Apesar de ser uma das jurisdições mais complexas do mundo para se fazer negócio, o Brasil fez progressos na simplificação de seu ambiente corporativo nos últimos cinco anos. É o que aponta a 12ª edição do Índice Global de Complexidade Corporativa (GBCI, na sigla em inglês), do TMF Group, empresa de serviços profissionais de administração, sediada na Holanda. O País passou do primeiro lugar, em 2022, para o sexto, em 2025. O índice mede os ambientes de negócios em 79 jurisdições, os quais representam 94% do Produto Interno Bruto (PIB) global e 95% do Investimento Estrangeiro Direto (IED) líquido, utilizando 292 indicadores que abrangem conformidade fiscal, regulamentações de recursos humanos, padrões contábeis, entre outros.
A melhoria, no entanto, não é motivo de comemoração. O TMF Group atribui a colocação brasileira no último ranking, principalmente, à fase inicial de implementação da Reforma Tributária, que consolida cinco impostos sobre o consumo em dois Impostos sobre Valor Agregado (IVAs): um federal, a Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS); e um estadual-municipal, o Imposto sobre Bens e Serviços (IBS). “Reformas regulatórias, digitalização e adoção de tecnologias estão incentivando um ambiente de negócios mais ágil”, afirma Mauricio Catâneo, head do TMF no Brasil. “Entretanto, a sobreposição dos regimes tributários federal, estadual e municipal continua onerosa, especialmente quando alinhados com as normas internacionais de contabilidade. A incerteza em torno da Reforma Tributária só agrava essa complexidade”, explica.
O Congresso brasileiro aprovou o arcabouço da reforma no fim de 2023. A legislação complementar, regulamentando o novo sistema, foi publicada no início deste ano, mas a implementação completa está prevista só para 2033. O governo planeja começar a testar as novas plataformas de arrecadação de impostos em 2026, enquanto os legisladores continuam a definir os detalhes.
A carga tributária atual continua assustadora: 32,3% do PIB, de acordo com o Tesouro Nacional. Além disso, cumprir a legislação brasileira exige 1,5 mil horas por ano — ou 187 dias úteis inteiros —, segundo a estimativa mais recente do Banco Mundial. A reforma busca aliviar essa carga, mas advogados e líderes empresariais alertam para a falta de clareza em diversos pontos. “Muitas dúvidas ainda pairam no ar”, escreveram, em recente artigo de opinião para o jornal Folha de S.Paulo, Thiago Amaral e Douglas Mota, advogados especialistas em impostos sobre o consumo, do escritório Demarest Advogados.
Os especialistas citam questões persistentes em torno da alíquota do IVA — que deve ficar em torno de 28%, acima do teto constitucional de 26,5% aprovado pelo Congresso — e da estruturação de mecanismos como parcelamento, sistemas de cashback e um novo comitê de fiscalização tributária. “Com a transição do antigo para o novo sistema tributário, as empresas devem reavaliar estratégias fiscais, logística, incentivos e cadeias de suprimentos”, advertiram.
Se a burocracia tributária é um eterno ponto de atenção no ambiente de negócios brasileiro, o avanço vem da tecnologia. O TMF Group menciona a rápida transformação digital do Brasil, principalmente com a adoção do sistema de pagamento instantâneo do País, o PIX. No entanto, a velocidade da transformação digital também eleva a exposição a fraudes, alerta o relatório. “Essas mudanças simplificaram a supervisão em tempo real, mas também introduziram camadas adicionais de complexidade e gerenciamento de riscos para as empresas”, afirma.
A aperfeiçoamento da infraestrutura também contribui para facilitar os negócios. Investimentos federais em rodovias, ferrovias, portos e aeroportos começaram a aliviar parte dos encargos logísticos das empresas que atuam no vasto território brasileiro.
Globalmente, a maior ou menor complexidade dos negócios está sendo impulsionada menos pelas regulamentações domésticas e mais pela incerteza geopolítica. Desde 2021, observa o TMF, as expectativas de estabilidade política em médio prazo têm diminuído constantemente, em meio a disputas comerciais e interrupções na cadeia de suprimentos.
Os exportadores brasileiros já estão sentindo as consequências. Uma pesquisa recente com 830 fabricantes, realizada pela Fundação Getulio Vargas (FGV), constatou que a maioria das empresas que vendem para o exterior espera ser afetada pela agenda comercial protecionista do presidente dos Estados Unidos, Donald Trump. Menos de 20% relataram terem sido afetadas até o momento, mas a preocupação está aumentando.
Em meio a realinhamentos globais, o Brasil prioriza a integração regional, indica o relatório, ao investir em infraestrutura transfronteiriça para estimular o Comércio sul-americano e reduzir a dependência de cadeias de suprimentos internacionais. Ainda assim, as empresas latino-americanas estão atrasadas quanto aos seus pares globais na diversificação de redes de fornecedores, constatou o TMF. A maioria ainda está nos estágios iniciais de avaliação de riscos.A volatilidade política do Brasil acrescenta, ainda, mais uma camada de imprevisibilidade.
Como afirmou o cientista político Cláudio Couto, durante uma mesa-redonda recente, promovida pelo The Brazilian Report, a fragmentação no Congresso e os frequentes confrontos entre os poderes Executivo e Legislativo continuam a minar a estabilidade das políticas públicas. “Há um risco real de um cabo de guerra regulatório contínuo entre o Executivo e o Congresso”, disse Couto, apontando, como sintomas do impasse, as disputas recentes sobre regulamentações ambientais e uma proposta de aumento de impostos federais.