades brasileiras com mais de 600 habitantes. Maior leilão de radiofrequência do País é previsto para ocorrer no primeiro semestre de 2021.
Segundo especialistas, a rede 5G no Brasil é a tecnologia de transmissão de dados mais aguardada da história. Apesar dos questionamentos sobre segurança da informação e custos das tarifas para os usuários, a expectativa do mercado, do setor produtivo e do governo é por uma internet mais robusta com potencial de trafegar até 10 gigabits por segundo (hoje, com o 4G, a média é 1 gigabit por segundo). A velocidade dez vezes maior é capaz de alavancar a produtividade da indústria, do comércio, do serviços e do agronegócio, além de chegar a regiões intocadas pelo 4G.
Na prática, tanta potência deve promover um salto de US$ 1,2 trilhão no Produto Interno Bruto (PIB), no período de 2021 até 2035, afirma Wilson Cardoso, diretor de Soluções para a América Latina da Nokia, com base em estudo da empresa feito em parceria com a consultoria Omdia.
Segundo Cardoso, os preparativos da Nokia para a nova rede incluem 12 mil estações de rádio prontas, um centro de produção em Sorocaba e outro de integração e testes finais em Barueri – ambos em SP –, para a fabricação dos equipamentos. Experiência no setor não falta: “Nossas redes conectam 45% do tráfego nacional móvel, fixo e IP [endereço de internet] e 35% dos acessos de banda larga fixa. Além disso, fornecemos redes móveis 4G e private LTE [frequência de 4G privada] para todas as operadoras estabelecidas”, diz o executivo.
Outra companhia que se prepara é a multinacional sueca Ericsson. Paulo Bernardocki, diretor de Soluções de Redes para o Cone Sul da América Latina, avalia que o País deve receber investimentos diretos de aproximadamente R$ 7,8 bilhões na construção da rede. O aporte vai gerar 200 mil empregos. “Com a Ericsson, o Brasil será um dos cinco países do mundo a fabricar 5G, sendo o primeiro no Hemisfério Sul e nas Américas. Todo o Mercosul e toda a América Latina serão abastecidos com o 5G fabricado no Brasil”, afirma Bernardocki.
Para Antonio Lanzana, presidente do Conselho de Economia Empresarial e Política (CEEP), da Federação do Comércio de Bens, Serviços e Turismo do Estado de São Paulo (FecomercioSP), a nova tecnologia será a “espinha dorsal” das futuras economias, principalmente em setores com menor ritmo de produtividade. “Não estamos nos referindo a um simples avanço. Tecnologia 5G é muito mais do que isso, é uma nova geração que vai revolucionar a vida das pessoas, das empresas e do País como um todo. Vamos assistir a um sistema capaz de monitorar bilhões de dados em múltiplas redes”, em reunião temática sob a pauta A Implantação do 5G no Brasil, realizada pela FecomercioSP.
Há uma expectativa sobre a rapidez da efetivação do 5G no Brasil, mas, depois que as empresas passarem pela fase do leilão de concessão, Arthur Coimbra, secretário de Telecomunicações, do Ministério das Comunicações, afirma que há um tempo de maturação da tecnologia. As áreas de saúde e transportes, por exemplo, devem sentir plenamente os impactos positivos do 5G entre quatro e cinco anos; já os setores de finanças e varejo, em seis anos. “Projeções da Anatel [Agência Nacional de Telecomunicações] mostram que o impacto primário deve ocorrer na indústria 4.0, que já tem um grau mais avançado no uso de tecnologia”, disse, no debate da FecomercioSP.
Paulo Delgado, copresidente do CEEP, avalia que o atraso tecnológico para a oferta de internet pode ser uma perda irreparável à sociedade. “Quem atrasa na entrada do mundo tecnológico pode se perder na competição”. A mesma opinião foi defendida pelo vice-presidente da República, general Hamilton Mourão, em mensagem enviada ao painel Telebrasil. “O Brasil não pode perder o bonde da história, deixando de embarcar nesta tecnologia com o resto do mundo. Perder esta janela de oportunidades significará décadas de atraso e prejuízo para a nossa sociedade.”
Os especialistas disseram que o 5G ainda não vai substituir a internet de fibra ótica. Ambas se completam e serão utilizadas de acordo com a necessidade do usuário.
Renato Citrini, gerente sênior de produto da divisão de dispositivos móveis da Samsung Brasil, disse que nos países onde a rede 5G começou a ser implantada, os consumidores já sentem um avanço significativo nas opções de comunicação e entretenimento. “Algo que deve se repetir quando a tecnologia for instalada nacionalmente aqui no Brasil.”
