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Quais os impactos das novas medidas fiscais?

Antonio Lanzana
é copresidente do Conselho de Economia Empresarial e Política (CEEP) da FecomercioSP e professor na Universidade de São Paulo (USP) e na Fundação Dom Cabral (FDC).
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Antonio Lanzana
é copresidente do Conselho de Economia Empresarial e Política (CEEP) da FecomercioSP e professor na Universidade de São Paulo (USP) e na Fundação Dom Cabral (FDC).

Embora muitas das medidas fiscais anunciadas pelo governo na semana passada ainda precisem de mais detalhes, já é possível avaliar seus reflexos na economia brasileira, tanto nas variáveis financeiras quanto reais.

Numa abordagem mais geral, o plano representa uma solução política para um problema econômico, o que enfraquece a equipe econômica. A forma de divulgação, incluindo a redução do Imposto de Renda (IR) para vencimentos até R$ 5 mil, deteriorou as expectativas, uma vez que o mercado esperava cortes de despesas, e não mudanças tributárias. Além disso, em sua fala, o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, não usou uma vez sequer a palavra “corte”. Na realidade, os cortes de gastos deveriam vir isoladamente, e, depois de arrumado o fiscal, a proposta de alterações no IR.

O mercado esperava dois tipos de abordagem: corte de gastos e desvinculação de despesas críticas, como Saúde, Educação, Benefício de Prestação Continuada (BPC) e Previdência. Os cortes estão superestimados — o mercado fala em uma faixa de R$ 40 bilhões a R$ 50 bilhões, e não nos R$ 70 bilhões em dois anos, como estima o governo. Até 2030, o mercado calcula economia de R$ 242 bilhões, diferentemente da conta de R$ 327 bilhões da equipe econômica. Além disso, não houve desvinculação para os itens críticos da despesa pública, que era a grande demanda do mercado. A mudança no critério de reajuste do salário mínimo, ainda que afete menos que a fórmula anterior, vai continuar gerando aumento real, o que contamina todas as rubricas indexadas.

Em relação à tributação dos chamados super-ricos — aqueles que ganham mais de R$ 50 mil mensais —, cabe observar que se a taxação incluir somente rendimentos tributáveis, o aumento de arrecadação será pífio. Caso inclua outros rendimentos, como juros de aplicações financeiras e dividendos, a arrecadação será relevante, mas a medida vai gerar judicialização, pois há legislação específica para dividendos, aplicações com tributação exclusiva na fonte (CDB, LC, entre outras) e aplicações isentas de IR (LCI, LCA, entre outras). Além disso, vale lembrar que os mais abastados costumam fazer planejamento tributário.

O projeto insuficiente para mudar a trajetória ascendente dos gastos públicos e promover um ajuste fiscal crível. Várias dessas medidas não representam redução de despesas, como são os casos da renovação da Desvinculação de Receitas da União (DRU) e da inclusão dos programas Pé de Meia e Vale Gás no orçamento. Outras, por sua vez, são inexpressivas em termos de corte de gastos, como a mudança no abono salarial e o combate aos supersalários no setor público. A mudança no BPC é positiva, porque o número de beneficiários subiu 15% neste ano, mesmo que a redução de gastos obtida com a adoção de “pente fino” seja sempre incerta. Favorável também é a decisão de não criar ou prorrogar isenções tributárias em caso de déficit.

O conhecido posicionamento político do Partido dos Trabalhadores (PT) de ser contra corte de despesas (“Gasto é vida”) é um fator gerador de desconfiança. Para mudar essa expectativa, teria de haver um ajuste forte e crível, o que não ocorreu. Culpar o mercado só piora a situação — e como era de se esperar, as reações foram muito negativas, com desvalorização do câmbio, aumento expressivo das taxas futuras de juros, elevação do risco-país e queda dos preços das ações e dos ativos financeiros. Não fossem os pronunciamentos dos presidentes da Câmara e do Senado, separando a apreciação das medidas entre corte de gastos e, depois, as mudanças do IR, o cenário poderia estar pior.

De qualquer forma, fica claro que a tarefa do Banco Central ficará mais difícil em razão dos impactos inflacionários provocados pela desvalorização cambial. Se não forem anunciadas novas medidas, certamente o arcabouço fiscal não sobreviverá, e será necessário um ajuste mais doloroso no futuro.

Por fim, parece que a ala política do governo não parece convencida da necessidade de um ajuste fiscal forte. É preciso lembrar que a ex-presidente Dilma Rousseff perdeu popularidade quando tentou fazer o ajuste fiscal.

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