A COP da ação

16 de setembro de 2025
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As expectativas são altas: o coração da Amazônia receberá cerca de 50 mil pessoas para discutir soluções para um problema que afeta o mundo todo — as mudanças climáticas. Porém, para o presidente da 30ª Conferência sobre Mudanças Climáticas (COP30) da Organização das Nações Unidas, o embaixador André Corrêa do Lago, essa não será uma COP de teorias e tentativas de acordo, mas de ação.

“A maior parte dos compromissos do Acordo de Paris já foi negociada. A implementação é justamente aplicar as novas regras na economia real”, afirma, em entrevista à Revista Problemas Brasileiros, que contou com a parceria da escola de formação política RenovaBR. Nesse sentido, o Brasil ganha protagonismo não só como anfitrião, mas também como provedor de soluções para um planeta mais verde.

Confira abaixo os principais trechos da entrevista. Você também pode assistir a íntegra, em vídeo, no CANAL UM BRASILClique aqui.

Quais são as estratégias para garantir o previsto no Acordo de Paris?

Esse é um tema absolutamente central. À medida que as negociações foram avançando, constatou-se que o combate às mudanças climáticas envolvia muito mais setores, custos e interesses econômicos. E foi surgindo a separação entre aqueles que pedem recursos para dirigir a economia para a descarbonização e os países desenvolvidos, que, além de fornecerem muito dinheiro, temem enfrentar a concorrência de nações que possam se tornar mais sustentáveis e competitivas. A negociação transformou-se numa divisão entre Norte e Sul globais.

A ambição é alcançar US$ 1,3 trilhão para o financiamento de ações climáticas. Como é possível equilibrar a urgência por recursos e a efetiva aplicação?

O valor de US$ 1,3 trilhão é um mapa do caminho que deve ser detalhado um pouco antes da COP30. O que foi aprovado na COP29 [em Baku, no Azerbaijão] são os US$ 300 bilhões por ano, uma evolução em relação aos US$ 100 bilhões propostos em Copenhague [Dinamarca, em 2009, na COP15] e que seriam fornecidos aos países em desenvolvimento de 2020 a 2025. Não atingimos esse valor. Há estimativas divergentes, mas, com base em estudos da OCDE [Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico], a partir de 2023 chegaram-se aos US$ 100 bilhões por ano, o que não aconteceu nos dois primeiros anos. Entretanto, isso é discutível. Algumas ONGs, por exemplo, dizem que nem 20% do valor foi recebido. Ao mesmo tempo, foi publicado um relatório, liderado por três grandes economistas — Nicholas Stern, Vera Songwe e Amar Bhattacharya —, que apontava US$ 1,3 trilhão como o valor necessário para o financiamento climático a partir de 2035. Esse caminho será muito debatido, porque não é óbvio. O que realmente resolveria a questão seria o que chamamos de mainstreaming de clima nas finanças internacionais: que todos os investimentos tenham embutida a questão do clima. Se só for possível obter recursos caso a questão do clima seja levada em consideração, certamente reuniremos US$ 1,3 trilhão e muito mais.

Quais ferramentas podem ser discutidas na COP30 para arrefecer o que o senhor chama de negacionismo econômico?

Durante vários anos, houve o negacionismo científico. No entanto, o aumento da intensidade e da frequência dos eventos extremos reduziu de maneira brutal esse pensamento. Pode-se afirmar que mais de 99% dos cientistas reconhecem o impacto das atividades humanas sobre o clima. Há uma mudança natural, sempre houve, mas muitíssimo mais lenta. Na velocidade de agora, justifica-se pela ação humana. Recentemente, em artigo na The Economist, o ministro da Energia dos Estados Unidos, Chris Wright, alegou que as mudanças climáticas são consequência do crescimento econômico. Uma consequência negativa, mas cujos benefícios são muito maiores — e ele deixa a entender que a adaptação seria o caminho. E essa discussão é importante desde o primeiro momento: o que é mitigação e o que é adaptação? Mitigação é o esforço, que tem custo elevado, para reduzir as emissões. Portanto, quando falo do negacionismo econômico, falo sobre o argumento: “Ah, é caro combater mudanças do clima, não vale a pena, porque elas vão acontecer de qualquer maneira”. Mas não é assim. A ciência diz que com a mitigação é possível reduzir danos. E tem a adaptação. O exemplo maior para nós é Porto Alegre. Certos investimentos em infraestrutura poderiam ter diminuído os danos das enchentes do ano passado. Por outro lado, contra o esvaziamento dos rios na Amazônia, só há a mitigação, não existe adaptação possível.

Qual é o plano para conectar a COP30 com iniciativas de negócios sustentáveis?

Esta COP terá o foco na implementação. “Implementação” é uma palavra tão usada, tão repetida, que parece que perde um pouco o valor. Então, vou explicar: a maior parte dos compromissos do Acordo de Paris já foi negociada, os países signatários já aprovaram o que deve ser feito. A implementação é aplicar as novas regras internacionais na economia real. E quem faz isso? Vai muito além dos governos que negociaram o acordo. Há os governos subnacionais, o setor privado, a ciência e a sociedade civil, nas mais diferentes dimensões. Portanto, a COP de Belém terá uma agenda de ação com base no que foi aprovado, o que já é consenso. E para que o consenso vire ação, precisamos mostrar soluções, uma oportunidade incrível para o Brasil e para todo o setor privado nacional. O Brasil oferece soluções em muitas áreas identificadas como essenciais no combate às mudanças do clima — como, naturalmente, a energia renovável. Há também a Agricultura, as florestas… Abre-se um grande número de oportunidades para o setor privado, pelo fato de o mundo ter adotado, por consenso, o direcionamento para uma economia de baixo carbono. O Brasil é celeiro de soluções e poderá mostrar as direções já tomadas, que são exemplos excepcionais para outros países. Evidentemente, isso é benéfico do ponto de vista econômico, mas também demonstra que coisas que ainda faltam podem ser mais baratas se feitas no Brasil. Mais oportunidades de negócios e investimentos.

Qual deve ser o legado da COP30 para a cidade de Belém?

O governo federal teve como principal objetivo assegurar que o que fosse investido em Belém fosse, na realidade, um legado para a população. Da infraestrutura e parques ao saneamento básico. Acredito que já se vê claramente que, de um ponto de vista físico, o benefício será evidente. Mas esse legado vai além do físico. O Brasil vai sair da COP30 como um país melhor, mais contemporâneo, integrado na discussão atual da economia do futuro — a de baixo carbono. A COP deve contribuir para que o País dê um salto em direção de um novo tipo de desenvolvimento. Algumas pessoas chamam a atenção para a tradição de desenvolvimentismo, um modelo dos anos 1950 que, de certa forma, perdura, consciente ou inconscientemente. Então, que seja um desenvolvimentismo sustentável, uma nova etapa na qual investir na redução das emissões traga reais benefícios econômicos. É o contrário do negacionismo econômico — é aceitar que essa nova agenda traz vantagens econômicas e a conscientização de que o Brasil tem o potencial de ser um dos países que mais se beneficiarão dessa agenda.

ESTA ENTREVISTA FAZ PARTE DA EDIÇÃO ESPECIAL COP30 (SET/OUT) DA REVISTA PB.
CONFIRA A ÍNTEGRA CLICANDO AQUI.

Entrevista Humberto Dantas | EDIÇÃO DIMALICE NUNES UM BRASIL
Entrevista Humberto Dantas | EDIÇÃO DIMALICE NUNES UM BRASIL
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