Artigo

O Supremo e as quatro linhas da Constituição

José Mário Wanderley Gomes Neto
é doutor em Ciência Política, mestre em Direito Público pela Universidade Federal de Pernambuco (UFPE) e docente da Universidade Católica de Pernambuco (Unicap). Integra o grupo de especialistas que escrevem às quartas-feiras na coluna "Ciência Política" da PB.
D
José Mário Wanderley Gomes Neto
é doutor em Ciência Política, mestre em Direito Público pela Universidade Federal de Pernambuco (UFPE) e docente da Universidade Católica de Pernambuco (Unicap). Integra o grupo de especialistas que escrevem às quartas-feiras na coluna "Ciência Política" da PB.

“Democracia não é só liberdade para os cidadãos; deve ser também responsabilidade para os que governam.”

Luiz Octavio Gallotti, ex-ministro do Supremo Tribunal Federal (1984–2000) 

A Constituição define as regras e os limites para a atuação dos poderes Executivo, Legislativo e Judiciário. Precisamente, para assegurar o cumprimento estrito desses limites, a estrutura institucional estabelece a criação de um órgão cuja principal função é determinar, sempre mediante solicitação, se atos legislativos e/ou administrativos são (ou não) compatíveis com a Constituição — no nosso país, o Supremo Tribunal Federal (STF). Apesar das tensões e dos debates que envolvem a atuação da instância superior, a sua presença é essencial para o funcionamento do sistema institucional e da democracia em si.

A principal razão para a criação de um órgão dessa natureza é a prevenção de possíveis abusos de poder. Sem um mecanismo de controle jurisdicional para verificar a constitucionalidade de leis e atos dos poderes públicos, haveria um risco inerente de desvio de propósito e de violação de direitos fundamentais e princípios democráticos. O STF desempenha um papel crucial como um forte freio de natureza constitucional, pois garante que toda a produção normativa e as ações do Estado estejam em estrita conformidade com o texto constitucional, salvaguardando a cidadania contra possíveis arbitrariedades e excessos.

As decisões emitidas por tribunais constitucionais ao redor do mundo costumam gerar debates acalorados nos âmbitos público e acadêmico, levantando, em alguns casos, questões sobre uma possível extrapolação de suas atribuições, sendo consideradas ativismo. Esse tipo de debate é saudável e faz parte da dinâmica de qualquer democracia. O ponto central reside nas fronteiras da interpretação constitucional e na possível invasão de áreas de competência distintas. É preciso separar essas discussões pontuais (e legítimas) da necessidade estrutural e da relevância essencial da própria instituição.

A falta de um tribunal constitucional independente — ocasionalmente cooptado por forças políticas — poderia, por outro lado, resultar em um vazio institucional com graves consequências. Nesse caso, estaríamos sujeitos a decisões de caráter estritamente político, que poderiam facilmente variar de acordo com os ciclos das maiorias políticas passageiras, seja no âmbito legislativo ou eleitoral. Por outro lado, a Constituição não é um conjunto de normas estático, mas um documento político que demanda uma análise contínua diante dos desafios de cada época, necessitando ser interpretado com a cautela e a parcimônia dos períodos em que os conflitos são solucionados.

Apesar das críticas pontuais em relação ao desempenho de seus membros em casos específicos, a atuação da instituição é fundamental para as proteções efetivas dos direitos e das garantias individuais e para a preservação da democracia. Um mecanismo fundamental para os freios e contrapesos, evitando a acumulação excessiva de poder e, em última instância, protegendo a própria natureza do Estado democrático de direito.

Os artigos aqui publicados são de inteira responsabilidade de seus autores e não refletem a opinião da PB. A sua publicação tem como objetivo privilegiar a pluralidade de ideias acerca de assuntos relevantes da atualidade.