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Avanços na modernização dos concursos

Jessika Moreira
é diretora-executiva do Movimento Pessoas à Frente, especialista em Políticas Públicas para Cidades Inteligentes pela Universidade de São Paulo (USP) e cofundadora do ÍRIS, Laboratório de Inovação e Dados do Governo do Ceará.
Fernando de Souza Coelho
é professor de Administração Pública na Escola de Artes, Ciências e Humanidades da Universidade de São Paulo (EACH-USP), coordenador do Laboratório de Gestão Governamental da EACH-USP e integrante do MPaF.
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Jessika Moreira
é diretora-executiva do Movimento Pessoas à Frente, especialista em Políticas Públicas para Cidades Inteligentes pela Universidade de São Paulo (USP) e cofundadora do ÍRIS, Laboratório de Inovação e Dados do Governo do Ceará.
Fernando de Souza Coelho
é professor de Administração Pública na Escola de Artes, Ciências e Humanidades da Universidade de São Paulo (EACH-USP), coordenador do Laboratório de Gestão Governamental da EACH-USP e integrante do MPaF.

A modernização da gestão de pessoas no serviço público é um tema essencial para o futuro do Brasil. Para isso, é extremamente necessário debater esse assunto com toda a sociedade civil e encontrar caminhos para aprimorar o funcionalismo brasileiro, além de, consequentemente, construir um país mais desenvolvido.

Recentemente, três importantes entidades do setor produtivo — a Federação do Comércio de Bens, Serviços e Turismo do Estado de São Paulo (FecomercioSP), a Confederação Nacional da Indústria (CNI) e a Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp) — organizaram um evento, em São Paulo, com a finalidade de discutir a modernização administrativa no País e caminhos para tornar o Estado mais eficiente. 

Na ocasião, foi realizado o lançamento de um manifesto com dez diretrizes para que o Brasil avance em políticas de gestão de pessoas no serviço público. Todas as orientações contidas no documento são igualmente importantes, mas há um item que merece atenção especial: aprimorar os concursos públicos para avaliar melhor as competências práticas dos candidatos.

Até 2024, não havia uma legislação infraconstitucional que regulamentasse a principal porta de entrada de servidores na administração pública brasileira. Após um debate de mais de 20 anos, essa ordenação foi alcançada com a publicação da Lei 14.965, que estabelece normas para melhorar o recrutamento e a seleção na administração pública federal, com possibilidade de extensão para Estados e municípios, além de prever a realização de concursos unificados, como o Concurso Público Nacional Unificado (CPNU).

Contudo, essa lei ainda é apenas um primeiro passo. A fim de que os concursos públicos possam seguir evoluindo no País, é preciso planejar todo o processo de ingresso dos servidores. Para esse delineamento, há quatro etapas que devem ser consideradas. 

A primeira refere-se ao planejamento da força de trabalho, que inclui a definição do número de vagas e as atribuições dos diversos cargos a serem oferecidos. A segunda, ao recrutamento e à seleção dos servidores em si, com um olhar cuidadoso para a elaboração do concurso e do respectivo edital.

A terceira etapa compreende a socialização organizacional, desde a alocação do funcionário até o seu desenvolvimento contínuo no cargo para o qual for contratado. E a quarta etapa trata da gestão de desempenho do servidor, com uma abordagem especial em relação ao estágio probatório nos primeiros três anos.

Além disso, há dois fundamentos essenciais relacionados aos concursos públicos: o primeiro é a necessidade de uma burocracia representativa, ou seja, é preciso que reflitam a diversidade da população brasileira dos pontos de vista racial, de gênero e territorial. 

Historicamente, era muito comum que a maioria dos aprovados residisse na Região Centro-Oeste, por exemplo. Mas, a partir do CPNU, cuja primeira edição foi realizada no ano passado, esse cenário já apresentou mudanças. Dos 5.569 municípios brasileiros, 5.565 estiveram representados com inscritos no certame, enquanto candidatos de 908 cidades diferentes, das cinco regiões do território nacional, foram aprovados.

Outro fundamento essencial tem como referência uma burocracia vocacionada, ou seja, é imprescindível preparar o ethos público e aferir competências e habilidades dos candidatos mais afeitas aos cargos conquistados nos concursos públicos. Há muitos anos, havia uma série de limites relacionados a esse aspecto, como o predomínio de certames com fase única e provas com questões de múltipla escolha, o que impossibilita uma avaliação mais plural, precisa e realista.

Com a aplicação da Lei 14.965, esse cenário tem todas as possibilidades de mudar para melhor, bem como de oferecer mais segurança jurídica para que o Brasil possa inovar nos concursos públicos. A lei permite ao gestor público a elaboração de editais mais diversos, com ampla gama de avaliações possíveis para além do modelo tradicional, medido em questões de múltipla escolha. A inclusão de uma segunda etapa de seleção, além de entrevistas e cursos de formação, são alguns bons exemplos desse novo cenário aberto pela lei.

A primeira edição do CPNU trouxe muitas notícias positivas. Além da aprovação de candidatos de todas as cinco regiões do Brasil, pessoas negras, indígenas e com deficiência representaram porcentuais superiores às reservas de vaga mínimas estabelecidas. No entanto, ainda é preocupante a taxa de aprovação de mulheres — especialmente em áreas estratégicas, por exemplo —, o que mostra que ainda há muito a ser feito.

O Ministério da Gestão e da Inovação em Serviços Públicos (MGISP) confirmou, recentemente, que a segunda edição do CPNU será realizada no segundo semestre deste ano. Se considerarmos os resultados do primeiro, essa é uma notícia a ser celebrada em um setor que havia parado no tempo. O caminho ainda é longo, e deve ser melhorado, mas são primeiros passos importantíssimos para otimizar a gestão de pessoas no setor público brasileiro.

Este conteúdo é fruto de uma parceria editorial com o MPaF — uma organização suprapartidária e plural composta por mais de 200 pessoas com diferentes perspectivas políticas, sociais e econômicas, comprometidas com o aprimoramento das políticas de gestão de pessoas no setor público.

Os artigos aqui publicados são de inteira responsabilidade de seus autores e não refletem a opinião da PB. A sua publicação tem como objetivo privilegiar a pluralidade de ideias acerca de assuntos relevantes da atualidade.