Além das chuvas fechando o verão, o mês de março trouxe uma saraivada de pesquisas sobre a avaliação atual do terceiro governo do presidente Lula aos olhos da população. Considerados alarmantes e flagrantemente desfavoráveis pelos analistas políticos da crônica jornalística — seja dos meios corporativos tradicionais, seja dos assim chamados meios alternativos ou independentes, inclusive os de esquerda ou progressistas —, os resultados fizeram soar o alerta máximo nas embarcações do governo e do Partido dos Trabalhadores (PT): perigo de naufrágio à vista!
É fato que, desde 2023, empresas de peso do ramo de sondagens da opinião pública já vinham sinalizando que as avaliações “ótimo/bom/positivo” se mantinham aquém das expectativas da administração do atual governo. Segundo a linha histórica dos dados levantados pelos institutos de pesquisa Ipsos–Ipec, Datafolha e Quaest, a percepção do eleitorado nesse quesito nunca ultrapassou a casa dos 40% — exceto em agosto de 2023, quando, na amostra da Quaest, as avaliações positivas do governo chegaram a 42%.
No caso das sondagens da Atlas–Intel, esse indicador comportou-se um pouco mais favoravelmente, mantendo-se sempre acima de 40%, com um ápice de 48,8% em dezembro de 2024. Contudo, em janeiro deste ano, os dados convergiram para a dinâmica capturada pelas demais pesquisas, registrando 37,8% de “ótimo/bom” na avaliação popular, uma drástica redução de 11 pontos porcentuais (p.p.) em mais ou menos um mês!
Como era de se esperar, o humor do eleitorado com relação ao governo refletiu-se no indicador complementar que atribui “aprovação/desaprovação” ao próprio presidente. De acordo com a Ipsos–Ipec, a taxa de aprovação, que exibiu valores acima de 50% ao longo de 2023, começou a declinar a partir de 2024, oscilando um pouco para baixo ou para cima desse número até dezembro do mesmo ano.
Poucos meses depois, em março de 2025, a aprovação despencou de 47% para 40% — por sua vez, a reprovação foi de 46% para 55%. A Atlas–Intel e a Quaest aferiram valores ligeiramente mais favoráveis durante o ano passado, mas, em linhas gerais, identificou uma evolução semelhante à apontada pela Ipsos–Ipec a partir de janeiro de 2025.
Sem dúvida, aconteceu algo marcante entre o fim de 2024 e o início deste ano. Com metodologias diferentes e variações nos valores apurados — alguns que mereceriam uma análise mais detida —, todas as pesquisas apontam para uma retração expressiva na avaliação do governo e da presidência de Lula a partir do início de 2025. No entanto, até que ponto essa situação é tão atípica e alarmante? Em que medida esse quadro impõe dificuldade à sua reeleição?
A situação não é propriamente atípica. Dados do Datafolha sobre as taxas de “ótimo/bom” para os governos anteriores, no mesmo período de pouco mais de dois anos de mantado, relativizam as posições alarmistas. Mesmo se desconsiderarmos os governos precários de Sarney (9%), Collor (15%) e Temer (3%), Lula 3 (29%) tem avaliações um pouco superiores às de FHC 2 (26%) e Bolsonaro (24%), e não muito distante de Lula 1 (35%).
Claro que FHC não se candidatou à reeleição após dois mandatos, nem conseguiu eleger o sucessor, assim como Bolsonaro não foi reeleito. Mas Lula foi reeleito e conseguiu, no segundo mandato, nesse mesmo período, 65% de “ótimo/bom”, uma avaliação que foi transferida para Dilma no primeiro mandato.
O problema é que Lula 3 tem como parâmetros comparativos para a sua avaliação almejável os valores obtidos por Lula 2. Num cenário político bastante diferente, com intensa polarização mais radicalizada à direita, essa meta será extremamente difícil, senão impossível.
Mesmo com o bom desempenho de alguns indicadores econômicos e a proliferação de projetos sociais e de apoio ao crescimento, a percepção subjetiva — de uma parte substancial do eleitorado que está cada vez mais resistente ao PT e ao que consideram ser a esquerda — opera como um filtro negativo de tudo o que vem do governo. Na verdade, é até surpreendente que a sua aprovação tenha atingido, até meados de 2024, valores bastante superiores aos da sua votação no segundo turno de 2022.
Outro ponto relevante é que, ao contrário do que muitos analistas dão a entender, não há uma relação direta e necessária, menos ainda exclusiva, entre a avaliação do governo e a possibilidade de reeleição do mandatário. Outros fatores também entram na equação do cálculo eleitoral, como o menu de candidaturas apresentadas, a consistência das preferências eleitorais anteriores e os eventos conjunturais que afetam o contexto eleitoral, cada qual com o seu peso. Tanto é que as próprias pesquisas que sondaram as intenções de voto em cenários eleitorais específicos, envolvendo várias candidaturas, mostraram que Lula sempre chegaria ao segundo turno, quando venceria qualquer um dos concorrentes.
Portanto, os indicadores de avaliação do governo não dizem muito sobre o processo eleitoral. Na verdade, o que chamo de análise estrutural de conjunturas, baseada na identificação de padrões e na ruptura de padrões a partir do exame de dados eleitorais agregados, é um instrumento que possibilita a antecipação de cenários de maneira mais plausível. Aliás, nós, analistas políticos, não podemos descartar a arte dos exames clínicos, assim como alguns médicos fizeram ao habituarem-se a emitir diagnósticos somente com testes laboratoriais.
De fato, a análise do padrão das eleições presidenciais indica que, em 2026, o PT estará no segundo turno, com ou sem Lula. No polo oposto, haverá um candidato de direita ou extrema direita — a julgar pelas pesquisas de intenção de voto, o mais cotado é o governador do Estado paulista, Tarcísio de Freitas. Todavia, diante da difícil competição com Lula — se ele for mesmo candidato — e da elevada possibilidade de Freitas ser reeleito em São Paulo, pode ser que o polo da direita mais radicalizada tenha de investir num plano B. Mas não esqueçamos disto: a eleição não é hoje!
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