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Empresas e sociedade aliadas na eleição

Caio Magri
Caio Magri é diretor-presidente do Instituto Ethos.
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Caio Magri
Caio Magri é diretor-presidente do Instituto Ethos.

Em outubro de 2024, a população brasileira irá às urnas para eleger novos prefeitos e vereadores nos 5.568 municípios do País. Ao todo, mais de 156 milhões de pessoas, de acordo com dados do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), estarão aptas a votar nas candidatas e nos candidatos de sua preferência. Contudo, a campanha eleitoral começa muito antes, na escolha dos nomes, na divulgação de propaganda e na arrecadação de verbas, entre outras ações. Esse período envolve muitos atores, como governos e sociedade civil. Mas há uma outra parte interessada que nem sempre é lembrada, mas desempenha papel importante e tem, da mesma forma, responsabilidades a serem cumpridas nas eleições: as empresas.

A relação entre corporações e processos eleitorais é antiga e sempre um tema que as companhias evitavam, mesmo sendo parte do seu dia a dia. Por isso, para desmistificar o assunto e contribuir para que as empresas tenham um direcionamento adequado sobre o que fazer (ou não) na relação com políticos e processos eleitorais, o Instituto Ethos, desde 2002, publica, a cada eleição, o guia A responsabilidade social das empresas no processo eleitoral.

O material busca contribuir e orientar as ações das empresas quanto às próprias responsabilidades nos processos eleitorais. Para isso, é preciso entender como as empresas podem ter um espaço de atuação em sintonia com o fortalecimento da democracia, além de diálogo e tolerância do ponto de vista social. As empresas podem, e devem, participar dessa discussão. Mais do que isso: é preciso que as corporações, independentemente de seu tamanho, entendam que são aliadas da sociedade civil no relacionamento com representantes do poder público.

Nos últimos anos, a relação entre empresas e eleições sofreu mudanças significativas. Até o processo eleitoral de 2016, por exemplo, o foco era o debate sobre as doações para campanhas eleitorais. Muito se questionava se essas doações tinham efeitos positivos ou negativos, além da finalidade da iniciativa. Se uma empresa optasse por fazer contribuições financeiras, como poderia realizá-las de forma ética e transparente, por exemplo? A preocupação com os escândalos de corrupção ligados ao financiamento de campanhas por parte de empresas era um dos temas mais abordados nessa discussão. 

Desde então, importantes mudanças foram incorporadas às eleições. Em 2016, houve a instituição, pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE), de um sistema para divulgação, em tempo real, das contribuições financeiras. A novidade facilitou a análise dos principais financiadores e como as doações eram utilizadas. Estudos que, antes, demandavam meses de empenho passaram a ser realizados em dias. Foi um avanço importante nos processos de transparência dos gastos eleitorais. 

Outra alteração relevante, talvez a de maior impacto, foi a proibição de doações de pessoas jurídicas para campanhas eleitorais, por meio da Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 4.650, julgada em setembro de 2015, que começou a valer nas eleições municipais do ano seguinte. Dessa forma, somente pessoas físicas poderiam realizar doações a campanhas eleitorais

Sem a possibilidade de contribuições financeiras, a relação das empresas com as eleições mudou, mas não deixou de ser importante — pelo contrário. Essas companhias permanecem na posição de agente de mobilização social, uma vez que são capazes de incentivar o engajamento político e o voto consciente. Hoje, inclusive, há inúmeras ferramentas para isso, mais do que havia há alguns anos. Por exemplo, o papel das empresas de difundir e apoiar campanhas de combate à desinformação nesse período é fundamental. Podem ainda promover debates e informações de qualidade, seja nos próprios veículos de comunicação interna, seja agindo como patrocinadora de veículos de imprensa, seja atuando como influenciadoras nas redes sociais. 

Além disso, o setor privado pode inspirar e ajudar a construir políticas públicas que caminhem na direção de uma sociedade mais justa e sustentável em alinhamento com a agenda 2030, os Objetivos do Desenvolvimento Sustentável (ODS) e a própria agenda ASG (Ambiental, Social e Governança). Nesse sentido, os negócios podem trabalhar em conjunto com a sociedade civil, em espaços de diálogos e ações coletivas para exigir, dos candidatos, compromissos públicos alinhados com essa agenda e com próprias promessas de campanha. Além disso, demandar que sejam concretas, claramente descritas e com metas quantificadas e, posteriormente, cobrar das eleitas e dos eleitos o efetivo cumprimento. 

As eleições são parte fundamental para a construção de uma sociedade democrática. Manter, fortalecer e aperfeiçoar a democracia é de responsabilidade de todos. O regime democrático é efetivo para construir propostas levando em conta os posicionamentos das diferentes populações e dos setores econômicos e políticos. É desse processo diverso e enriquecedor que precisamos para superar desafios como a mudança do clima, o processo de aumento da desigualdade e da extrema pobreza e a insegurança alimentar, além de fortalecer a cultura de integridade, ética e compliance

Por mais que a relação entre empresas e eleições tenha mudado, as corporações podem (e devem) utilizar da sua estrutura, seu conhecimento e sua relevância para contribuir para a democracia e o desenvolvimento do País. E isso passa diretamente pelos processos eleitorais.Fique atento: neste ano, de eleições municipais, o Instituto Ethos disponibilizará uma versão atualizada do guia A responsabilidade social das empresas no processo eleitoral.

Os artigos aqui publicados são de inteira responsabilidade de seus autores e não refletem a opinião da PB. A sua publicação tem como objetivo privilegiar a pluralidade de ideias acerca de assuntos relevantes da atualidade.