Artigo

As empresas e o clima extremo

Caio Magri
Caio Magri é diretor-presidente do Instituto Ethos.
Marina Esteves
é coordenadora de Práticas Empresariais e Políticas Públicas em Clima e Meio Ambiente do Instituto Ethos
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Caio Magri
Caio Magri é diretor-presidente do Instituto Ethos.
Marina Esteves
é coordenadora de Práticas Empresariais e Políticas Públicas em Clima e Meio Ambiente do Instituto Ethos

Eventos climáticos extremos passaram a ocupar um espaço significativo no cotidiano dos brasileiros. O Estado do Rio Grande do Sul, por exemplo, vem enfrentando uma devastadora ocorrência de chuvas intensas, apenas um ano após ter passado por inundações severas. Em 2023, presenciamos o maior nível de chuva já registrado no Brasil em 24 horas. As tempestades ocorreram em São Sebastião, Bertioga, Barra do Sahy e Juquehy, no litoral norte de São Paulo, acumulando 683 milímetros de precipitação em um único dia. 

Além disso, a seca histórica dos rios amazônicos, como o Negro e o Tapajós, atingiu níveis mínimos em mais de 120 anos. Enchentes e deslizamentos também foram observados em Recife e Petrópolis em 2022, regiões geomorfologicamente distintas, mas igualmente vulneráveis a eventos climáticos extremos. Esses exemplos evidenciam que as mudanças climáticas não são um desafio do futuro distante, mas uma realidade presente e urgente não apenas no nosso país, mas no mundo todo.

Segundo o Sexto Relatório de Avaliação do Painel Intergovernamental sobre Mudança do Clima (IPCC), a intervenção humana, especialmente desde a segunda metade do século 19, tem causado um aumento exponencial na concentração de Gases de Efeito Estufa (GEEs) na atmosfera. Essa correlação entre atividades econômicas e a crise climática aponta para a responsabilidade específica de determinados atores. Filósofos e pensadores indígenas, por exemplo, argumentam que o compromisso pela crise climática não é universal, mas está distribuído de maneira desigual, afetando diferentes classes, raças e gêneros de formas distintas.

Nos debates internacionais, como na última Conferência das Partes (COP28), o Brasil defendeu a necessidade de reconhecer essas diferentes responsabilidades. Países desenvolvidos, que se industrializaram de maneira insustentável, devem assumir compromissos mais robustos e apoiar os países em desenvolvimento na redução de emissões e na adaptação aos efeitos das mudanças climáticas. A vulnerabilidade a eventos extremos está diretamente ligada aos processos de exclusão social que relegaram populações marginalizadas a áreas de alto risco de desastres.

Portanto, qualquer abordagem com foco na mitigação e na adaptação a essas mudanças deve considerar essas desigualdades. Tradicionalmente, o setor empresarial foca em ações como mensuração, reporte, redução de emissões, transição energética e investimentos em inovação. No entanto, a adaptação aos efeitos nocivos das mudanças do clima foi, em grande parte, deixada para o Poder Público, que investe em infraestrutura, comunicação com populações de risco e planejamentos urbano e rural. E para aproximar os empresários dessa agenda de adequação, é necessário integrar a agenda climática com a de direitos humanos. Negócios devem investir em prevenção, gestão de riscos climáticos e socioambientais. Além disso, a implementação de programas ASG (Ambiental, Social e Governança) é fundamental para reduzir riscos financeiros e reputacionais, além de atrair investidores que priorizem práticas sustentáveis.

Regulamentações internacionais, como a Diretiva de Devida Diligência em Sustentabilidade Corporativa, da Comissão Europeia, que será implementada a partir de 2027, exigirão que as empresas identifiquem, avaliem, abrandem e corrijam impactos negativos sobre os direitos humanos e o meio ambiente nas cadeias de valor. Essas obrigações incluem a análise de riscos relacionados a trabalho infantil, escravidão, poluição, desmatamento e danos aos ecossistemas, alinhando-se com padrões internacionais, como os Princípios Orientadores das Nações Unidas sobre Empresas e Direitos Humanos (POs) e as Diretrizes para Empresas Multinacionais da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE).

Essas mudanças regulatórias internacionais exigirão que negócios operantes no Brasil ou que mantenham relações comerciais com países aderentes a essas legislações se adaptem. A definição de metas e planos setoriais será essencial para atribuir responsabilidades adequadas aos diferentes atores. Por isso, os anos de 2024 e 2025 serão estratégicos para as agendas climática e socioambiental, especialmente com a realização da COP30 em Belém (PA), que marcará os dez anos da aprovação do Acordo de Paris e a necessidade de revisão das Contribuições Nacionalmente Determinadas (NDCs).

O desafio, então, será traduzir as exigências internacionais para a realidade brasileira, garantindo que as ações de contenção da crise climática sejam efetivas e beneficiem tanto a sociedade quanto a natureza, sem acentuar desigualdades históricas. A COP brasileira deve “inserir as pessoas no clima”, construindo ações em parceria com diferentes atores para garantir um futuro sustentável e justo.

ESTE ARTIGO FAZ PARTE DA EDIÇÃO #482 IMPRESSA DA REVISTA PB. CONFIRA A ÍNTEGRA NA VERSÃO DIGITAL, DISPONÍVEL NA PLATAFORMA BANCAH.

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