Dois mil e vinte e cinco… Imaginávamos carros voadores, casas verdadeiramente inteligentes… e impressoras obedientes (ironia incluída). No entanto, boa parte do esforço tecnológico segue dedicada a aperfeiçoar formas de matar — e o governo de extrema direita de Israel é prova inequívoca desse desvio de prioridades.
Seria fácil afirmar que as tensões entre Israel e Palestina começaram após os ataques do Hamas, em 7 de outubro de 2023, mas a disputa remonta, no mínimo, à Nakba de 1948, o êxodo de palestinos que ocorreu após a criação do Estado israelense. Deixo a cronologia mais minuciosa para os historiadores. Aqui, o ponto é outro: o uso de tecnologia avançada para viabilizar o genocídio de uma população inteira, a inteligência maquínica aplicada à morte.
Quando Lula declarou, em 18 de fevereiro de 2024, que o que Israel fazia em Gaza era genocídio, comparando o massacre à política de extermínio de Hitler contra os judeus, o mundo reagiu em choque. Hoje, ninguém informado contesta que estamos diante de um projeto de limpeza étnica conduzido com sistemas tecnológicos de alta performance.
O nível de inovação para assassinar aqueles considerados inimigos de Israel transformou o país numa espécie de “Disney da guerra”, em que políticos de extrema direita de todo o planeta vão fazer excursão para aprender como é a “segurança pública” de lá, ou seja, como fazer genocídio sem sair de casa.
Chamou a atenção, por exemplo, que, no primeiro contra-ataque do Irã a Tel Aviv, 11 políticos brasileiros estavam por lá para fazer um “curso de massacre em massa” com os amigos do primeiro-ministro Benjamin Netanyahu. A situação foi muito absurda, porque viajaram em um momento de alta tensão entre o governo de Israel e seus diversos inimigos e acabaram tendo de ficar escondidos em um bunker até poderem voltar para o Brasil.
Observar o que o governo israelense tem feito em Gaza, aos olhos de quem quiser ver, só traz a mais evidências ao argumento do escritor e jornalista Antony Loewenstein, de que a Palestina é, atualmente, um laboratório do governo de Israel para o teste de equipamentos confeccionados por suas Forças Armadas e suas empresas privadas de segurança e inteligência. Assim, o “laboratório Palestina” é a vitrine das inovações de Israel em termos de armas, drones assassinos, aparelhos de escuta, entre outras maquinarias de morte para os usos público e doméstico.
E não somente o governo e os empresários israelenses têm lucrado com a guerra. O Google, após 7 de outubro de 2023, fez negócios lucrativos com Israel, vendendo tecnologia de Inteligência Artificial (IA) de ponta para ser usada no assassinato de palestinos. Outra empresa que lucrou muito na corrida genocida foi a Microsoft. Esta tem prestado serviços de nuvem às Forças Armadas israelenses, batizada de Plataforma das Armas, que inclui aplicativos para marcação de alvos em bombardeios, um portal que visualiza o céu de Gaza, a coleta de informações para Israel dentro do Projeto Unidade 8200 , etc.
A colaboração entre as grandes empresas de tecnologia e Israel não começou em 2023. Em 2021, tornou-se público o Projeto Nimbus, em que Google e Amazon pagaram US$ 1,5 bilhão para que os ministérios do país repassassem para essas empresas seus dados e, em contrapartida, receberiam serviços avançados. Naquele momento, funcionários das duas empresas chegaram a escrever a carta “No Tech For Apartheid” (“Nenhuma tecnologia para o apartheid”, em tradução livre). O resultado? Cinquenta demissões.
Ou seja, a guerra contra civis palestinos tem muitos sentidos, dois deles bem marcados — manter Netanyahu, do Likud (partido de direita israelense), no poder e também fazer com que empresas privadas e o Estado israelense encham os bolsos de dólares. O próprio Exército brasileiro anunciou, em 2024, a articulação para a compra de veículos blindados com canhões de longo alcance do grupo israelense Elbit Systems, por R$ 1 bilhão. A guerra é lucrativa.
Os drones, ao invés de ajudarem no salvamento de Juliana Marins, a brasileira que morreu ao cair durante uma trilha em um vulcão na Indonésia, têm exterminado mulheres e crianças — 70% das 50 mil mortes de palestinos foram dessa parcela da população, segundo o Escritório de Direitos Humanos da Organização das Nações Unidas (ONU). Em vez de contribuir para a construção de infraestruturas ou fazer diagnósticos de doenças, a Inteligência Artificial (IA) está aprimorando bombardeiros. Um exemplo é o Joint Direct Attack Munition (JDAM), um kit produzido pela Boeing que converte bombas comuns em inteligentes, guiadas por GPS de alta precisão.
A guerra comprova que, sem escrutínio público e regulação democrática, a promessa de emancipação tecnológica converte-se em mais‑valia mortífera.
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