Mais qualidade para o gasto público

07 de março de 2024

O Brasil deve avançar em direção a uma agenda de modernização do Estado com celeridade, embora ainda não tenha parâmetros para isso. A avaliação é do economista Fabio Giambiagi. Um dos seus diversos livros publicados é especificamente sobre esse tema: Reforma do Estado brasileiro — transformando a atuação do governo, lançado em 2020 pela editora Atlas em parceria com os economistas Sérgio Guimarães e Antônio Ambrozio. O economista foi convidado para falar sobre o assunto durante reunião do Conselho Superior de Economia, Sociologia e Política da FecomercioSP.

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Uma das conclusões do livro é que o Estado continua sendo um ator fundamental em diversas áreas — desde a economia até as regulações de novas tendências —, bem como que, no limite, uma reforma deve focar na relação entre ele e a sociedade. Dentro disso, o fator eficiência é central. Segundo Giambiagi, porém, há alguns problemas que poderiam ser atacados desde já. Um deles é o peso dos gastos sociais na composição das despesas públicas brasileiras: de um lado, são importantes para manter programas sociais e equilibrar as desigualdades do País; de outro, devem ser aplicados de forma eficiente. “Os gastos sociais aumentaram tanto nas últimas décadas que não há como pensar em uma reforma do Estado sem estabelecer restrições, nem que seja algum tipo de hierarquia do que pode ser gasto”, avaliou. “Muita gente dá ênfase à Reforma Administrativa, que demoraria muito tempo tramitando no Legislativo e teria, como efeito, uma redução de não mais que 0,1% dos gastos em relação ao PIB. O elefante branco são as despesas sociais em si”, completou. 

O economista citou como exemplo as previsões de que, frente ao reajuste de 7% no salário mínimo ocorrido no primeiro semestre do ano passado, passando de R$ 1.302 para R$ 1,32 mil, a medida injetaria cerca de R$ 10 bilhões na economia brasileira. Na percepção dele, o problema é que se o impacto para o orçamento público é grande, as mudanças para quem recebe benefícios ou terão salários afetados pelo aumento é mínima. “É uma decisão que significa gastar toneladas de recursos do Estado com pouca efetividade para quem recebe”, observou.  

Nas contas de Giambiagi, a política de expansão do salário mínimo já terá um efeito de cerca de R$ 20 bilhões no ano que vem — e, em algumas décadas, em um montante que pode chegar a R$ 100 bilhões.

“Os gastos sociais aumentaram tanto nas últimas décadas que não há como pensar em uma reforma do Estado sem estabelecer restrições, nem que seja algum tipo de hierarquia do que pode ser gasto.” (Fabio Giambiagi, economista especialista em finanças públicas e previdência social)

 

Hoje, segundo dados apresentados durante a reunião, as despesas públicas conformam aproximadamente 19% do Produto Interno Bruto (PIB) brasileiro. Antonio Lanzana, presidente do conselho, reforçou a agenda institucional da FecomercioSP em torno da modernização estatal lembrando dos impactos desse número sobre o crescimento econômico do País nas últimas décadas. Ele mostrou, por exemplo, que o PIB do Brasil cresceu 146,2% em 40 anos, enquanto o do mundo subiu 337,1%, e o dos países emergentes, por sua vez, elevou 589,4%. Nesse mesmo período, a carga tributária brasileira foi de 25% do PIB, em 1970, para 34%, agora. Lanzana também discutiu como, em três décadas entre 1950 e 1980, o País registrou uma taxa anual média de crescimento em torno de 7,2% — uma das maiores do mundo. 

“O que aconteceu foi o agigantamento do nosso Estado nesse período, deixando como consequência uma redução gradativa da nossa capacidade de fazer a economia se desenvolver de forma sustentável. É por isso que o tema é urgente”, refletiu Lanzana. 



PIB seria 77% maior se Brasil tivesse acompanhado crescimento mundial


A economia brasileira não chegou a um processo constante de perda de dinamismo à toa. Desde 1980, o País vem ficando para trás em relação ao crescimento mundial, abrindo mão das boas estratégias de competitividade. “Se, de 1980 para cá, estivéssemos acompanhando o ritmo de crescimento do mundo, teríamos hoje um PIB [Produto Interno Bruto] 77,5% maior. Isso significa que a renda média do brasileiro, os lucros e os recursos para programas sociais também seriam maiores na mesma magnitude. Estamos perdendo o ‘bonde’ do crescimento econômico, essa é a realidade triste da nossa economia”, adverte Lanzana.

Em reunião com a diretoria da Federação e lideranças sindicais e empresariais no fim de fevereiro, Lanzana reiterou um dos principais objetivos da Federação: a Reforma do Estado visando aumentar a eficiência e equilibrar os gastos públicos, acompanhado de uma modernização do ambiente de negócios. “Quando se fala em modernizar o Estado brasileiro, estamos falando de atuação nos três âmbitos de governo: federal, estadual e municipal. A modernização deve ser ampla envolvendo as áreas de Educação, Saúde, Segurança Pública, entre outras. O foco deve estar concentrado em eficiência, eficácia e efetividade dos gastos públicos, inclusive os sociais, para que beneficiem quem realmente precisa.” 

Nesse sentido, defende que o País necessita, com urgência, de uma Reforma Administrativa que tenha a propriedade de aumentar a qualidade do gasto público. Como exemplo, ele contrastou a diferença de eficiência vista no principal órgão de arrecadação — a Receita Federal —, em comparação ao INSS, em relação a despesas. “São eficiências completamente diferentes, a da arrecadação é muito superior.” 

Lanzana ainda sinalizou para a importância de uma digitalização da máquina estatal que facilite a interoperabilidade das bases de informações do governo e os trâmites empresariais, sem que os custos de procedimentos de conformidade recaiam no empresário, como ocorre hoje.  

O presidente-executivo da FecomercioSP, Ivo Dall’Acqua Júnior, enfatizou que temos visto no Brasil uma combinação de baixo crescimento e produtividade aquém do necessário, de forma que somente uma agenda de reformas pode reverter esse ciclo. “Enquanto o Estado seguir aumentando a sua participação na renda nacional, o setor privado perderá espaço. Como a máquina pública é menos eficiente, a produtividade da economia sente esses efeitos negativos”, complementou. 

“O caminho para se atingir a meta de modernização é a correção de rota estatal. Nas últimas décadas, o Estado tornou o ato de se fazer negócio cada vez mais custoso, em vez de atuar por uma economia sustentável e com as contas públicas ajustadas. Convivemos com uma máquina pública que dificulta a vida de quem emprega, trabalha, empreende e gera renda”, destacou Dall’Acqua Júnior. “Este é um ano de eleições, o que representa uma oportunidade para que a FecomercioSP trabalhe junto com os sindicatos em suas bases a fim de que prefeitos e vereadores apresentem políticas públicas eficazes para as atividades empresariais”, concluiu. 

A FecomercioSP entende que, em 2024, o tema principal da discussão política deve ser a Reforma Estatal. Por isso, além da articulação com o Congresso para a priorização da agenda, a Entidade está engajando a opinião pública pela mídia e pautando lideranças e especialistas acerca da urgência de uma modernização do Estado.

Redação PB Joélson Buggilla
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