Rubens Medrano, vice-presidente da FecomercioSP e presidente do Conselho de Relações Internacionais (CRI) da Entidade, afirma que a tecnologia a ser adotada, independentemente da sua origem, deve ser aquela que represente os interesses e as reais necessidades do usuário. “Decisões desta magnitude demandam estudos profundos e apurados, mas é importante que a decisão seja abreviada ao máximo possível para que os brasileiros tenham as melhores ferramentas para usufruir de toda a revolução tecnológica que evidenciamos mundialmente nos últimos anos.”
As projeções são as mais otimistas, apesar das ressalvas em relação ao debate sobre a privacidade dos dados trafegados na rede 5G, especialmente se a tecnologia pertencer à multinacional chinesa Huawei, alvo de inflamadas críticas do presidente dos Estados Unidos, Donald Trump.
Ao lado de Nokia e Ericsson, a Huawei também mira seus esforços para fornecer a rede 5G para o Brasil.
Para rebater a campanha de Trump, que sugeriu banir a atuação da companhia chinesa não só nos Estados Unidos, mas também em países como Brasil, a Huawei encomendou estudo da Oxford Economics, empresa que produz análises globais sobre mercado. O levantamento mostra que restringir a participação de um fornecedor-chave de infraestrutura na construção da rede 5G de um país aumentaria de 8% a 29% os custos totais do investimento que seria feito na próxima década, além de impactar em atrasos na implantação da tecnologia. Segundo o relatório, de fevereiro deste ano, a restrição a uma empresa também resultaria em milhões de pessoas sem cobertura 5G até 2023.
Sem incluir o Brasil, o documento da Oxford Economics reforça que um atraso na implantação do 5G também resultaria em inovação tecnológica mais lenta e menor crescimento econômico. Nos oito países analisados (Austrália, Canadá, França, Alemanha, Índia, Japão, Reino Unido e Estados Unidos), o Produto Interno Bruto (PIB) per capita seria US$ 100 menor por pessoa, em média, até 2035, em comparação com um cenário sem tal restrição.
Thiago de Aragão, mestre em Relações Internacionais pela Universidade Johns Hopkins e diretor da Arko Advice, empresa de análises política e estratégica, afirma que a questão do 5G tem impacto direto não só na geopolítica como também no posicionamento de vários países. “Os Estados Unidos identificaram, principalmente pelas características do governo Trump, que a China deveria ser, de alguma forma, contida em relação ao seu avanço não só tecnológico, mas comercial e financeiro em zonas do mundo onde historicamente os norte-americanos tinham o controle”.
Charles Andrew Tang, presidente da Câmara de Comércio e Indústria Brasil-China (CCIBC), afirma que, independentemente do presidente que esteja no poder na Casa Branca, em Washington, a competição de mercado vai continuar. “A competição entre os grandes poderes vai deixar de ser uma Guerra Fria, um confronto, mas vai ter competição, porque não começou com Trump e não vai terminar com ele. As sanções podem até ser mais pesadas.”
Tang lembra que, antes de Trump, o ex-presidente Barack Obama também entrou em campanha contra a China, ao articular com países aliados a não adesão como membros fundadores do Banco Asiático de Investimento em Infraestrutura (BAII). “Estados Unidos e Japão foram os únicos que não entraram. Todos os outros aliados americanos aderiram, porque tinham mais interesse em fazer negócios com a China”. A adesão ao banco pelo Brasil foi aprovada em agosto deste ano.
A expectativa da Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel) é de que o leilão, o maior de radiofrequência da história, para operação das redes 5G no Brasil seja realizado no primeiro semestre de 2021. O edital se encontra na área técnica da Anatel. Segundo Coimbra, do Ministério das Comunicações, a meta inicial é atender com o sinal todas as 2.445 localidades brasileiras com mais de 600 habitantes.
Sobre o início da distribuição do sinal, Nilo Pasquali, superintendente de Planejamento e Regulamentação da Anatel, afirma que as atuais prestadoras já podem implementar as redes independentemente da licitação. As vencedoras da licitação podem iniciar a operação das novas frequências, “adotando, em um primeiro momento, tecnologia 4G e implementando o 5G no futuro”.
Sobre possíveis problemas para a entrada do sinal do 5G por causa da frequência de 3,5 gigahertz das antenas parabólicas, Pasquali explicou que este padrão numérico é o mesmo utilizado em outros países, devendo ser repetido no Brasil, ou seja, a similaridade das frequências poderia ser um desafio na implementação de redes 5G. Cardoso, da Nokia, não vê empecilhos e aponta que as saídas podem ser o uso de filtros ou a migração para a frequência KU para os canais abertos, o que resolveria os impactos técnicos.