MAGAlomania é um transtorno psicológico marcado pelo conflito entre uma personalidade fundamentada pela crença de que é excepcional e a percepção de que essa excepcionalidade está se esvaindo. Como lidar com a contradição? Se realmente é excepcional — como acredita ser —, essa personalidade jamais perderia tal poder; se deixou de ser tão grandiosa, talvez nunca tenha sido realmente excepcional. Contudo, como a sua excepcionalidade é uma crença estrutural, ou seja, constituiu o seu caráter, o abandono dessa crença implica o abandono de si mesma e, portanto, a sua aniquilação psíquica.
A incerteza, então, rapidamente se torna insegurança, que alimenta o ódio, que nutre a revolta. Mas uma revolta contra quem? Há de haver culpados! Se descobertos e neutralizados, esses perversos responsáveis deixarão de ser obstáculos à grandeza intrínseca dos MAGAlômanos. Mais do que isso, a própria neutralização desses miseráveis será uma reafirmação da própria potência. A MAGAlomania é, portanto, própria de uma autoestima desmedidamente inflada que foi ferida e está disposta a se vingar daquilo (e daqueles) que ousaram atrapalhar a caminhada triunfal até a consagração máxima da sua superioridade.
Acometidos por tal patologia, os MAGAlômanos facilmente submergem nas mais obscuras profundezas do delírio: julgam-se inatamente superiores, únicos, onipotentes. Obnubilados pela névoa da crença inabalável em sua excepcionalidade, os MAGAlômanos estão certos de que são os “escolhidos” para uma missão divina para libertar os povos do jugo dos tiranos (complexo de Moisés) ou para salvar a humanidade da perdição (complexo de messias). Eles são os faróis da moral, da liberdade e da prosperidade.
Basicamente, os seus traços de personalidade são os mesmos da megalomania, um rótulo que abriga uma variedade de tipos de transtorno de personalidade. De fato, a megalomania é a condição inicial da MAGAlomania. Primeiro, foi necessário constituir uma personalidade coletiva megalomaníaca; depois, quando a sua utopia um tanto narcísica começou a desmoronar diante dos próprios olhos, essa personalidade coletiva se deparou com a terrível contradição de ser uma excepcionalidade em declínio. Assim, estavam dadas as condições para a essa neurose social, bastava apontar os culpados/obstáculos externos e arregimentar os grandiosos resilientes em torno de um projeto de restauração do “paraíso perdido”.
Eis o seu projeto, Make America Great Again (MAGA). O “Moisés” desse projeto — ou seria o “messias”? —, Donald Trump, já cuidou de ungir a si mesmo logo no discurso de posse: “Minha vida”, disse ele, “foi salva pela graça de Deus para que eu faça a América grandiosa de novo”. À custa de muita pesquisa e propaganda, Trump conseguiu arrebatar os espíritos desalentados da sociedade norte-americana prometendo um reencontro com o seu “destino manifesto”.
No mesmo discurso, apertou os principais botões do mecanismo MAGAlômano: “A era de ouro da América começa neste exato momento. A América vem primeiro (…) Muito em breve a América será maior, mais forte e ainda mais excepcional do que jamais foi (…) Não há nação como a nossa. Nós, americanos, somos exploradores, inovadores, empreendedores e pioneiros. O espírito do desbravador das fronteiras está escrito nos nossos corações. O chamado para a próxima grande aventura ressoa em nossas almas”.
Que aventura é essa? A despeito das guinadas nas políticas relacionadas às agendas moral e da “lei e ordem”, o governo Trump deixou de lado a hipocrisia que caracteriza os governos anteriores para declarar em alto e bom som que vai dar seguimento às políticas imperialistas de sempre, mas com estratégias ainda mais agressivas, incluindo a expansão territorial do país — especialmente sobre a Groelândia —, a extração de recursos até mesmo das nações aliadas (União Europeia e Canadá que se cuidem) e os cercos econômico, diplomático e até militar, se preciso for, aos principais eixos da multipolaridade: Rússia, China e Irã.
Israel continuará sendo o seu posto avançado para dominar o Oriente Médio e dissuadir o “eixo da resistência” regional. A América Latina que se prepare, pois Trump não quer qualquer estranho no seu “quintal”, desde governos de esquerda mais soberanos até interconexões políticas e econômicas muito estreitas com as potências do Brics.
Portanto, muitas coisas vão mudar para tudo continuar igual: o excepcionalismo que justifica a drenagem das riquezas do próprio país e do restante do mundo diretamente para os bolsos da elite econômica — cada vez mais reduzida. Trump aposta nos efeitos duradouros da sua proeza, pois reavivou a ilusão de uma transformação política ao vender apenas a mudança do conteúdo da ilusão: “Make America Great Again”! Agora, será possível alimentar a MAGAlomania sem destruir o mundo? Ou a MAGAlomania tem um encontro marcado com a realidade?
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