Responsável por 70% do Produto Interno Bruto (PIB) nacional, o setor de serviços corre o risco de ser obrigado a arcar com aumento de carga tributária desproporcional em comparação a outras áreas. As empresas do lucro real, por exemplo, podem passar de uma alíquota de 8,65% para, aproximadamente, 25%.
Mais de um terço (36%) dos brasileiros desconhece os detalhes do debate sobre a Reforma Tributária, segundo pesquisa do Instituto Idea. Desconhece também os aspectos do parecer definitivo acerca da Proposta de Emenda Constitucional (PEC) 45/2019, elaborada pelo Grupo de Trabalho (GT) que trata da medida na Câmara dos Deputados.
Os dados referentes ao não envolvimento das pessoas nas discussões da reforma acendem uma luz de alerta no País, pois os desdobramentos da reformulação do sistema tributário vão impactar todos — e muitos serão prejudicados pela unificação das alíquotas dos impostos.
O setor de serviços, por exemplo, responsável por 70% do PIB e que emprega 67% da população ocupada, corre o risco de sofrer aumento de carga tributária de mais de 200%, de acordo com a Federação do Comércio de Bens, Serviços e Turismo do Estado de São Paulo (FecomercioSP).
O impacto certamente resultará em demissões, fechamento de negócios e queda de desempenho econômico como um todo. Hoje, as empresas de serviços enquadradas no regime de lucro presumido contam com alíquota de 8,65% (5% de ISS e 3,65% de PIS/Cofins). Esse cenário deve mudar radicalmente se a proposta da PEC 45 for aprovada nos moldes atuais, pois com um IVA Nacional — imposto que unifica ICMS, PIS, Cofins, IPI e ISS —, a alíquota única deve ficar em torno de 25%.
O governo federal afirma que o texto final da PEC 45 contemplará alíquotas diferenciadas para prestadoras de serviços nas áreas de Saúde e Educação, mas o fato é que o setor é bem mais amplo, vai muito além desses segmentos. As empresas, principalmente as de pequeno porte, serão as mais oneradas pelo novo sistema. Nesse segmento, encontram-se salões de beleza, empresas de locação de veículos, autoescolas, despachantes, lavanderias, promotoras de eventos, turismo, segurança, entre outras — que são, inclusive, atividades férteis para o ingresso no empreendedorismo. Segundo dados do Sebrae de 2022, existem mais de 800 mil Microempreendedores Individuais (MEIs) no setor de beleza. A atividade de cabeleireiro é responsável por 8% do total de empresas nesse regime de tributação.
Ainda que “protegidos” pelo Simples Nacional, um possível aumento na carga tributária do setor de serviços desestimulará o crescimento dos pequenos negócios, que poderiam gerar milhares de empregos e movimentar a economia nacional.
No entendimento da assessoria econômica da FecomercioSP, se a ideia da PEC de prever uma tributação diferenciada para Educação e Saúde tiver o objetivo de evitar o sufocamento do setor de serviços, esse tratamento deveria ser estendido aos demais segmentos que o integram para que estes não acabem suportando a elevação da tributação, em detrimento de outros segmentos.
A adoção de um IVA dual — sendo um de competência da União (PIS e Cofins), com alíquota fixada em 12% e outro compartilhado entre Estados e municípios (junção do ICMS e do ISS, o IBS), ainda sem estimativa definida pela PEC 45 — vai gerar, na sua origem, aumento da carga tributária em diversos setores, principalmente no de serviços, como dito anteriormente.
Segundo Márcio Olívio Fernandes da Costa, presidente do Conselho de Assuntos da FecomercioSP e presidente do Conselho Estadual de Defesa do Contribuinte de São Paulo (Codecon-SP), ao sugerir a adoção de uma alíquota padrão do IBS, o relatório da PEC 45 reconhece a necessidade de alíquotas diferenciadas em casos de bens e serviços específicos, promovendo um aumento desproporcional em atividades importantes para a economia nacional.
“Justamente as empresas que mais empregam no País serão prejudicadas, pois absorverão quase que de forma integral a nova alíquota, já que sua maior despesa está no pagamento da folha salarial, e isso não dá direito a crédito. A depender do impacto, muitos empreendedores correm, inclusive, o risco de encerrar as atividades ou, em uma hipótese menos pessimista, estagnar investimentos ou reduzir o quadro profissional”, aponta Costa.
O presidente do conselho destaca ainda a iminente restrição do crédito ao tributo pago que a PEC 45 impõe às empresas. Segundo a recomendação do GT da reforma, o valor referente ao IBS será oriundo do montante cobrado (destacado na nota fiscal), e não como previsto originalmente, que dependia de comprovação do efetivo pagamento. Ainda considera que o ideal seria condicionar o crédito à exigência de comprovação de recolhimento, porém como uma alternativa para ser implementada no futuro, por lei complementar.
Outro ponto de preocupação é a falta de definição para garantir o crédito integral às empresas do Simples Nacional. Segundo Costa, na opção por manter o recolhimento unificado do IBS no Simples Nacional, a transferência de crédito será restrita ao montante cobrado no regime unificado. “O ideal seria, na verdade, que fosse permitido o crédito integral, como ocorre na atualidade com relação ao PIS e à Cofins”, afirma Costa.
Por fim, ele não acredita que exista tempo hábil para aprovar uma ampla Reforma Tributária que impacte profundamente milhares de pessoas. A melhor saída, segundo Costa, seria adotar “medidas factíveis e que deem fôlego ao empreendedorismo no Brasil, como redução (ou manutenção) da carga tributária setorial atual e simplificação do modelo de cobrança dos impostos e das penalidades desproporcionais ao não cumprimento das atuais obrigações fiscais”.