Nos últimos dias, certos fatos bizarros tomaram conta do noticiário:
1) dita influencer, presa preventivamente por suposto envolvimento em crimes, tem a reclusão convertida em prisão domiciliar para cuidar da filha pequena, desde que, dentre outras condições, se abstivesse de se manifestar em redes sociais e de se comunicar com a imprensa. Quais são as primeiras coisas que faz ao sair? Concede várias entrevistas na porta da cadeia e faz imediata postagem em rede social. Prisão restaurada, choro e discurso sobre uma alegada perseguição;
2) dito influencer candidato a mandato eletivo busca cativar eleitorado com agressões verbais e graves acusações sem provas, dirigidas aos demais candidatos, buscando refúgio numa suposta e imaginária perseguição quando lhe chegam as consequências dos próprios atos;
3) determinado artista teria supostamente cooperado para que deixassem o País certas pessoas com prisão preventiva decretada, considerando isso algo trivial, sem gravidade. Pessoas essas que não se sentiriam responsáveis diante da prática de fatos graves, porque se sentiriam no direito de agir daquela forma, embasadas na riqueza, na fama, na aceitação pelo seu grupo social e/ou na proximidade com posições de poder.
Por que seriam bizarros? Vamos falar sobre uma questão preocupante: esforços narrativos para a normalização de condutas (em tese) não apenas moralmente reprováveis, mas também provavelmente ilícitas frente à legislação brasileira. Ninguém se escusa de cumprir a lei, alegando que não a conhece (artigo 21 do Código Penal) — o suposto desconhecimento da ilicitude da ação não exclui a gravidade daquilo que foi praticado.
Não custa lembrar que não existe direito a falar tudo o que se pensa sem qualquer responsabilidade. A liberdade de expressão não é absoluta e encontra limites quando as declarações causam prejuízo a outras pessoas. Acusar alguém da prática de um crime sem qualquer prova material é crime e se chama calúnia. Atribuir sem provas a outra pessoa a prática de fato grave (que não seja crime) constitui o delito de difamação. Agredir verbalmente, xingar e ofender a dignidade de alguém publicamente é injúria. Além disso, se o conteúdo das declarações causar prejuízo, cabe indenização por danos morais e materiais. E não adianta a “quinta série”, diante da perspectiva de punição, dizer que estava brincando. Isso é irrelevante.
Não custa lembrar também que é crime qualquer atitude discriminatória dirigida a pessoa ou a grupo que cause constrangimento, humilhação, vergonha, medo ou exposição indevida — e que usualmente não se dispensaria a outros grupos em razão da cor, da etnia, da religião ou da procedência. Racismo é crime! Não existe direito a ser racista, e não se trata apenas de questão de opinião.
Não custa ainda lembrar ainda que matar a esposa infiel é crime. Bater no filho é crime. Tentativa de golpe de Estado é crime. Homofobia é crime. Obstruir investigações é crime. Dirigir alcoolizado é crime. Porte ilegal de armas é crime. Garimpo ilegal é crime. Grilagem de terras é crime. Corte ilegal de madeira é crime — entre muitas outras condutas que, recentemente, foram objeto de normalização por muitos grupos e por parte da mídia.
Que não se normalize o bizarro, ainda que sirva para eleger candidatos, para enriquecer empresas e pessoas, para entreter vidas vazias ou para trazer fama instantânea a determinadas figuras. O errado continua sendo errado, o ilícito continua sendo ilícito, o crime continua sendo crime. Não importa se praticado pelo cidadão de bem, pelo famoso, pelo político, por alguém de seu grupo social ou pelo seu parente.
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