Artigo

Os dilemas da política econômica

Antonio Lanzana
é copresidente do Conselho de Economia Empresarial e Política (CEEP) da FecomercioSP e professor na Universidade de São Paulo (USP) e na Fundação Dom Cabral (FDC).
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Antonio Lanzana
é copresidente do Conselho de Economia Empresarial e Política (CEEP) da FecomercioSP e professor na Universidade de São Paulo (USP) e na Fundação Dom Cabral (FDC).

Ao se analisar o comportamento recente da economia nacional, é possível perceber, nitidamente, que há um excesso de demanda quanto à capacidade de resposta da oferta. Isso ocorre pelo fato de que a política fiscal expansionista está se sobrepondo à política monetária contracionista, apesar da permanência de juros reais extremamente elevados.

Esse excesso de demanda pode ser identificado em vários indicadores. Em primeiro lugar, verifica-se que o gasto público registrou expansão real de 10,5% no primeiro semestre deste ano em comparação ao mesmo período de 2023 (que já era uma base elevada), com forte crescimento das despesas graças ao Bolsa Família e ao Benefício de Prestação Continuada (BPC), que apresentaram um incremento real de 17,3% na mesma base de comparação. Cabe destacar também o aquecimento do mercado de trabalho, com expansão da massa real de rendimentos de 9,2%, no trimestre abril–junho de 2024 (sobre o mesmo período do ano anterior); crescimento, na mesma comparação, do rendimento real médio de 5,8% (muito acima de qualquer indicador de produtividade); e expansão na criação de vagas formais de 26% no primeiro semestre (segundo o Cadastro Geral de Empregados e Desempregados — Caged). Com isso, as empresas têm se defrontado com escassez de mão de obra, principalmente qualificada.

Esse quadro “transfere” parte do excesso de demanda para o exterior, diante da quantidade importada de bens de consumo crescendo 24,5% no período janeiro–julho (também em comparação com o mesmo período do ano passado). Ao mesmo tempo que a demanda se mostra aquecida, a capacidade de resposta da oferta fica limitada pela baixa taxa de investimento da economia, inferior a 17% do Produto Interno Bruto (PIB), insuficiente para garantir a manutenção de um progresso mais significativo.

As consequências dessa situação surgem nas frequentes revisões para o crescimento do PIB neste ano — que passaram de 1,5%, em janeiro, para valores superiores a 2,2% recentemente, de acordo com o boletim Focus. Por outro lado, as previsões de inflação também se aceleram, o que pode levar o Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) a taxas próximas ao teto da banda (4,5%) ou até acima no encerramento do ano.

É possível que esse cenário se mantenha até o fim do ano, mas não é sustentável ao longo do tempo. Cortes de demanda terão de ser realizados por meio da contenção do gasto público ou da elevação das taxas de juros. O corte de R$ 15 bilhões anunciados pelo governo é insuficiente para gerar um controle adequado das contas públicas. Fato é que ou se parte para um controle mais efetivo de gastos ou novas altas das taxas num futuro próximo serão inevitáveis. O mercado, por sua vez, mostra dúvida sobre a efetividade de novos cortes de gastos, enquanto espera o novo presidente do Banco Central (BC). Um órgão mais leniente com a inflação pode gerar um perigoso quadro de aceleração inflacionária.   

As incertezas a respeito do futuro da política econômica, principalmente no que se refere ao equilíbrio fiscal, impactam mais rapidamente o mercado financeiro, que também é muito afetado pelo cenário externo. As reações no mercado financeiro podem ser identificadas na elevação da taxa de câmbio de R$ 4,80 (março) para valores próximos a R$ 5,40/5,50 (após superar R$ 5,70); no aumento do risco-país de 33% em relação a março (CDS de cinco anos); na elevação das taxas de NTN-B para valores superiores a 6% acima do IPCA (contra 3,3% no fim de 2019); e na queda da Bolsa de Valores.

Em resumo, a inconsistência na política econômica atual terá de ser corrigida, sob o risco de o País enfrentar uma conjuntura desequilibrada, com inflação mais elevada. Esse é, por ora, o nosso maior desafio.

ESTE ARTIGO FAZ PARTE DA EDIÇÃO #483 IMPRESSA DA REVISTA PB. CONFIRA A ÍNTEGRA NA VERSÃO DIGITAL, DISPONÍVEL NA PLATAFORMA BANCAH.

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